Num discurso demorado, Pedro Nuno Santos começou por falar da economia e das concretizações do PS.
Num discurso demorado, Pedro Nuno Santos começou por falar da economia e das concretizações do PS.José Sena Goulão / Lusa

Programa eleitoral do PS. O jogo do “nós” contra “eles” e “um estado social forte”

Pedro Nuno Santos, durante a apresentação das propostas dos socialistas para as legislativas, falou num “novo impulso” do partido para Portugal e garantiu que “mudar não é desfazer” nem “destruir” nem “renunciar”.
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O PS apresentou este domingo o programa eleitoral que, ao longo de cerca de 140 páginas mostra as intenções do partido em apostar no estado social, ligando as políticas da recente governação socialista ao futuro e sem omitir críticas ao PSD. Apesar do líder do partido, Pedro Nuno Santos, na apresentação, ter garantido que tem “muito orgulho” no passado, ao qual, disse, está “muito agarrado”, a palavra de ordem foi “mudar”.


“Foi assim que construímos Portugal depois do 25 de Abril”, sublinhou Pedro Nuno Santos quase no início de um discurso demorado onde começou por falar na economia do país e das concretizações do PS. “Nós já não queremos um Portugal na média”, afirmara antes o secretário-geral socialista. “Mudar não é desfazer, mudar não é destruir, mudar não é renunciar “, considerou, antes de reconhecer que “há problemas novos que precisam de resposta”. Ainda assim, a ideia de que tem “orgulho nestes 50 anos”, referindo-se ao período democrático, acompanhou cada uma das ideias defendidas pelo recente líder socialista.


Antes de começarem as intervenções das figuras cimeiras do partido, como a coordenadora do programa, Alexandra Leitão, ou do ainda ministro das Finanças, Fernando Medina, os altifalantes do Teatro Thalia, em Lisboa, onde decorreu a apresentação, passaram a canção Liberdade, de Sérgio Godinho, cuja letra pareceu um roteiro do discurso que seria improvisado por Pedro Nuno Santos. “A paz, o pão, habitação, saúde, educação”, dita a canção. Mas não foi exatamente esta a ordem dos temas. 

Referindo-se ao slogan da sua moção - “Portugal inteiro” -, Pedro Nuno Santos descreveu várias concretizações do PS que evocou para justificar o programa que se seguiria, mas não poupou nas críticas ao PSD, cavando um fosso ideológico entre os dois partidos. Esta ideia foi mais evidente na parte do discurso dedicada ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas começou logo na apresentação das intenções para os impostos.


Afirmando que “o PS foi o partido que teve mais responsabilidades” nos resultados da qualificação da população logo depois do 25 de Abril, Pedro Nuno Santos destacou que “a economia não acompanhou o ritmo de qualificação do povo”. Por este motivo, apontou, “desenvolver a economia é mesmo o maior desafio”. “A direita não tem resposta”, criticou, acrescentando que “para eles a solução é a baixa do IRC”. Nesta matéria, o líder do PS disse que “40% das nossas empresas não pagam IRC” e que “0,2% das empresas são responsáveis por 45% das receitas” fiscais neste imposto. “Cá nós, queremos privilegiar quem reinveste os seus lucros”, sustentou, referindo várias vezes o “nós” e o “eles”. “Eles não têm solução para transformar e modernizar a economia portuguesa”, apontou enquanto assumiu que “nós não fizemos tudo bem ao longo dos anos”.


Ao inaugurar o tema da saúde, o líder socialista classificou o SNS como “a mais bonita construção coletiva do povo português”, motivo pelo qual , defendeu, “a resposta não é desistir dele, é investir nele”. “A AD [Aliança Democrática, a coligação pré-eleitoral entre PSD, CDS e PPM] tem um programa suficientemente redondo para tentar esconder-se aquilo que são as suas intenções”, acusou Pedro Nuno Santos antes de deixar um apelo: “Não nos deixemos enganar.” Na perspetiva de Pedro Nuno Santos, o objetivo da AD e dos outros partidos da direita é “deixar de investir no SNS e passar a investir no negócio privado da saúde”. 


O líder socialista continuou a apologia da saúde pública lembrando que o SNS “resolve mais problemas hoje do que resolvia em 2015”, o que também explica o aumento da “esperança média de vida do nosso povo”. “Hoje, temos mais portugueses a viver mais anos e isso é bom, mas o SNS está sob pressão”, destacou Pedro Nuno. Relembrando os dois anos da pandemia de covid-19 e sem fazer qualquer referência a tempos de espera nos hospitais, afirmou que “o SNS nunca diz que não a um cidadão que lhe entra pela porta”. 


Para ilustrar a relação entre a fiscalidade e a importância do estado social, com um foco no SNS, Pedro Nuno Santos contou a história de um amigo que “tinha um discurso conservador sobre impostos”, até que descobriu que tinha um linfoma. “Ficou com um futuro sombrio”, referiu, mas “teve resposta do SNS”. “Nunca mais na vida falarei de impostos”, citou Pedro Nuno Santos, lembrando as palavras do amigo anónimo que ilustrou a sua tese. 


“Não deixemos que destruam o Serviço Nacional de Saúde”, apelou, enquanto assumiu que quer investir no setor. “Vamos investir nos cuidados de saúde primários”, vamos permitir que os médicos que trabalham nas unidades residenciais dos idosos possam prescrever exames para que os idosos não tenham de se deslocar aos centros de saúde”, prometeu Pedro Nuno Santos. “Não podemos ter a saúde e a política social dirigida aos mais velhos separadas”, rematou.


