Pedro Nuno diz ser "muito bem-vindo" manifesto das 50 personalidades sobre justiça
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Pedro Nuno diz ser "muito bem-vindo" manifesto das 50 personalidades sobre justiça

Secretário-geral do PS recusou que manifesto possa ser encarado como pressão, porque "nenhum agente judicial está acima da avaliação e de escrutínio".
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O secretário-geral do PS considerou esta sexta-feira "muito bem-vindo" o manifesto de 50 personalidades sobre a justiça e recusou que possa ser encarado como pressão, porque "nenhum agente judicial está acima da avaliação e de escrutínio".

Questionado pelos jornalistas acerca do manifesto, o líder do PS, Pedro Nuno Santos, disse que os socialistas receberam "de bom agrado" o documento, "escrito por individualidades de reconhecido mérito nacional, altamente respeitadas, com uma grande experiência de vida, de diferentes quadrantes políticos".

"E é importante que nós tenhamos todos consciência que não existe nenhuma área da vida humana e da sociedade portuguesa que esteja acima do escrutínio, acima da crítica", defendeu.

Segundo o líder socialista, que falava aos jornalistas à chegada à feira agropecuária Ovibeja, no parque de feiras e exposições de Beja, "os políticos são avaliados, são escrutinados", tal como "qualquer trabalhador é avaliado pelo seu chefe, pelo seu diretor".

"A justiça, obviamente, é uma área também de avaliação e de escrutínio. Nenhum agente judicial está acima da avaliação e de escrutínio e, por isso, é com bom agrado que nós recebemos esse manifesto", argumentou, considerando que esta "iniciativa da sociedade civil deve suscitar debate".

O PS vai analisar o manifesto, afiançou, prometendo que o seu partido estará "nesse debate, com toda a certeza".

Questionado sobre se o manifesto sobre a justiça poderá ser interpretado como uma forma de pressão naquela área, Pedro Nuno Santos rejeitou essa ideia.

"A independência do poder judicial, mas a independência também do poder político são vitórias da democracia e ninguém deve temer que nós possamos avaliar-nos uns aos outros, falar do trabalho uns dos outros. É assim que se vive em sociedade e, por isso, esse manifesto é muito bem-vindo e qualquer ataque a quem o queira discutir é errado", insistiu.

Para o líder do PS, "todos os temas devem ser alvo de debate em democracia" e "ninguém está acima do debate e do escrutínio", incluindo quem está na justiça, "era só o que faltava".

"Não se trata de pressão. Nós não podemos é estar sistematicamente a ser chantageados com essa ideia de pressão, como se houvesse um tema sobre o qual não se pode falar porque se está a fazer pressão se se falar dele. Isso é que é inaceitável", contrapôs.

E questionado sobre se há razões que justifiquem este manifesto, Pedro Nuno Santos afirmou não ter "a menor dúvida" de que "a atuação do Ministério Público (MP) deve ser alvo de debate político e de debate público".

"Não seja isso interpretado como pressão. A independência do poder judicial deve ser salvaguardada, está prevista na Constituição, e a independência do sistema político também está salvaguardada e protegida na Constituição", frisou.

Um grupo de 50 personalidades fez um apelo ao Presidente da República, Governo e parlamento para que sejam tomadas iniciativas que, respeitando a independência dos tribunais, a autonomia do MP e as garantias de defesa judicial, sejam resolvidos os "estrangulamentos e das disfunções que desde há muito minam a sua eficácia e a sua legitimação pública".

Assinam a petição, entre outros, os ex-presidentes do parlamento Augusto Santos Silva, Ferro Rodrigues e Mota Amaral, os anteriores líderes do PSD e do CDS, Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos, os ex-ministros Leonor Beleza, David Justino, Fernando Negrão, António Vitorino, José Vieira da Silva, António Barreto, Correia de Campos, Alberto Costa, Pinto Ribeiro, Maria de Lurdes Rodrigues e o ex-presidente do Tribunal Constitucional João Caupers.

IL admite reflexão sobre justiça mas considera que manifesto não acrescenta muito

O presidente da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, mostrou-se favorável a uma reflexão sobre a justiça, desde que não aconteça a propósito de casos concretos, e considerou que o manifesto divulgado não acrescenta muito.

"Eu creio que é um exercício de liberdade, mas não creio que daí venha nenhuma novidade, nenhuma mudança por via desse manifesto essencial na justiça. A justiça precisa de facto de ser pensada, é necessário fazê-lo, não creio que esse manifesto acrescente muito a essa intenção", defendeu.

"Não creio que seja o contributo deste manifesto que vai trazer alguma alteração especial em matéria de justiça. Os problemas da justiça são outros, têm a ver com a sua própria organização, sobretudo também com os meios e com medidas, com medidas direcionadas na área da justiça administrativa e da justiça criminal, que permitam uma maior celeridade dos processos", defendeu, indicando que a IL tem "propostas concretas" nestas áreas.

Rui Rocha defendeu que não é "estando sempre e constantemente a atacar a justiça e a suscitar questões relativas à justiça" que se cria o "contexto necessário para uma discussão como deve ser".

