Um - José Manuel Bolieiro - tem uma dívida no Governo dos Açores de quase 3200 milhões por resolver, o outro - Miguel Albuquerque -, mais de 5600 milhões no da Madeira. A diferença, atual, é que a Madeira vive, como diz o deputado da Iniciativa Liberal-Madeira Nuno Morna, a “eterna dívida” e um “refinanciamento perpétuo” - após o resgate financeiro de 2012 [a dívida estava nos 6328 milhões] - , enquanto os Açores, alerta Francisco César, líder do PS-Açores, estão à beira de “um resgate financeiro”. O Governo Regional dos Açores rejeita esta visão e diz que está “a resolver uma herança do Governo Regional socialista e a má-fé do Governo de Costa”..Francisco César realça que “há uma rutura de tesouraria”, bem como uma “incapacidade de pagar a fornecedores”, junto dos quais existe “uma dívida gigantesca”, e “cativações na ordem dos 100%”. “Não pagam a doentes deslocados, a clubes desportivos, a empresas, associações culturais, associações desportivas, não estão a pagar água e luz, não pagam as comparticipações devidas aos doentes… é um descalabro”, assegura o deputado na Assembleia da República e líder dos socialistas dos Açores..Francisco César avisa que “se nada for feito, vai haver um resgate financeiro”..“Resgate financeiro? Estamos é a resolver uma herança do Governo Regional socialista e a má-fé do Governo de Costa”, diz ao DN o secretário Regional das Finanças do Governo dos Açores. Duarte Freitas, que admite “dificuldades momentâneas de tesouraria”, explica que há, na “área da Saúde, dificuldades nos pagamentos, nomeadamente aos fornecedores, uma pressão muito grande” porque, em 2020, o PS regional, quando saiu, deixou a governação com uma “dívida, nesta área, de cerca de mil milhões euros”. .O governante do PSD recorda que em 1999, por via da intervenção de António Guterres, então primeiro-ministro, e de Sousa Franco, ministro das Finanças, o “contador da dívida na Saúde ficou a zeros. Ficou tudo pago, mas o PS conseguiu passar do zero para cerca de mil milhões de dívida”..O líder do PS-Açores insiste num paralelismo com o resgate e a situação precária da Madeira, em 2012, quando havia “falta de liquidez”, “falta de acesso a financiamentos externos”, “falta de dinheiro para pagar os salários dos funcionários públicos” e a confissão, contrariada, de Alberto João Jardim que se sentia de “calças na mão”. A “situação alarmante, preocupante” é semelhante à que afeta os Açores agora, diz Francisco César..O paradoxo? “Os Açores não têm um problema de receitas, os Açores têm um problema de despesa.”.A explicação? “É que apesar de a receita fiscal ter aumentado, dos fundos comunitários terem tido um valor recorde, das transferências do Estado terem aumentado, a despesa subiu a um valor astronómico.”.Duarte Freitas responde. O secretário Regional das Finanças dos Açores admite que “a receita fiscal cobre apenas 92% das despesas de funcionamento” e que há, por isso, “mais despesas do que receitas”, mas garante que, “felizmente, estas matérias estão agora a ser ultrapassadas” por já ter terminado a “tentativa de asfixia, o garrote financeiro” que o PS de Costa “fez à governação dos Açores”..A economia está numa fase robusta, cresce há 42 meses consecutivos, e tudo poderia “estar mais fácil” se o Governo de Costa tivesse pagado o que estava previsto em Orçamento do Estado - a transformação de dívida comercial em dívida financeira - desde 2022..“Nesse ano o despacho para os 75 milhões nunca veio. Em 2023, veio, mas só para 50 milhões. São 100 milhões que estão em dívida a fornecedores e boa parte vem de 2016. A diferença? Este ano o despacho veio a tempo e horas e para os 75 milhões”, acentua..“E até”, recorda, “atrasaram o pagamento na sequência do Furação Lorenzo, que só agora - com novo Governo - foram pagas”..Já para o dirigente do PS, a “rutura de tesouraria” deve-se, nomeadamente, “ao aumento de um conjunto de apoios, aos aumentos de todas as carreiras da Administração Pública - tal como pediram, à baixa de impostos, à descida das tarifas inter-ilhas”, entre outras medidas. Ou seja, diz, “não há travão à despesa”. .