Costa nas mãos do PCP se quiser insistir na lei do sigilo bancário

Politólogos consideram que Marcelo Rebelo de Sousa traçou a sua primeira "linha vermelha" ideológica com o primeiro-ministro
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Para poder voltar a insistir no diploma que permitia o acesso do fisco a contas com mais de 50 mil euros - que ontem foi vetado pelo Presidente da República -, António Costa terá de convencer o PCP. Isto porque se o governo quiser levar de novo o decreto a Belém terá de o aprovar por maioria no Parlamento. O BE já apoia, mas o PCP tem alguns "ses". Costa ainda não decidiu o que vai fazer.

Marcelo destacou como base principal da sua decisão a "patente inoportunidade política" da proposta, pela situação de fragilidade do sistema bancário e pela necessidade de "confiança dos portugueses, depositantes, aforradores e investidores, essencial para o difícil arranque do investimento, sem o qual não haverá nem crescimento e emprego, nem sustentação para a estabilização financeira duradoura".

Costa, que não foi apanhado de surpresa pelo veto - a sua ministra Maria Manuel Leitão Marques admitiu, na quinta-feira, que o governo estava à espera de uma decisão nesse sentido -, reagiu e deu sinal de não querer abrir uma frente de conflito com Belém.

Para já, a parte dos diplomas que não foi chumbada - todas as obrigações que resultam da transposição da diretiva europeia que visam controlar quem tenha contas em países diferentes daquele em que reside - será em breve aprovada de novo em Conselho de Ministros para ser regulamentada e entrar em vigor.

Quanto ao resto, António Costa disse que o governo irá agora "ponderar o fundamento" do veto do Presidente" e "em função disso" tomar uma decisão. O primeiro-ministro deixou claro que quer continuar a "dançar o tango" quase perfeito que vinha praticando com Marcelo no salão da política. Costa salientou o facto de que não estão em causa "questões sobre a constitucionalidade", mas sim "relativas à oportunidade parcial do diploma". Agora terá de pensar numa solução que permita conjugar as preocupações de "inoportunidade política" de Belém com as dos comunistas. E elas até vão ao encontro das invocadas por Marcelo no seu veto. De que sejam "criados mecanismos expeditos para o levantamento do sigilo bancário sempre que recaiam suspeitas fundamentadas por parte da autoridade fiscal".

Definida a "linha vermelha"

Politólogos interpretam este veto como uma "marcação de posição ideológica" por parte de Marcelo Rebelo de Sousa e o "início da definição das linhas vermelhas" entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. André Freire, coautor do livro O Poder dos Presidentes, lembra que este tipo de veto "é sempre político" e que Marcelo Rebelo de Sousa "quis marcar aqui uma posição ideológica diferente da do governo". "É preciso não esquecer que têm eleitorados diferentes e o Presidente da República não pode esquecer o seu", assinala. André Freire considera, porém, que Marcelo "podia ter escolhido outro pretexto". Dizer "que se trata de uma "inoportunidade política por causa da sensibilidade atual no sistema bancário não faz sentido. Não é certamente por causa do sigilo bancário que a banca está no estado em que está".

Para José Adelino Maltez, o chefe de Estado traçou "a primeira linha vermelha" entre Belém e São Bento. "Começam a definir-se as diferenças ideológicas", assinala. Apesar disso, este politólogo está convicto de que "não vai haver conflito institucional".

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