O liberal disse estar disponível "para discutir com todos e para ouvir todos nesta matéria", mas salientou que "discutir justiça a propósito de factos concretos, de casos concretos, nunca foi boa política".

"Reflexões mais amplas sobre justiça parecem-me sempre oportunas, feitas com a tranquilidade necessária, com a boa-fé necessária. Faremos a nossa parte no parlamento, trazendo medidas concretas nesse sentido", indicou.

Questionado se considera este manifesto um ataque à justiça, o líder da IL recusou, indicando que se trata de "um exercício da liberdade de expressão natural, desejável".

"Os cidadãos devem organizar-se e partilhar as suas ideias, mas quando vejo como subscritor por exemplo Ferro Rodrigues não fico com a ideia de que sejam contributos que vão ser determnantes na evolução que pretendemos para a justiça", defendeu.

Rui Rocha afirmou também que pode ser uma forma de pressão sobre o poder político, mas disse ter "dúvidas se essa pressão traz algo de útil".

"Às vezes fala-se da necessidade de pactos de justiça, não tenho nada contra pactos de justiça, o que espero é que esse desejo de haver pactos de justiça também não sejam subterfúgios para paralisar a discussão", indicou.

Na ocasião, o presidente da IL foi questionado também sobre a proposta do Governo de um suplemento de missão para os elementos da PSP e da GNR entre os 365,13 e os 625,94 euros, que vai substituir o atual suplemento por serviço e risco nas forças de segurança.

Rui Rocha defendeu que as forças de segurança estejam "bem preparadas" e sejam "bem remuneradas" mas disse ser necessário "conhecer os custos da medida", apelando ao executivo que divulgue esses números.

"Isto tem que ser feito com equilíbrio, tem que ser feito com justiça e continuamos a dizer que a administração pública carece de uma reforma", defendeu.

O líder da IL indicou que o seu partido não pretende avançar com propostas, mas está disponível para "viabilizar soluções nesta matéria" desde que o Governo diga "quanto é que estas propostas valem e se está ou não disponível para fazer essa reforma do Estado, para apostar no crescimento económico".

PCP disponível para reflexão sobre justiça mas sem atingir autonomia do Ministério Público

O PCP manifestou-se disponível para uma reflexão sobre a justiça, mas realçou que não aceita que sejam atingidos a independência do poder judicial, a autonomia do Ministério Público e o respeito pelos direitos fundamentais.

Esta posição foi transmitida aos jornalistas pelo deputado do PCP António Filipe, na Assembleia da República, a propósito do manifesto em que 50 personalidades pedem "um sobressalto cívico que leve os responsáveis políticos a assumirem as suas responsabilidades e a elegerem a reforma da justiça como inequívoca prioridade na defesa do Estado de direito democrático".

Sem nomear ninguém, António Filipe começou por referir que alguns dos subscritores desse manifesto "tiveram grandes responsabilidades na governação do país e designadamente na área da justiça" e "nessa altura não levaram à prática aquilo que agora reivindicam", mas acrescentou que, "em todo o caso, são opiniões que devem ser consideradas".

"O PCP não se eximirá à reflexão que é necessário fazer sobre o funcionamento da justiça, sendo que para nós há princípios fundamentais que não devem ser atingidos, não devem ser lesados, designadamente a independência do poder judicial, a autonomia do Ministério Público e o respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos. Tudo princípios constitucionalmente consagrados", afirmou.

Para o PCP, "dentro destes limites, evidentemente que faz sentido haver uma reflexão sobre o funcionamento da justiça, sobre melhoramentos a introduzir no funcionamento da justiça por forma a eliminar os principais estrangulamentos que afetam este setor".

Sobre o manifesto "Por uma reforma da justiça", o deputado considerou que "aborda um conjunto muito vasto de aspetos" e constitui "uma contribuição para um debate que é necessário" na sociedade portuguesa, que na Assembleia da República "dependerá naturalmente das iniciativas do Governo e dos grupos parlamentares".

Realçando que "mesmo nesta legislatura já há iniciativas do PCP sobre este setor", António Filipe assegurou que o seu partido "participará nesse debate" na Assembleia da República, com contributos "relativamente a cada ponto concreto".

O deputado do PCP manifestou preocupação com "a morosidade da justiça" e "a forma como o funcionamento da justiça em alguns momentos pode ser lesivo de direitos fundamentais dos cidadãos", admitiu que o funcionamento da justiça pode melhorar e que "eventualmente o legislador pode ter aí um papel importante".

António Filipe disse que "a questão de saber se haverá alguma iniciativa lesiva da autonomia do Ministério Público, da independência do poder judicial, alguma ingerência no funcionamento da justiça é algo que terá de ser evitado no local certo, que é a Assembleia da República".

"E nós cá estaremos, naturalmente, para preservar aqueles valores que são essenciais ao Estado de direito democrático e não permitir, obviamente, naquilo que de nós depende, que haja alguma possibilidade de o poder político poder interferir no funcionamento da justiça", reforçou.

