Rui Rocha atira crescimento às borlas de Mariana Mortágua
Os últimos segundos do debate entre a coordenadora do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, e o presidente da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, já com as vozes dos dois líderes partidários a sobreporem-se uma à outra, e ambas à de João Póvoa Marinheiro, espelharam o que sucedera nos minutos anteriores: enquanto a bloquista acusou o liberal de "querer dar cheques aos privados", este defendeu que no programa do Bloco de Esquerda "não se encontra nada sobre crescimento" e somente a repetição de políticas que conduziriam a "mais estagnação" e "mais imigração".
A líder bloquista centrou-se nas "borlas fiscais" que vê decorrerem das propostas dos liberais para reduzir impostos. No IRC apontou 2,2 mil milhões de euros que a banca pagaria a menos ao ver a carga fiscal reduzida para metade e no IRS apontou inconstitucionalidade à solução de taxa única, por eliminar a progressividade - ouvindo do adversário que as isenções até certo nível de rendimento asseguram o cumprimento da Constituição -, e disse de seguida que apenas quatro presidentes de grandes empresas, os quais auferem entre si oito milhões de euros por ano, ficariam a ganhar 2,4 milhões de euros.
Rui Rocha respondeu com ataques à "demagogia do Bloco", referindo que dos cinco mil milhões de euros de diminuição de cobrança fiscal decorrente da aplicação do programa liberal, 1,5 mil milhões regressariam através dos impostos sobre o consumo, cabendo a recuperação do resto a uma redução de despesa pública de 3,5 mil milhões de euros, exigindo um "ajustamento de 2,8% ao Estado".
"Queremos um país a crescer e no programa do Bloco de Esquerda fala-se apenas quatro vezes em crescimento", disse Rocha, apontando a Iniciativa Liberal como o partido "dos que querem crescer pelo seu trabalho" e "das empresas que querem ser grandes". A esse propósito, defendeu a descida de IRC para Portugal "ser competitivo na captação de investimento" que permita aos jovens teremos salários mais altos em empresas que vêm para Portugal, em vez de serem eles a imigrarem ao encontro dessas empresas.
Mariana Mortágua acusou o mercado de "ter trazido turismo, construção e imobiliário" a Portugal, apontando ao Estado a vocação de "garantir que existe uma economia de investimento em áreas de futuro e com empregos qualificados". "Não queremos um país de baixos salários e temos um projeto para isso", garantiu, voltando a defender que a Caixa Geral de Depósitos promova descidas no crédito à habitação que "tenham um efeito de arrastamento nos outros bancos", ouvindo de Rui Rocha que "o Bloco de Esquerda anestesia a saúde, bloqueia a economia e traz prejuízo aos portugueses".
"Não se resolve o problema da habitação pondo portugueses contra portugueses ou portugueses contra estrangeiros", afirmou o presidente da Iniciativa Liberal, acusando Mortágua de o fazer com as propostas contra a compra de imóveis por não residentes e contra o alojamento local. Pelo contrário, o líder da Iniciativa Liberal advogou a descida do IVA do sector para 6%, a isenção de IMT (imposto municipal sobre transmissões onerosas) na compra de casa para habitação permanente e a utilização de património imobiliário do Estado.
Mortágua voltou a defender que a falta de casas, e o facto de Portugal ser o terceiro país mais caro do mundo quando se compara o preço das propriedades com os rendimentos, decorre do desvio de oferta para habitação de luxo "que tem um efeito de arrastamento nos preços". E ainda na própria construção, pois a seu ver só com a obrigação de 25% da nova oferta ser a preços acessíveis e restrições à aquisição por estrangeiros as empresas de construção não continuarão a optar pela construção e reabilitação de imóveis de luxo ou de hotéis.
Por seu lado, Rocha pôs em causa o programa do Bloco de Esquerda no que diz respeito à construção e reabilitação de casas a preços acessíveis, argumentando que o valor médio previsto "muitas vezes não cobre o custo do terreno". "Não percebo as vossas contas", disse, defendendo que os impostos podem representar "30% a 40% dos custos de construção".
A coordenadora bloquista reafirmou que a proibição de venda de casas a não residentes decorre do objetivo do seu partido de haver "habitação acessível para todos", ouvindo do líder da Iniciativa Liberal que, enquanto estado-membro da União Europeia, Portugal "não pode impedir cidadãos europeus de comprar casas". Perante isso, Mariana Mortágua mencionou que tal sucede em Malta e na Dinamarca, com Rocha a dizer que tal só é possível pela derrogação de tratados europeus. "A mesma exceção pode ser aplicada em Portugal", insistiu a bloquista, sem se esquecer de mencionar a subida de 60% no preço das casas em Braga, círculo por onde o interlocutor se candidata à Assembleia da República.
A cidade dos arcebispos também foi mencionada por Rui Rocha devido à parceria público privada que deixou de existir no hospital, quando "por enviesamento ideológico o Bloco de Esquerda impôs a reversão" do modelo de gestão nessa unidade hospitalar, tal como nas de Loures e Vila Franca de Xira. Citou o Tribunal de Contas em defesa desse modelo de gestão, tal como Mortágua também faria logo a seguir, mencionando que para a Iniciativa Liberal "tanto faz ser público ou privado", até porque teve na apresentação do programa eleitoral a responsável pelo maior grupo privado de saúde em Portugal - sem nomear Isabel Vaz, que é a CEO do Grupo Luz Saúde -, tendo esta dita que a saúde "é o grande negócio do século XXI".
Por seu lado, Rui Rocha defendeu a complementaridade entre sectores público, privado e social da saúde, recordando que os funcionários públicos pagam a ADSE "para terem acesso a diferentes escolhas". "O Bloco de Esquerda quer todos os outros reféns", acusou, colando a interlocutora à governação socialista passada de António Costa e à que poderá vir a existir com Pedro Nuno Santos.