'Assalto aos Aeroportos'. PCP lança livro sobre a privatização da ANA
Na sequência da venda da ANA - Aeroportos de Portugal à francesa Vinci, levada a cabo pelo Governo em 2013, e depois de o Tribunal de Contas (TdC), em janeiro de 2024, ter lançado o relatório da audição ao negócio, concluindo que que "não salvaguardou o interesse público", o PCP lança esta terça-feira um livro intitulado Dossier Privatização da ANA - Assalto aos Aeroportos, sob a chancela das Edições Avante!.
"No nosso entender, é um dos maiores assaltos aos recursos nacionais a que o país foi sujeito nos últimos anos", disse ao DN o membro da Comissão Política do Comité Central do PCP Vasco Cardoso, justifica a razão pela qual o livro é lançado só agora: "Nós, muitas vezes, somos sacudidos com muita espuma dos dias, com temas que se vão sucedendo, e aquilo que é fundamental muitas vezes fica esquecido."
Na tentativa de recuperar um tema que o PCP não conseguiu ver esmiuçado na Assembleia da República, quando, em abril do ano passado, a maioria dos deputados (PS, PSD e CDS) votou contra a proposta da bancada comunista para constituir uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre este negócio, surge agora este livro, "não apenas como um aumento de denúncia sobre o que passou, mas também de alerta quanto a futuras privatizações", explica Vasco Cardoso, acrescentando que também se trata de um aviso face à colocação "na agenda da necessidade do país não entregar durante o século XXI a gestão dos aeroportos nacionais a uma multinacional francesa como é a Vinci".
"Nós denunciamos aquilo que o Tribunal de Contas tornou público", reforçou o dirigente do PCP, aludindo às conclusões que aquela entidade fiscalizadora das despesas públicas destacou no documento.
"Face ao regime legal aplicável e aos contratos de concessão de serviço público aeroportuário celebrados com o Estado português, a privatização da ANA não salvaguardou o interesse público, por incumprimento dos seus objetivos", defende o documento do TdC, por “não ter sido maximizado o encaixe financeiro resultante da alienação das ações representativas do capital social da ANA" e por "não se ter verificado o reforço da posição competitiva, do crescimento e da eficiência da ANA, em benefício do setor da aviação civil portuguesa, da economia nacional e dos utilizadores e utentes das estruturas aeroportuárias geridas pela" concessionária, lembrando ainda que a empresa foi vendida por 1127,1 milhões de euros, 71,4 milhões de euros abaixo do valor oferecido pelo grupo francês e que o Estado tinha acordado (1198,5 milhões).
De qualquer forma, o documento frisa que, a 14 de dezembro de 2012, a Vinci ofereceu pela ANA 1198,5 milhões de euros, que era o resultado dos 3080 milhões iniciais, aos quais se deduzia o pagamento pela concessão, que eram 1200 milhões de euros, e a dívida da ANA, que em 30 de junho de 2012 totalizava 637,4 milhões. Para além disto, havia ainda 44,1 milhões de euros relativos a outras responsabilidades assumidas.
"Na prática, a ANA foi comprada por um valor mais baixo do que aquele que foi anunciado", acusou novamente Vasco Cardoso, afirmando que "o Governo [na altura, liderado por Pedro Passos Coelho], para mascarar os números, transformou aquilo em 3000 milhões de euros, quando na prática eram 1200 milhões. Mas mais grave do que isso é que se trata de um negócio da China, porque com um investimento de cerca de 1200 milhões de euros, a ANA prepara-se para buscar, nos 50 anos da exploração dos aeroportos, 23 mil milhões."
Para enquadrar tudo isto, Vasco Cardoso lembra que "já passaram 12 anos e agora a ANA vem a apresentar uma proposta ao Estado português que projeta para 2037 uma primeira fase do futuro aeroporto, sem dar nenhuma garantia de abandonar, entretanto, a Portela, que era uma das outras exigências da lei de bases do próprio contrato de concessão".
"Nós pensamos que isso é um negócio altamente prejudicial para o país", garante o membro do Comité Central comunista, lembrando que Portugal é "um dos quatro países na Europa que tem aeroportos privatizados, tem toda a sua rede aeroportuária privatizada".
"Não é por acaso que grandes países como a França, a Alemanha e outros nunca foram por esse caminho. Este governo prepara-se agora para privatizar também a companhia de bandeira [a TAP], portanto na prática é todo um setor", alerta Vasco Cardoso.
"A companhia aérea está a ser negociada seguramente com alguma multinacional estrangeira, sempre atrás da ideia de que a privatização é para libertar a economia da presença e da intervenção do Estado, para reduzir a dívida pública, mas as consequências de facto dos vários processos de privatização é saída de recursos para o estrangeiro", afirma o dirigente comunista.