Costa garante que entre Governo e Presidente "nunca há braços de ferro"
O primeiro-ministro recusou este sábado que exista um conflito ou um braço de ferro entre Governo e Presidente da República, admitindo apenas "divergências" entre o parlamento e o seu executivo sobre as competências de cada um.
Esta posição foi transmitida por António Costa em declarações aos jornalistas, em Luanda, à margem da Cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), depois de questionado sobre a possibilidade de o Governo recorrer ao Tribunal Constitucional após Marcelo Rebelo de Sousa ter promulgado dois diplomas sobre professores.
Um dos diplomas do parlamento obriga o Governo à abertura de um concurso de vinculação extraordinária de professores nas escolas do ensino artístico especializado e o outro obriga o executivo minoritário socialista a negociar a revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário.
Questionado se existe um braço de ferro entre o Governo e o Presidente da República, António Costa rejeitou essa tese.
"Em primeiro lugar, entre o Governo e o Presidente da República nunca há braços de ferro. Há uma relação institucional normal", respondeu.
O primeiro-ministro procurou alertar depois "para uma confusão que nunca deve existir" na opinião pública e que disse "aproveitar a ocasião para sinalizar isso mesmo".
"Quando há uma divergência entre o Governo e a Assembleia da República sobre as respetivas competências, o conflito nunca é com o Presidente da República. Quando muito, esse conflito seria entre o Governo e a Assembleia da República. Mas, ainda assim, não seria drama, porque é o funcionamento normal das instituições", argumentou.
António Costa referiu depois que o seu executivo "respeita a Assembleia da República e a Assembleia da República respeita o Governo".
"Sobretudo, todos temos de respeitar a Constituição. Quando há dúvidas sobre a constitucionalidade [de diplomas], como somos um Estado de Direito, há uma entidade própria que se deve pronunciar e fixar qual é o juízo constitucional, que é o Tribunal Constitucional", acrescentou.
A falta de sintonia entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa na avaliação e no combate à pandemia foi evidente nos meses de junho e julho. Mas a maioria dos portugueses não atribui demasiada importância às divergências. De acordo com uma sondagem da Aximage para DN, JN e TSF, são muitos mais os que classificam a relação entre Presidente e primeiro-ministro como boa ou muito boa (52%) do que os que consideram que ela é má ou muito má (8%).
O primeiro-ministro anunciou entretanto este sábado que o Governo vai levar já ao parlamento o acordo de mobilidade no âmbito da CPLP, tendo em vista que seja ratificado logo no início da próxima sessão legislativa, em setembro.
Esta prioridade "imediata" dada pelo Governo português à ratificação parlamentar deste acordo no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) - assim como ao respetivo quadro legislativo sobre circulação e habilitações académicas - foi transmitida por António Costa em declarações aos jornalistas sobre os trabalhos da cimeira de Luanda.
"O compromisso que Portugal assume é que, logo na reabertura dos trabalhos da Assembleia da República, apresentaremos este acordo para ratificação e também o quadro legislativo que permitirá agilizar quer a circulação, quer o reconhecimento das habilitações [académicas], porque isso é fundamental para a vida das pessoas", declarou o líder do executivo português.
Perante os jornalistas, o primeiro-ministro procurou salientar as consequências em termos de cidadania resultantes da adoção deste acordo para facilitar a circulação de pessoas no espaço lusófono.
"A assinatura deste acordo de mobilidade vai proporcional de uma vez por todas as criar um verdadeiro pilar de cidadania no quadro da CPLP, permitindo facilitar a circulação entre todos os Estados-membros, o reconhecimento das formações académicas e a portabilidade dos direitos de Segurança Social. São matérias que têm a ver com o quotidiano das pessoas", acentuou o líder do executivo português.
António Costa referiu-se depois a problemas que existiram no passado entre países de expressão portuguesa, designadamente entre Portugal e o Brasil.
"Com este acordo, é não voltarmos a ter a crise dos dentistas brasileiros em Portugal [na década de 80 do século passado], ou, mais recentemente, dos engenheiros portugueses no Brasil", apontou.
Depois, António Costa moderou expectativas em termos mais imediatos, dizendo que em Luanda, esta tarde, será "assinado um acordo-quadro que ainda exige um desenvolvimento" e trabalho diplomático.
Nas declarações que proferiu aos jornalistas, o primeiro-ministro elogiou também as prioridades assumidas pela nova presidência angolana da CPLP, destacando o objetivo da "cooperação económica e empresarial".
"Esse é um pilar fundamental da CPLP", acentuou.
Interrogado se existe uma vontade política por parte de todos os Estados-membros no sentido de se avançar, o líder do executivo considerou que, "neste momento, há total sintonia", referindo, novamente, a este propósito, a questão da progressiva liberdade de circulação no espaço lusófono.
"Quanto lançámos esta ideia em 2016, havia alguns países que tinham oposição forte, mas, agora, encontrámos um quadro flexível. Porventura, não vamos andar todos ao mesmo tempo, mas acho que vai ser uma coisa contagiosa. Assim que o primeiro der o passo -- e Portugal dará seguramente o primeiro passo -- todos darão também, o que é fundamental para que a CPLP não seja só um espaço de concertação política, área em que temos obtido sucessos grandes", advogou.
Neste capítulo, António Costa referiu a título de exemplo a primeira eleição de António Guterres para o cargo de secretário-geral das Nações Unidas em 2017, "que beneficiou muito da existência da CPLP e da articulação pluricontinental que então foi alcançada entre os diferentes países".
"Depois, entendo que a cooperação económica e empresarial tem um enorme espaço para poder crescer -- e a necessidade que todos temos de recuperação na economia é muito importante. Tem também existido um esforço de solidariedade grande nesta fase de combate à pandemia da covid-19, quer em termos de apoio técnico ou de partilha de vacinas. Mas é fundamental que a CPLP faça parte do dia-a-dia da vida de todos nós, não só com novelas, música e literatura, mas também na capacidade de circularmos", acrescentou.
O Acordo de Mobilidade deverá ser aprovado hoje na XIII cimeira da organização lusófona. Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste são os nove Estados-membros da CPLP, que hoje celebra 25 anos.