“E isto”, sublinha, apesar de, “desde de que tomaram posse [o Governo de Bolieiro], terem recebido em receitas e transferências mais 1600 milhões - o equivalente a quase um Orçamento dos Açores - do que o Governo anterior e de, recentemente, terem recebido [do Governo de Montenegro] um empréstimo de emergência de 110 milhões para refinanciamento de dívida que vencia”..Outro dado, acentua, é o “défice de cerca de 220 milhões” no Orçamento Regional proposto para 2025, o que significa “mais de 10% do Orçamento dos Açores que é de 1900 milhões de euros”..O outro problema? O risco de a região ter de devolver dinheiros do PRR por culpa de “um padrão de incapacidade”, das “baixas execuções” e da “incapacidade que a Região tem, neste momento, de cumprir com os seus compromissos financeiros”. .“Aquilo que verificamos”, garante Francisco César, “é que no próximo ano de 2025, que era o ano em que nós devíamos estar a crescer e a ter uma economia pujante, podemos vir a ter uma situação muito complicada do ponto de vista económico, social e de execução orçamental”..No caso da Madeira, Rogério Gouveia, secretário Regional das Finanças, considera afastado o cenário de um resgate, como o de 2012, porque, apesar de a Lei das Finanças Regionais (LFR) “condicionar a sustentabilidade financeira e o desenvolvimento da região”, todo o “trabalho que foi feito nestes últimos 11, 12 anos de redução” de uma dívida “gerível e com rácios de cobertura perfeitamente controlados e adequados”, e uma “gestão criteriosa” da região, foi permitindo, por exemplo, sucessivos “excedentes orçamentais”..O que é necessário, reivindica, “é assegurar que o Estado cumpra os seus princípios constitucionais” e se corrijam as mudanças de 2007 na LFR [nos Governos de Sócrates] que, “ostensivamente, vieram perturbar o relacionamento entre o Estado e as regiões” e que, até “hoje, não asseguram um equilíbrio”..“Não há garantias nem de segurança, nem de expectativa para o futuro. É sempre, a cada Orçamento, um suplício perceber quanto é que vamos ter de transferências”, explica..A cimeira entre Montenegro, Albuquerque e Bolieiro, sendo, por isso, um “sinal de compromisso e boa vontade do Governo” para alterar a LFR, terá de se traduzir “num passo significativo” que permita “avançarmos na resolução dos vários diferendos” com Açores e Madeira. “Acredito que não vamos conseguir tudo de uma assentada, mas é algo que os Governos anteriores [os do PS] nunca fizeram”, resume..Paulo Cafôfo, líder dos socialistas madeirenses, que defende a “correção das desigualdades derivadas dessa condição insular e ultraperiférica”, pede “uma revisão urgente” de uma LFR “aprovada em 2013 pelo Governo do PSD de Passos Coelho, com a concordância do PSD-Madeira”..“A autonomia administrativa não se cumpre sem o correspondente reforço da autonomia financeira (… ). A garantia da coesão territorial e social (…) não pode ser observada se a região não for dotada dos necessários recursos financeiros, que a atual lei, claramente, já não é capaz de acomodar (…), há custos com setores como a Educação e a Saúde que, apesar de estarem regionalizados, configuram direitos constitucionais que têm de ser observados (…). O aumento das transferências ao abrigo da Lei das Finanças Regionais é, naturalmente, um importante contributo para a sustentabilidade das Finanças Públicas Regionais”, defende..Os socialistas madeirenses reivindicam, na sua proposta, “um aumento do diferencial fiscal, a igualdade de tratamento entre as duas regiões autónomas, a introdução de exceções aos limites de endividamento, bem como que o Fundo de Coesão passe a ser calculado com base numa percentagem fixa das transferências do Orçamento do Estado, garantindo uma maior previsibilidade na determinação deste valor e a correção das assimetrias entre as duas regiões”..Os socialistas açorianos, que querem “corrigir diversas distorções, injustiças e componentes desatualizadas da legislação que enquadra o relacionamento financeiro entre as regiões autónomas e a República”, avisam que “se a proposta [do Governo] da Madeira [de 2021] fosse aprovada, e que tem o apoio do Governo dos Açores, a dívida pública na região face ao PIB poderia mais que duplicar em apenas um ano”.