Comissária veio a Pedrógão dizer aos portugueses que “não estão sozinhos”
Governo deve entregar na próxima semana o relatório final dos estragos dos incêndios. Montante do apoio do fundo social europeu deve ser conhecido no final de janeiro.
De pé apenas estão alguns pilares e o chão. Até janeiro, Markus Bosch espera que a sua carpintaria esteja concluída. O suíço foi um dos empresários afetados pelos incêndios de 17 de junho, em Pedrógão Grande. Recebeu apoios dos fundos comunitários para a reconstrução e ontem recebeu a visita da comissária europeia para a política regional, Corina Cretu.
A responsável europeia ouviu a sua história, quis saber o que faz um suíço em terras lusas - veio à procura de uma vida mais equilibrada e feliz, “na Suíça somos ricos mas não somos felizes, é uma gaiola dourada”, há de repetir aos jornalistas - e como está a reconstruir a sua vida. “A minha presença aqui serve para dizer aos portugueses que não estão sozinhos. Estamos todos juntos desde a primeira semana.”
O governo está a deslocar verbas de fundos comunitários para responder aos estragos registados nos incêndios. A Comissão Europeia já adiantou 1,5 milhões de euros do Fundo de Solidariedade da União Europeia, mas aguarda ainda o levantamento final por parte do governo dos prejuízos dos incêndios de outubro.
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Documento que a comissão espera receber na próxima semana. Estes danos vão ser somados aos dos incêndios de junho, julho e agosto, que já totalizavam um prejuízo de superior a 500 milhões de euros. A verba ainda não está fechada, mas segundo o secretário de Estado do desenvolvimento e coesão, Nelson de Souza, pode ultrapassar os mil milhões de euros - o limiar mínimo para atingir o grau de catástrofe de grandes dimensões. E garantiu que o tempo que está a levar para finalizar esse levantamento “é o tempo necessário”.
Depois de entregue este relatório final, a comissão analisa o pedido e enviar para o Parlamento Europeu e para o Conselho da Europa a sua proposta de financiamento. Um processo que levará algumas semanas e que poderá só estar concluído no final de janeiro. Para já, Corina Cretu solidarizou-se com as populações afetadas, cumprimentou habitantes locais e deixou a garantia de se “está a trabalhar” para colocar as ajudas no terreno.
Deixou no ar a hipótese de no próximo quadro orçamental se alterarem os fundamentos de elegibilidade do fundo de solidariedade - que neste momento se foca nas infraestruturas e deixa de fora as empresas e habitações -, lembrando que cada vez mais a Europa se confronta com catástrofes naturais às quais é preciso dar resposta. “Temos de fazer prevenção e agir depressa perante estes desastres”, frisou. No quadro do fundo de solidariedade, podem ser reembolsados 2,5% dos prejuízos até 1054 milhões de euros.
Dos outros mecanismos europeus, Portugal já realocou perto de 50 milhões de euros do programa operacional centro 2020. Foi desse montante que beneficiaram as empresas ontem visitadas, bem como a habitação por onde passaram os representantes políticos. Portugal pode ainda utilizar fundos dos 433 milhões disponíveis no quadro do combate às alterações climáticas, para projetos que se insiram neste quadro.
O ministro da agricultura, Luís Capoulas Santos, revelou terem sido entregues candidaturas dos pequenos agricultores no valor de 60 milhões de euros de prejuízo, e defendeu a necessidade de se harmonizar os apoios dispersos no terreno.
Acrescentou ainda que “não é à base da agricultura que se revitaliza o interior e as zonas afetadas, tem de se criar emprego”.
Da rápida passagem pelas zonas afetadas - a visita durou duas horas - Corine Cretu admitiu ao DN estar “emocionada”. “Não consigo imaginar o sofrimento das pessoas. Estamos a atentar ajudar o mais depressa possível, mas há coisas em que não podemos ajudar, porque nem tudo são danos financeiros. Vai levar anos a reconstruir o que demorou segundos a destruir”, lamentou.
No entanto, a capacidade de reconstrução que encontrou no local deixou a responsável europeia “impressionada”. Markus Bosch é um desses exemplos. Há 30 anos em Portugal, não pensou desistir quando viu todo o trabalho dos últimos 20 anos arrasado pelas chamas. “Nunca pensei desistir. Depois do incêndio fiquei impressionado com a solidariedade das pessoas. Quer as pessoas da minha aldeia quer de fora. Chegavam pessoas a oferecer ajuda. Estou muito agradecido e fiquei muito comovido com esta solidariedade”, refere o empresário que restaura para vender casas antigas.
Do dia 17 de junho ficam as marcas de um cenário único. “Já tínhamos tido incêndios, mas nada como aquilo. As pessoas do meu vale meteram-se todas no ribeiro. Nós andávamos com toalhas húmidas na cabeça para tentar salvar a minha casa, mas o calor era horrível.” Sobre se teve a noção de que estava a perder tudo e a arriscar a vida, o empresário de 58 anos assegura: “Nestes momentos não se pensa em nada, entramos em piloto automático e fazemos o que há para fazer.”
A sua carpintaria vai nascer num outro local da sua propriedade, mais seguro. No arranque do ano, Markus espera começar a trabalhar e conseguir reconquistar a confiança de estrangeiros que agora hesitam na escolha de Pedrógão Grande para viver. Cerca de 10% da população do concelho é estrangeira.