Sobre o programa apresentado, o PS compromete-se a “reforçar e diversificar a oferta de cuidados de proximidade” destacando a “saúde oral e visual, pediatria, terapia da fala, psicologia clínica, saúde mental e nutrição”. O documento promete também “reforçar as respostas imediatas a pessoas sem médico e enfermeiro de família, mobilizando equipas multiprofissionais, envolvendo médicos e enfermeiros e outros profissionais ao serviço ou que estejam aposentados”. Para responder à necessidade de aumentar o número de profissionais no setor, o documento compromete o PS a “encetar negociações imediatas com os profissionais de saúde, no âmbito de um plano concertado de revisão das carreiras e de valorização salarial”.


A anteceder a apresentação de Pedro Nuno Santos, Fernando Medina qualificou o programa económico da AD como um “embuste”, garantindo que “mesmo que as coisas fiquem mais difíceis do que aquilo que” preveem, o PS terá condições para cumprir o que está no programa”.


Por seu lado, Pedro Nuno Santos, já no tema da habitação, acusou o atual presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, de andar a apontar para si próprio a construção de 1400 casas, que, de acordo com o secretário-geral do PS, se devem a Fernando Medina. 


Com o discurso centrado nos idosos, em matéria de pensões, Pedro Nuno Santos disse compreender que “o líder do PSD [Luís Montenegro] tenha de se reconciliar com os pensionistas, mas primeiro vai reconciliar-se com a verdade”. Recuperando o tema do “nós” contra “eles”, o líder socialista lembrou que o PSD, na sua governação anterior, tentou que os cortes nas pensões “fossem permanentes” e não só “durante aqueles anos” de intervenção da Troika. “Só não foram permanentes porque o Tribunal Constitucional os chumbou”, por duas vezes, concluiu.

Principais medidas do programa

Combate à pobreza
O PS, na rubrica que inclui apoios sociais, pensões e salários, compromete-se a “aprofundar a trajetória de valorização das pensões, em particular dos escalões mais baixos, assegurando em todos os anos da legislatura o integral cumprimento da fórmula de atualização [indexada à inflação], sem prejuízo da valorização adicional nos grupos mais desfavorecidos”. Insistindo na ideia de estado social a cumprir o seu papel, os socialistas prometem “rejeitar quaisquer tentativas de privatização, total ou parcial, do sistema de pensões, bem como de qualquer exercício ou experiência de ‘plafonamento’ de contribuições e pensões, que enfraquece a solidez financeira do sistema e limita a sua capacidade de garantia de proteção nas próximas década”. No que diz respeito ao Salário Mínimo Nacional, a missiva do PS passa por “estabelecer, em diálogo social na Comissão Permanente de Concertação Social, uma trajetória plurianual de aumento do SMN que permita atingir pelo menos os mil euros em 2028”. 

Saúde
Começando por uma abordagem aos idosos, o PS assume que quer “criar uma ‘via verde’ de acesso e ligação dos profissionais de saúde hospitalares aos profissionais de saúde das estruturas residenciais para pessoas idosas, evitando, tanto quanto possível, a ida às urgências hospitalares e o internamento”, e “reforçar a assistência de saúde a idosos no domicílio, incluindo a vertente do apoio domiciliário”. Para poder garantir que há quem responda às necessidades dos utentes, uma das propostas do PS passa por “encetar negociações imediatas com os profissionais de saúde, no âmbito de um plano concertado de revisão das carreiras e de valorização salarial, reforçando a vertente de formação e investigação e melhorando as condições de trabalho”.

Como resposta a algumas das carências mais óbvias do SNS, o documento apresentado ontem pelo PS inclui o objetivo de “reforçar e diversificar a oferta de cuidados de proximidade, melhorando o acesso a, entre outras, respostas de saúde oral e visual, pediatria, terapia da fala, psicologia clínica, saúde mental e nutrição”.  Perante a acusação, várias vezes evocada pelos partidos da oposição, os socialistas prometem ”reforçar as respostas imediatas a pessoas sem médico e enfermeiro de família, mobilizando equipas multiprofissionais, envolvendo médicos e enfermeiros e outros profissionais ao serviço ou que estejam aposentados”. Esta última medida estabelece um paralelismo com o que a Iniciativa Liberal propõe para a educação, indo buscar profissionais que estejam reformados e que sintam que podem dar resposta à escassez de mão de obra no setor.

Habitação
Para além do alargamento do “parque público de habitação”, fruto de um investimento que surge sob a forma de promessa neste documento, o PS ainda traz para o debate que antecede as eleições legislativas a promessa de que o Estado vai “prestar uma garantia pública ao financiamento bancário nos créditos para aquisição de casa própria de pessoas até aos 40 anos que ainda não tenham nenhuma habitação em seu nome”. De igual modo, os socialista dizem querer “aumentar a despesa dedutível com arrendamento em sede de IRS em 50 euros por ano até atingir os 800 euros”. 

Comunicação social
Perante os “riscos de concentração e opacidade na titularidade dos órgãos de comunicação social” e a “fragilidade financeira das empresas e na adaptação ao digital”, o PS mostra-se interessado, neste documento, em “rever o modelo de regulação da comunicação social, ao nível das competências do regulador em função das novas obrigações” e “densificar a Lei da Transparência dos média a fim de equacionar obrigações especiais relativas à constituição da propriedade”. Para além desta propostas, o PS propõe-se, caso vença as eleições, a “assumir uma posição mais significativa na estrutura acionista da Lusa - Agência de Notícias de Portugal, SA, disponibilizando os seus serviços sem custos a todos os órgãos de comunicação social”. Por fim, o documento inclui a a promessa de “criar um incentivo à leitura de jornais para todos os jovens que completam a sua maioridade, através da atribuição de um cheque-jornal para aplicação em assinatura(s) de órgãos de informação”.

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