Conselho da Magistratura só pode suspender Rangel depois de ser notificado pelo MP

Os juízes Rui Rangel e Fátima Galante ainda estão em funções na Relação de Lisboa, apesar de arguidos na Operação Lex, porque o Conselho Superior de Magistratura está à espera de que a PGR o informe sobre o processo
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O juiz Rui Rangel, arguido na Operação Lex por suspeita de usar a sua influência junto dos colegas magistrados para influenciar decisões judiciais - alegadamente a favor de Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica, ou do empresário José Veiga -, ainda está em funções na 9.ª secção criminal do Tribunal da Relação de Lisboa. A ex-mulher, a desembargadora Fátima Galante, da 6.ª secção cível da Relação de Lisboa, também arguida - tal como outras dez pessoas, entre elas Luís Filipe Vieira -, está igualmente no ativo. Uma suspensão só poderá acontecer na sequência de uma decisão do Conselho Superior da Magistratura (CSM), o órgão disciplinar dos juízes.

O que ainda não aconteceu pois o CSM só irá reunir-se depois de ser informado oficialmente pelo Ministério Público da constituição como arguidos dos dois juízes. O vice-presidente do conselho, Mário Morgado, justificou desta forma a atuação: "O CSM analisará a situação logo que receba informação oficial sobre o assunto. Eventuais medidas no âmbito das competências do Conselho serão oportunamente divulgadas".

O DN soube junto da assessoria deste órgão disciplinar que o CSM só pode reunir-se em plenário para decidir sobre a suspensão cautelar dos dois juízes quando receber uma comunicação oficial do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) sobre o processo da operação Lex. Ou, em alternativa, uma comunicação oficial da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Em declarações ao DN o Supremo frisou que não tem essa obrigação: "Quem tem de enviar a comunicação para o Conselho Superior de Magistratura é o Ministério Público, que é quem tem o inquérito." Porém, a PGR, que tem enviado comunicados à imprensa sobre o processo, ainda não sabia, ontem à tarde, que tinha de informar o órgão disciplinar dos juízes. O DN perguntou se a PGR ia enviar essa comunicação formal mas até ao fecho desta edição não obteve resposta.

Certo é que Rui Rangel e Fátima Galante acabam por ficar com a credibilidade e a imagem atingidas uma vez que a Operação Lex está relacionada com o alegado abuso das suas funções judiciais.

E enquanto não há uma decisão do CSM pode, em teoria, ser-lhes distribuídos, por sorteio, processos na Relação. "É desnecessária esta formalidade", como resume o penalista Paulo Sá e Cunha. E prossegue com a explicação: "O Conselho Superior de Magistratura pode, com base nos factos públicos e nos comunicados à imprensa da PGR, reunir em plenário e decidir abrir um processo disciplinar aos dois juízes, tomando medidas preventivas como a suspensão cautelar de funções." Outra forma de suspender os juízes, refere Sá e Cunha, é "no âmbito do processo-crime ser aplicada uma medida de coação de suspensão de funções".

Mas os dois desembargadores da Relação de Lisboa só serão ouvidos em primeiro interrogatório no Supremo a 8 e 9 de fevereiro. E o próximo plenário do CSM é a 6 de fevereiro. A não ser que seja marcado um plenário de urgência, os dois magistrados vão estar no ativo até uma destas datas.

Todos os arguidos vão ser ouvidos no Supremo Tribunal de Justiça porque houve uma "conexão de processos" . Ontem, ao final da tarde, o juiz conselheiro Pires da Graça, da 3.ª secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça, começou a ouvir os cinco arguidos que estavam detidos, para se respeitar o prazo da audição 48 horas após a detenção.

Os detidos são o advogado José Santos Martins, amigo de Rui Rangel, e o seu filho Bernardo André, que terão disponibilizado as suas contas bancárias para ali serem depositadas verbas que, alegadamente, seriam entregues ao desembargador Rui Rangel que as receberia como pagamento por decisões judiciais que, supostamente, influenciava; o oficial de justiça Otávio Correia, uma ex-companheira de Rangel, Rita Figueira, e ainda Jorge Barroso, advogado de Luís Filipe Vieira nos negócios relacionados com o imobiliário.

A Operação Lex investiga suspeitas de corrupção/recebimento indevido de vantagem, branqueamento de capitais, tráfico de influência e fraude fiscal. Foram realizadas 33 buscas pela unidade de combate à corrupção da PJ na terça-feira, das quais 20 domiciliárias, nomeadamente ao Sport Lisboa e Benfica, à casa de Luís Filipe Vieira; à residência dos dois juízes e a três escritórios de advogados.

Entretanto, ao início da noite a SIC noticiou que o advogado do Benfica, João Correia, pediu a nulidade das buscas que aconteceram na terça-feira na SAD benfiquista.

Em causa nesta investigação está a suspeita de o juiz Rui Rangel vender a influência que teria junto dos colegas da Relação e até de magistrados noutros tribunais para influenciar decisões judiciais, como terá acontecido no âmbito de um processo em que terão sido cometidos ilícitos económico-financeiros na contratação do jogador João Pinto pelo Sporting. "Se os processos em análise [da Relação] tiverem sido inquinados pela influência de Rangel, as partes que se sentirem lesadas poderão ter direito à reabertura dos processos", analisa Paulo Sá e Cunha. "E caso venha a provar-se em julgamento que a influência do juiz Rui Rangel levou à prática de decisões ilícitas, outros juízes poderão ainda vir a ser constituídos arguidos", conclui.

O penalista Fernando Silva explica que "qualquer possibilidade de os processos estarem inquinados tem de ser comunicada ao Ministério Público. O próprio MP pode decretar a reabertura de processos".

Segundo a Lusa, que cita fontes ligadas ao processo, a alegada prestação privada de serviços jurídicos e a ocultação fiscal dos montantes recebidos por parte de Rui Rangel são outras situações também em causa neste processo.

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