Costa defende em Bruxelas legado de Passos. Cristas aplaude

Primeiro-ministro diz que seria injusto acusar anterior governo de falta de empenho na consolidação das contas públicas

É caso para dizer que o antigo arco da governação parece estar de regresso à política portuguesa. Com o cenário de sanções a aplicar a Portugal por défice excessivo em cima da mesa, a Comissão Europeia está a aproximar o governo PS do PSD e do CDS. De tal forma que António Costa sentiu-se ontem forçado a defender o executivo de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. E a direita gostou do que ouviu.

Para o primeiro-ministro, a acusação feita ao anterior governo de falta de empenho na consolidação orçamental é incompreensível. "Até eu, que sou absolutamente insuspeito, me sinto chocado", afirmou ontem Costa, à entrada para a reunião do Conselho Europeu, salientando ainda que esse entendimento "é injusto para o anterior governo e seria completamente disparatado".
Na resposta, Assunção Cristas congratulou-se com o reconhecimento: "É bom que o primeiro-ministro se consciencialize que a bem do país deve defender o resultado do governo anterior. Estas declarações parecem-me um primeiro passo para que se bata por isso. Até agora, não vimos essa afirmação nem esse empenho por parte do governo português", contrapõe a líder do CDS em declarações ao DN.

Mas Cristas eleva a fasquia e observa que não entende como é que o governo "aceitou de forma acrítica que se fale, de repente, em 3,2% de défice", quando o relatório do Eurostat, o gabinete de estatísticas da União Europeia (UE), reconhece que sem os apoios à banca o desequilíbrio nas contas públicas teria sido de 2,8%. "O primeiro-ministro tem as ferramentas ao seu dispor para justificar e exigir, do ponto de vista técnico e político, que o défice do ano passado seja fixado abaixo dos 3%", completa a sucessora de Portas. E adensa a pressão: "Está nas mãos do governo fazer a defesa de 2015."

A verdade, porém, é que o primeiro-ministro parece agora menos confiante de que da reunião de dia 5 do colégio de comissários não venham a sair penalizações ao nosso país e a Espanha. A expressão de confiança numa "decisão razoável" de Bruxelas, que fez parte do seu discurso nas últimas semanas, deu lugar à palavra desilusão. "Infelizmente, a Comissão Europeia já me desiludiu suficientes vezes para eu poder ter a certeza de que não me desilude novamente", respondeu.

"Se isso vier a acontecer, seria um péssimo sinal, significaria que a Comissão Europeia não perceberia o que se está a passar na Europa", salientou o chefe do executivo, que considera que a saída do Reino Unido, a crise dos refugiados e a ameaça terrorista têm de ser as prioridades comunitárias.

"É absolutamente ridículo estarmos a discutir 0,2% da execução orçamental do anterior governo. Para mais num ano em que, mesmo nas piores previsões da Comissão Europeia, é garantido que cumpriremos um défice abaixo dos 3%", prosseguiu Costa.

Indignado com o cenário da aplicação de sanções, Passos defende que o governo não deve ter de mendigar junto de Bruxelas e deu o exemplo de França para reafirmar que seria "incompreensível" e "uma vergonha" punir Portugal: "No dia em que for alvo de sanções, outros terão de ser, a começar pela França. Não vejo razão nos resultados dos últimos anos, mesmo em 2015, para que haja sanções, mesmo que fosse com pena suspensa." O líder do PSD falava à margem da cimeira do Partido Popular Europeu (PPE) em Bruxelas e argumentou que os 4,4% de défice registados no ano transato se deveram ao valor que foi necessário injetar no Banif . "Os investimentos na área financeira e bancária (...) não podem conduzir a penalizações adicionais. Há razões para Portugal não sair neste ano do procedimento por défices excessivos", acrescentou.

Por seu lado, Cristas nota ao DN que já encetou esforços para combater as sanções. Já falou com o presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, com o comissário europeu para o Euro, Valdis Dombrovskis, com o líder do grupo parlamentar do PPE (família política a que pertence o CDS), Manfred Weber, e que trocou impressões sobre o assunto com Angela Merkel. "O trabalho de todos os partidos em Portugal estarem unidos está feito", sintetiza.

Quem também se manifestou contra o castigo foi o primeiro-ministro francês. Numa intervenção na Assembleia Nacional, num debate sobre o brexit (ver páginas 4 a 9), Manuel Valls disse que a UE precisa de "ser cautelosa para não ser vista como puramente punitiva e ultraneoliberal".

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