"Devia fazer-se limpeza nos pequenos partidos para evitar o desprestígio da política"

O politólogo defende que há forças partidárias que não ​​​​​​​fazem sentido existir e que acabam por arrastar para o descrédito outras que, apesar de pequenas, têm sedimento político.

É importante que a comunicação social dê espaço aos pequenos partidos sem representação parlamentar?
A resposta é tão simples, quanto os que entraram na última eleição, o Livre, Cotrim de Figueiredo, Ventura e antes disso o PAN, também começaram assim. Todos têm esse direito enquanto partidos. A questão está na Lei dos Partidos. O que temos aqui é uma mistura de duas coisas: o chamado partido do 'alvará', que não dá prova de vida durante anos, faz um relatório e que serviu para fazer aparecer o José Manuel Coelho na Madeira e para alguns autarcas que querem ser independentes e que precisam disso, coisa que desprestigia o conceito de partido; e depois os que estão em transição, partidos de um homem só como o do Marinho e Pinto (PDR) e o do Santana Lopes (Aliança) e que alguns fiéis decidiram manter a organização tendo ela já falta de alma e de contexto. Acontece que grande parte dos partidos que se apresentaram estão nesta situação, embora haja um novo que tem raiz e organização que é o Volt. Poderá haver o Movimento Partido da Terra (MPT), que é um resto. Mas na Lei dos Partidos devia fazer-se uma limpeza nos pequenos partidos para evitar o desprestígio da política e da representação, como ficou patente no debate de terça-feira, na RTP.

O debate com os 11 pequenos partidos foi desprestigiante para a democracia?
Sem dúvida que foi. Pareciam as mensagens dos soldados pelo Natal, com a sogra Fernanda, etc, etc. Não tiveram o mínimo de qualidade e seria um gesto útil fazer uma limpeza dos arquivos, pelo menos obrigá-los a repor o número de assinaturas, não sendo um prazo anual, mas isso abateria das listas esse conceito de partido. A maior parte destes partidos não corresponde ao que é substancialmente um partido. E isso desprestigia a democracia.

Isso não ajuda a descredibilizar a própria política aos olhos dos eleitores?
É evidente que leva a isso porque não há propriamente projeto e se têm direito como partido, e devem tê-lo, em igualdade de circunstâncias devem demonstrar que merecem título de partido.

Falou de forças que estão no meio destes pequenos partidos, nomeadamente o Volt Portugal...
O Volt é um partido europeu e existe em mais três ou quatro países da Europa e corresponde a uma linha.

... mas o facto de aparecer misturado com estas forças com discursos tão erráticos e sem conteúdo, acabam por os desvalorizar?
Exatamente. Isto desprestigia os partidos que têm projeto, mesmo sendo pequenos e novos, porque por causa do agenda setting da comunicação social ninguém lhes vai dar importância. E os próprios tempos que antena de algumas destas forças tornam-se penosos.

E como encarou os discursos negacionistas da pandemia que se ouviram no debate da RTP?
Mas nem isso teve nível de negacionismo, viu-se que foi puro oportunismo. Nem para negacionista teve nível porque o negacionismo, apesar de tudo, é uma corrente pequena. Nem nisso foram bons. Esqueci-me de dizer que o o trotskista da 4.ª Internacional, o MAS não se inclui neste conjunto, tem alguma lógica e coerência. E outros que são uma espécie de museu da política, como o PCTP-MRPP, sem Arnaldo Matos ou o Garcia Pereira, o que os transforma em instrumentos de museu.

Sem alteração da Lei dos Partidos não há solução para isto?
Não, não há. E permite que a agenda setting boicote determinado número de forças que tinham razão de existir, como o Chega, o IL, e o Livre. E é perigoso porque não abre as portas à concorrência. O Nós Cidadãos também tem alguma razão, também devíamos abrir as portas a candidaturas independentes.

Mas candidaturas independentes também não podiam gerar figuras do género dos líderes dos pequenos partidos sem substância?
Mas é diferente. Em Espanha neste momento há inúmeros pequenos partidos da chamada Espanha interior esquecida e que entram no Parlamento e têm legitimidade. Se aparecesse um partido dos calceteiros, dos caçadores e dos defensores da tauromaquia, isso sim, tinha razão de ser. Ou partidos regionais que é outra proibição estúpida, também excluo o JPP dos partidos sem sentido, porque tem razão de ser na Madeira. O perigo disto é o partido 'alvará', devíamos limpar os cadernos e não chamar partido a tudo o que tem uma inscrição formal. Todos nasceram como uma certa necessidade social, foram tentativas, mas depois desapareceram. Os partidos grandes têm culpas e têm alimentado isto, veja-se o que acontece com o Medina que fez uma coligação e quis dizer que tinha lá o Livre e mais este e mais aquele. Há muitas coligações a nível autárquico com estas pequenas forças. A culpa é dos grandes que os usam em determinado momento.

paulasa@dn.pt

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