António Ribeiro Telles num domingo de Glória em Salvaterra
O crítico taurino Miguel Ortega Cláudio faz a crónica da corrida de 13 de maio, em Salvaterra de Magos
Afinal de contas não é assim tão difícil, e muito menos complicado, encontrar o caminho certo para devolver à Festa a sua razão de ser, a sua essência, a sua verdade e levar gente às praças, até enchê-las, como aconteceu no domingo 13 de maio, em Salvaterra de Magos.
O esplendor, a alma, a paixão, a veneração ao mais belo e nobre animal do Mundo - o TOIRO BRAVO -, motivou uma peregrinação de aficionados ao Concurso de Ganadarias inserido na III corrida dos Agricultores do Tomate do Ribatejo. Com toiros de verdade, com emoção, com "ais" e "olés" nas bancadas, com toureiros e forcados que tenham "alma" para os enfrentar, a história é logo outra!
Seis ganadarias disputavam, num concurso Luso-Espanhol, os troféus João Ramalho (Bravura) e José da Costa (Apresentação). Foram elas: Conde de la Maza, Canas Vigouroux, Miura, Veiga Teixeira, Dolores Aguirre e António Silva.
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O primeiro toiro da corrida, com 545 kg, da ganadaria Conde de la Maza, evidenciou alguma bravura e nobreza. Com muita mobilidade, andou sempre com a cara alta tanto nos capotes, nas acometidas ao cavalo e no momento da reunião da pega. Teve uma apresentação digna e condigna com a corrida em questão.
O segundo foi um bonito e rematado Canas Vigouroux de 535 kg. Toiro manso, com querenças nas tábuas, mas que das mesmas saía com alegria, rompendo para o ferro com emoção.
Em terceiro lugar saiu um Miura, de 515 kg, mal apresentado, feio e que foi justamente protestado pelo público. Toiro nobre, com pouca força e transmissão.
O quarto era de Veiga Teixeira. Bonito, altivo, bem proporcionado e rematado. Acusou na balança 550 kg. Foi bravo, apertou, cresceu ao castigo e trouxe emoção às bancadas.
O de Dolores Aguirre, que fez quinto, foi anunciado com 670 kg. Uma estampa de toiro! Saiu cambaleante das mãos e foi devolvido aos currais. O primeiro sobrero foi um toiro bonito de Veiga Teixeira, sério e mais reservado que o seu irmão de camada.
O que fechava a corrida, da ganadaria de António Silva, com 680kg, também saiu debilitado e teve o mesmo destino do quinto da corrida. O segundo sobrero, também da ganadaria Silva, era bonito, bem feito, o protótipo do toiro de lide. Foi sério, teve laivos de bravura. Bom toiro.
António Ribeiro Telles teve dois toiros distintos e em ambos brilhou, com serenidade. Tranquilo, senhor de si, fazendo tudo bem feito. O seu primeiro lidou-o na perfeição, pausadamente, sem tempos mortos, com saber e com uma tremenda classe. Aquela que distingue os predestinados, os grandes do toureio.
Mas foi no seu segundo, o quarto da corrida, um toiro bravo e encastado, que António raiou a perfeição! Uma lide que mais parecia um compêndio do princípio ao fim. Cites bem medidos, ferros emocionantes a levantar os aficionados das bancadas. Bregou com brilhantismo, com uma arte e saber só ao alcance dos eleitos. Deu ao toiro a prioridade toda, citou de largo, reuniu com emoção e com verdade, cravando de alto a baixo, como mandam as regras e que tantos por aí se esqueceram... Mais uma lição do Mestre!
Bonito, carregado de respeito e de humildade, o gesto de Francisco Palha ao brindar a sua segunda lide a António RIbeiro Telles, em jeito de agradecimento pela lição que deu ontem aos presentes.
Melhor esteve Francisco no seu primeiro toiro, que investia com alegria, com raça, que tinha querenças acentuadas nas tábuas, mas acabou por servir para o seu toureio de arte, de temple compassado e exigente. Francisco Palha está um toureiro sóbrio, há segurança e tranquilidade em todos os seus pormenores, em todas as sortes. Toureiro em constante ascensão, também ele a escrever páginas de glória de uma história que está a marcar este início de temporada.
No seu segundo toiro, mais áspero e reservado, Palha esteve mais apagado, mas nem por isso em plano inferior. Deixou os ferros em sortes bem desenhadas e agradou ao conclave.
Andrés Romero não teve uma passagem feliz no seu debute em Salvaterra. Se no seu primeiro, o público pouca importância deu à sua atuação, pela insignificante presença do Miura, pedindo que o mesmo fosse breve, no seu segundo, um encastado toiro Silva, Romero sentiu muitas dificuldades em entender as acometidas deste toiro. Demasiadas passagens em falso, alguns toques e ferros falhados não foram perdoados pelo público presente que mostrou o seu desagrado e protestou o rejoneador espanhol.
Quando há toiros de verdade, a pedir contas, exigentes, quando há emoção, quando se sente o perigo, regra geral é sinal de uma grande tarde ou noite de pegas. E assim foi!
Grande, a decisão e a firmeza de António Goes, dos Amadores de Santarém. Braços de ferro a aguentar os derrotes poderosos do toiro, bem à primeira tentativa.
Para a cara do terceiro foi o valente forcado de Santarém, Fernando Montoya, que concretizou ao segundo intento, depois de não ter estado correto a receber o toiro na primeira intervenção. O grupo esteve com valor e coesão nas ajudas. Ruben Giovety, à primeira tentativa, com enorme decisão e excelentes ajudas, fez um pegão que levantou as bancadas.
Pedro Coelho pegou o primeiro toiro, pelo grupo de Coruche, à segunda tentativa, com garbo e valentia. O toiro fez um estranho no momento da reunião na primeira tentativa e o forcado não se fechou. Lição magistral de como se pegam toiros de João Ferreira. Demostrou que tem uma alma imensa e uns braços de ferro! Aguentou a potente e violenta investida do Teixeira e à primeira tentativa realizou uma das pegas da tarde com o grupo a ajudar bem. António Tomás fechou a tarde pelos de Coruche, numa grande pega à primeira tentativa. Viagem longa, com o toiro a tentar despejar, o grupo mostrou decisão e fechou uma pega que se antevia complicada.
No final da corrida, o júri composto por D. Francisco de Mascarenhas, Dr. Vasco Lucas e José Luís Gomes atribuíram justamente os troféus de Bravura e Apresentação ao quarto toiro da tarde da ganadaria Veiga Teixeira.
Dirigiu a corrida João Cantinho, assessorado pelo médico veterinário José Luís Cruz.
Síntese da corrida:
Concurso de Ganadarias: Conde de Maza ("bravucon" e com mobilidade); Canas Vigouroux (manso encastado); Miura (nobre e sem classe); Teixeira (bravo); Teixeira (reservado); Silva (bravo).
Cavaleiros: António Ribeiro Telles (volta e duas voltas aclamadas com o público de pé); Francisco Palha (volta e volta com chamada aos médios); Andrés Romero (silêncio e silêncio).
Forcados Amadores: Santarém - António Goes (volta); Fernando Montoya (volta) e Rúben Giovety (volta); Coruche - Pedro Coelho (volta); João Ferreira (volta) e António Tomás (volta)
*As voltas à arena, no final das lides, são concedidas pelo diretor de corrida como prémio à qualidade artística da atuação dos intervenientes ou pela bravura dos toiros