Escola de Airães junta descendentes de três justos portugueses
Parece um palco improvável, mas na próxima sexta-feira, a assinalar o Dia Internacional da Memória das Vítimas do Holocausto, a Escola Básica e Secundária de Airães, em Felgueiras, junta numa conferência os descendentes de três "justos" portugueses: Aristides de Sousa Mendes, Carlos Sampaio Garrido e o padre Joaquim Carreira. Há um quarto português que tem o nome inscrito no Yad Vashem, o Memorial do Holocausto de Jerusalém, mas de José Brito Mendes, emigrante em França, desconhece-se o paradeiro do único descendente.
O palco parecerá menos improvável contada a história que vai desembocar - mas não terminar - na conferência da próxima semana. Uma história que começa em 2013, quando a professora bibliotecária Francina Santos se apercebe de que os alunos que vão requisitar o Diário de Anne Frank - que integra o programa curricular do 8.º ano- não fazem "rigorosamente ideia nenhuma" do contexto em que viveu a menina judia que acabaria por morrer no campo de concentração de Bergen-Belsen. Dessa constatação nasce o projeto Em Memória do Holocausto, através do qual a escola prolonga até hoje iniciativas pedagógicas em torno do tema. Um trabalho que se estendeu além-fronteiras através do eTwinning - um programa da União Europeia que tem por objetivo a criação de redes de trabalho entre escolas de diferentes países. "Trabalhámos dois anos seguidos com uma escola da Croácia, no ano passado trabalhámos com a Grécia", conta ao DN Francina Santos. A iniciativa, que se estende do pré-escolar ao 12.º ano, vai variando a abordagem nos diferentes anos letivos, centrando-se nos direitos humanos, ou na tolerância e igualdade. Neste ano reúne seis escolas europeias: além da portuguesa, uma polaca (em Auschwitz), as outras búlgara, grega, turca e romena.
Na conferência da próxima semana vão estar António Moncada de Sousa Mendes, um dos netos de Aristides de Sousa Mendes, Salvador Alves Garrido, neto único de Sampaio Garrido (embaixador na Hungria entre 1939 e 1944) e um sobrinho do padre Joaquim Carreira, o quarto português "Justo entre as Nações" (título que é atribuído a não judeus que arriscaram a vida para salvar judeus durante o regime nazi), que foi vice-reitor e reitor do Colégio Pontifício Português de Roma.
A iniciativa que nasceu pela mão de Francina Santos já recebeu o selo de qualidade do eTwinning , como exemplo de uma boa prática pedagógica. A professora (de Português e Francês) diz que é assim, com abordagens diferentes e numa lógica cooperativa que entende o ensino. Defende que nada se faz sozinho e faz questão de sublinhar o "apoio incondicional" quer do diretor da escola quer do executivo de Felgueiras. Até as empresas do concelho já deram uma ajuda, financiando um concurso entre os alunos que teve como prémio uma visita à casa onde viveu Anne Frank, em Amesterdão. Francina Santos lamenta é que o exemplo não venha de fora, leia-se da sociedade e das instituições: "Noutros países aposta-se na divulgação das figuras que fazem parte da sua história, em Portugal faz-se exatamente o contrário. Acho deplorável o esquecimento a que foram votadas estas pessoas. Não tanto em relação a Aristides Sousa Mendes, dada a importância da fundação, mas alguém sabe hoje quem foi Sampaio Garrido? Não. Alguém sabe quem foi o terceiro Justo? Não. Menos ainda o quarto. É triste, porque foram heróis no verdadeiro sentido do termo." A professora aponta um exemplo do que não devia acontecer: "É triste que, no nosso país, a cerimónia mais importante que o Parlamento faz seja depois do plenário. E nos manuais? Não vem nada."