Direita junta-se toda para aprovar sessão solene do 25 de Novembro
A maioria de direita resultante das eleições de 30 de março, disfuncional desde o início da legislatura, permitiu aprovar a deliberação, apresentada nesta terça-feira pelo grupo parlamentar centrista, para que a Assembleia da República passe a ter uma sessão solene anual comemorativa do 25 de Novembro. Os 138 deputados do PSD, CDS-PP. Chega e Iniciativa Liberal (IL) votaram a favor, PS, Bloco de Esquerda (BE), PCP e Livre estiveram contra, e o PAN absteve-se, traduzindo as divergências num debate que foi uma viagem no tempo aos primeiros 19 meses do regime que está a celebrar o 50.º aniversário.
Para trás ficou outra proposta, do Chega, para tornar feriado nacional a data em que, no ano de 1975, forças militares defensoras da democracia contiveram a sublevação de tropas ligadas à esquerda radical, colocando fim ao que se convencionou chamar Processo Revolucionário em Curso (PREC). A favor só os 50 deputados do Chega e os dois do CDS-PP, com os oito da IL a absterem-se. Melhor sorte teve a deliberação dos liberais para a Assembleia da República assinalar com uma sessão solene o 50.º aniversário do 25 de Novembro, no âmbito das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril de 1974. O PS juntou-se à direita na aprovação, e o Livre ao PAN na abstenção, com o BE e o PCP sós no voto contrário.
O debate arrancara com o líder parlamentar centrista, Paulo Núncio, a apresentar a proposta de comemoração anual como “obrigação histórica” de um partido fundador da democracia. Na esquerda do hemiciclo havia muitas clareiras, com somente dois deputados do Bloco de Esquerda (Joana Mortágua e Marisa Matias), do PCP (António Filipe e Paula Santos) e do Livre (Rui Tavares e Isabel Mendes Lopes), enquanto Francisco Assis contrastava com o resto da bancada do PS por aplaudir passagens da intervenção de Núncio. O centrista, para quem “separar as duas datas [25 de Abril e 25 de Novembro] é um erro histórico”, disse que a intervenção militar protagonizada por Ramalho Eanes e Jaime Neves “impediu que Portugal caísse novamente numa deriva totalitária”.
Reagindo a essa intervenção, Rui Tavares alegou que, sem questionar a importância da data, não percebia o que a direita pretendia assinalar, ao que Núncio respondeu que se celebrava o fim do PREC, caracterizado por falta de liberdade de pensamento, de imprensa, económica e política. A partir daí acentuou-se a clivagem ideológica. O presidente da IL, Rui Rocha, citou George Orwell para denunciar a “tentativa de controlo do passado pela extrema-esquerda”, a deputada do Chega Vanessa Barata disse que “foi possível travar” uma ditadura de esquerda “que parecia ser certa”, e o social-democrata Bruno Vitorino ligou extremismos do passado e do presente, mencionando “experiências sociais” nas escolas feitas por “radicais esquerdistas”. Já o comunista António Filipe, um dos raros parlamentares que viveram o PREC, atribuiu a proposta centrista ao “campeonato de radicalismo” na direita nacional, e a bloquista Joana Mortágua criticou uma “diabolização do PREC” por quem pretende a “normalização do Estado Novo”.
Pelo PS falou Francisco Assis, no que terá sido a sua última intervenção antes de ir para o Parlamento Europeu. Citando Mário Soares, como muitos outros fizera,, admitiu que “houve risco real de instauração de um regime autoritário, que levado às últimas consequências, seria um regime totalitário de inspiração marxista”. Mas terminou aquilo que o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, descreveu como “uma lição, sobretudo ao PS”, deixou claro que a bancada não aprovaria a proposta centrista. E muito menos a do Chega.