Governo aprova novas regras no combate à corrupção
O Governo aprovou a alteração da orgânica do Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC), que passa a ter um conselho de administração com três elementos e um quadro de pessoal próprio.
Segundo disse a ministra da Justiça, Rita Alarcão Júdice, na conferência de imprensa após o Conselho de Ministros desta quinta-feira, o objetivo da reestruturação passa por "dar uma nova vida à instituição de luta contra a corrupção em Portugal", com uma nova lei orgânica que cria um Conselho de Administração, "alterando a gestão assente num órgão unipessoal".
Os três membros do Conselho de Administração serão nomeados por Resolução do Conselho de Ministros, para mandatos de quatro anos, renováveis.
"Além disso, a lei vem dotar o MENAC de um quadro de pessoal próprio, não restringindo os seus trabalhadores aos oriundos da carreira de inspetor. Queremos um MENAC atuante, um MENAC visível e dissuasor. Mas também lhe exigimos mais, aumentando a capacidade de fiscalização da Assembleia da República sobre a sua atividade", disse a ministra.
A alteração da estrutura do MENAC é um dos quatro diplomas aprovados hoje pelo Governo, num dia que a ministra considerou ser "bom para a Justiça" e "bom para a luta contra a corrupção".
Em dezembro, à margem de uma conferência sobre corrupção, a ministra já tinha justificado a já anunciada reestruturação do MENAC, afirmando que o organismo instituído há cerca de três anos ficou "aquém da sua função".
A ministra fez ainda um breve balanço da implementação das 32 medidas da agenda anticorrupção do Governo: "De todas elas temos resultados para apresentar. Mais de metade está em execução, algumas já foram totalmente concretizadas e estão a dar bons resultados -- como a tramitação eletrónica do inquérito no processo penal. Quem disse que a Agenda Anticorrupção era apenas um 'powerpoint' enganou-se".
Sobre uma das medidas mais emblemáticas, o diploma da perda alargada de bens obtidos por via de corrupção, cujo anteprojeto o Ministério da Justiça tinha prometido para o final de janeiro, Rita Alarcão Júdice disse que "está na reta final", para ser aprovado pelo Governo e depois remetido ao parlamento.
A ministra da Justiça disse ainda que o grupo de trabalho dedicado à "promoção da celeridade processual e de combate aos expedientes dilatórios vai começar a trabalhar em breve".
Governo rejeita que nomeação política da liderança do MENAC comprometa independência
A ministra da Justiça rejeitou qualquer problema de independência do Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC) por passar a ser o Governo a nomear o novo Conselho de Administração da estrutura.
Com a reestruturação da orgânica e funcionamento da agência de combate à corrupção hoje anunciada pelo Governo, deixa de competir ao Presidente do Tribunal de Contas e ao Procurador-Geral da República a proposta de nomeação para a liderança do MENAC e passa a ser uma competência do Governo, através de uma Resolução do Conselho de Ministros.
Para a ministra da Justiça, que hoje apresentou em conferência de imprensa no final da reunião de Conselho de Ministros quatro diplomas aprovados respeitantes à sua tutela, a mudança na nomeação da cúpula do MENAC não representa qualquer problema de independência.
"Não acho que devamos lançar essa mancha sobre qualquer processo decisório", disse Rita Alarcão Júdice, sublinhando que há outros cargos de fiscalização que também são de nomeação política e que isso não representa um impedimento para o desempenho das suas funções.
"Vamos ouvir o presidente do Tribunal de Contas e o Procurador-Geral da República, mas a decisão compete ao Conselho de Ministros. O Governo não tem receio de tomar decisões e responder pelas decisões que toma", disse a ministra da Justiça.
Aprovada a contratação de 50 inspetores para combater corrupção autárquica
O Conselho de Ministros aprovou ainda a contratação de mais 50 inspetores especializados em corrupção nas autarquias, onde tem origem quase metade das queixas de corrupção recebidas pelo Mecanismo Nacional Anticorrupção.
Rita Alarcão Júdice explicou que o objetivo do Governo é "disponibilizar os meios necessários para revigorar a atuação das entidades que herdaram" as competências de combate à corrupção - Inspeção-Geral das Finanças (IGF) e Inspeção-Geral da Agricultura e Mar, Ambiente e Ordenamento do Território (IGAMAOT).
O Governo pretende que as competências de ajuda técnica e especializada na prevenção da corrupção continuem na IGF e na IGAMAOT, mas que estas entidades tenham mais meios para trabalhar.
"Está prevista a contratação de mais 50 inspetores até 2027. Desses 50, 30 são recrutados já este ano", acrescentou Rita Alarcão Júdice, com 20 inspetores para a IGF e 10 para a IGAMAOT.