Chega disponível para reflexão que melhore funcionamento da Justiça mas "não para proteger políticos"

O presidente do Chega defendeu que o parlamento deve refletir sobre a Justiça "para melhorar o seu funcionamento, não para proteger políticos" e indicou que o partido levará ao Tribunal Constitucional propostas que ameacem a "separação de poderes".

 "Eu acho que o parlamento tem de fazer uma reflexão sobre a Justiça. Deve fazê-lo sem a pressão destes casos e deve fazê-lo para melhorar o seu funcionamento, não para proteger políticos", afirmou André Ventura numa declaração aos jornalistas na Assembleia da República.

André Ventura criticou esta iniciativa e considerou que dá razão ao seu partido quando diz que "a Justiça está debaixo de um ataque como nunca esteve antes, provavelmente desde processo Casa Pia".

"Eles aí estão todos: Ferro Rodrigues, Rui Rio e outros, os arautos que sempre defenderam o controlo político do Ministério Público, o controlo político das instituições da Justiça. Este manifesto mais não é do que um pedido do sistema político central a dizer controlem lá a justiça, porque isto está a causar-nos problemas", considerou.

"Não contarão connosco, porque fazer política de ataque à Justiça em cima de casos concretos, neste caso envolvendo políticos, que somos nós, que estaremos a legislar em causa própria e em defesa própria, será uma vergonha para o povo português", adiantou.

O presidente do Chega defendeu que "é preciso uma reforma da Justiça e uma reflexão sobre a justiça", mas rejeitou "cortar poderes à Polícia Judiciária ou ao Ministério Público".

"A reforma tem de ser feita no sistema prisional, tem de ser feita no sistema de penas, tem de ser feita no sistema de recursos. É aí que temos de atuar", defendeu.

"Tudo o que for reformar a justiça para melhorar em prazos, em tempos, 'timing' e recursos cá estaremos", acrescentou.

André Ventura indicou também que "se o PS ou PSD avançarem com alguma proposta neste sentido, não contarão o Chega" e referiu que o partido pedirá "ao Tribunal Constitucional para fiscalizar preventivamente qualquer destas medidas que coloca em causa a separação de poderes".

O líder do Chega indicou também que irá apelar "ao Presidente da República que não promulgue a legislação que saia daqui".

Ventura acusou PS e PSD de quererem "controlar a Justiça e controlar Ministério Público".

BE revê-se nas preocupações do manifesto sobre a justiça e defende debate no parlamento

O Bloco de Esquerda defendeu que o parlamento deve iniciar uma reflexão sobre o estado da justiça, que leve a "mudanças estruturais", reiterando as suas preocupações relativamente a "vários episódios" que envolvem o Ministério Público.

A posição do Bloco de Esquerda foi manifestada pelo seu líder parlamentar, Fabian Figueiredo, numa reação na Assembleia da República.

"O Bloco de Esquerda já tem expressado as suas preocupações em relação a vários episódios recentes e outros menos recentes que envolvem o Ministério Público e vários processos", disse o líder parlamentar bloquista, sublinhando que o partido está "muito disponível" para debater "uma reforma da justiça" que considera ser necessária.

Fabian Figueiredo referiu que o manifesto junta "muita gente que está muito distante do Bloco de Esquerda", com signatários "do campo da esquerda, muitos do campo da direita, da área da política, da área do direito, uns têm percurso como magistrados, outros como conhecidos juristas".

Mas, vincou: "há um incómodo, há uma preocupação na sociedade portuguesa e nós achamos que a Assembleia da República deve ser sensível a essa preocupação e essas 50 personalidades exprimem uma opinião, creio eu, que é transversal na sociedade portuguesa (...) por isso nós entendemos que a Assembleia da República deve iniciar uma reflexão sobre o estado da justiça e estamos muito disponíveis para um amplo debate que leve a mudanças estruturais na justiça portuguesa".

"Independentemente da avaliação que cada um de nós faça da maioria absoluta, houve um Governo que se demitiu, houve uma Assembleia da República que foi dissolvida por força de uma investigação de um parágrafo, mas sobretudo uma investigação que está a cair que nem um baralho de cartas e isso, no mínimo, deve levar-nos a uma reflexão e a um debate, porque isto é inédito em 50 anos de democracia, é muito incomum na Europa ou em qualquer outro regime democrático", declarou.

Para Fabian Figueiredo, seria "um mau sinal" se a Assembleia da República, constatando estes factos, havendo estes apelos e uma preocupação que "todas e todos" sentem "ficasse indiferente".

O bloquista disse ainda que o BE se revê na preocupação que vários setores, nomeadamente do jornalismo, da justiça, da política, da academia, "têm expressado sobre vários casos recentes e sobre uma forma de atuação da justiça que tem levantado muitas dúvidas".

Notou que até "várias figuras centrais" do Ministério Público têm escrito artigos de opinião, dado entrevistas em que expressam o seu incómodo que é também incómodo do Bloco de Esquerda.

"Vários dos caminhos que são apontados, nós revemo-nos neles", comentou, realçando que o debate sobre o estado da justiça não se deve esgotar no campo político, deve ser transversal.

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