Aprovadas mudanças na distribuição de processos nos tribunais
O Conselho de Ministros aprovou uma proposta de lei para que a distribuição dos processos nos tribunais seja feita apenas com a presença de um oficial de justiça.
Rita Alarcão Júdice referiu que este diploma será "porventura, o mais saudado por todos os operadores judiciais, sem exceção".
A regulamentação atual prevista no Código do Processo Civil exige que, durante a distribuição dos processos, além do funcionário judicial, tem também de estar presente um magistrado judicial e um magistrado do Ministério Público.
Agora, o Governo propõe, em forma de proposta de lei, que a distribuição seja "realizada pelos meios eletrónicos sem a necessidade de assistência por qualquer interveniente que não seja o oficial de justiça", esclareceu Rita Alarcão Júdice.
Para que as regras possam ser alteradas, o Governo quer ainda recuperar a figura de juiz de turno na distribuição, que terá como função decidir "as dúvidas do funcionário relativas à operação eletrónica da distribuição".
"Qualquer entropia ou suspeitas não são toleráveis. A qualidade e a eficiência da Justiça devem começar logo com a distribuição dos processos", acrescentou ainda a ministra da Justiça durante a apresentação dos quatro diplomas no âmbito do combate à corrupção.
Esta medida, acrescentou ainda Rita Alarcão Júdice, une juízes, funcionários judiciais, advogados e procuradores e "vai tornar mais eficiente o procedimento, eliminando a prática de atos inúteis que têm causado entropias no funcionamento diário dos tribunais".
Regras de acesso ao Supremo alteradas para permitir juízes mais novos
O Governo aprovou ainda um diploma que prevê mudanças nas regras de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ), para permitir o acesso de juízes mais novos.
Rita Alarcão Júdice explicou que a proposta do Governo passa por garantir que os mais novos "possam permanecer no STJ com um horizonte temporal mais alargado", diminuindo a rotatividade.
O objetivo é que possam concorrer ao Supremo Tribunal de Justiça os juízes desembargadores que se encontrem no terço superior da lista de antiguidade à data da abertura do concurso e não renunciem à promoção.
Atualmente, o critério exige que os juízes desembargadores estejam no quarto superior da lista.
O Governo propõe que, no âmbito da especialização, os juízes conselheiros possam escolher, "face às vagas disponíveis e entre as diferentes secções do Supremo Tribunal de Justiça, a secção em que pretendem exercer funções", explicou o ministério da Justiça.
Outra proposta é que o curso de formação específico dos juízes presidentes e dos magistrados do Ministério Público coordenadores deixe de ser feito antes de começarem a exercer funções e passe a ser frequentado após as respetivas nomeações.
Esta proposta de lei será agora enviada para a Assembleia da República.
Além das novas regras de acesso ao STJ, o Conselho de Ministros aprovou hoje também uma nova orgânica para o Mecanismo Nacional Anticorrupção, alterações às regras de distribuição de processos e mais meios para a prevenção da corrupção nas autarquias.
Sindicato do Ministério Público elogia propostas do Governo sobre corrupção
O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) elogiou esta quinta-feira as propostas apresentadas pelo Governo e aprovadas no Conselho de Ministros no âmbito do combate à corrupção.
"Nunca é demais recordar que a melhoria da celeridade e eficácia da resposta à corrupção é essencial para a credibilidade do próprio sistema de Justiça e, por essa via, para a afirmação de um verdadeiro Estado de Direito", referiu o SMMP em comunicado.
O SMMP congratulou-se, essencialmente, com a proposta de alteração das regras de distribuição dos processos judiciais, deixando de ser necessária a presença de magistrados judiciais e do Ministério Público e sendo apenas obrigatória a presença de um funcionário judicial.
O sindicato sublinhou também a importância da aposta na prevenção da corrupção nas autarquias locais e a alteração das regras de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) - propostas também apresentadas e aprovadas hoje.
No caso das regras de acesso ao STJ, o objetivo é permitir a entrada de juízes mais novos. Já no caso do combate à corrupção nas autarquias, foi aprovado um diploma para contratação de 30 inspetores especializados em matérias autárquicas durante este ano e mais 20 até 2027.
No entanto, apontou o SMMP, "é igualmente necessário lembrar que o combate eficaz à corrupção depende, em primeiro lugar, de uma genuína vontade política para dotar o Ministério Público e as forças policiais dos recursos materiais, humanos e tecnológicos necessários".
"As lacunas nos recursos humanos para combater este tipo de criminalidade têm sido apontadas tanto interna como externamente", acrescentou o sindicato.