Cavaco Silva: "É chegada a hora de proceder à revisão da lei eleitoral"
O ex-Presidente da República, Cavaco Silva, defendeu esta terça-feira "ter chegado a hora" de uma reforma eleitoral, criando-se um círculo nacional, com "os deputados eleitos segundo um sistema eleitoral proporcional mitigado".
"Penso que é chegada a hora de proceder à revisão da lei eleitoral, criando um círculo eleitoral nacional previsto na revisão constitucional e 1989", afirmou.
Cavaco Silva discursava num ciclo de conferências, organizado pela Câmara de Fafe, com os ex-chefes de Estado eleitos após o 25 de abril, com moderação do conselheiro de Estado Luís Marques Mendes, natural daquele concelho do distrito de Braga.
Para o ex-Presidente da República, "passados 48 anos do 25 de Abril, têm sido apontados [à democracia] alguns sintomas de deterioração da sua qualidade", como o "aumento da abstenção em sucessivos atos eleitorais, o desinteresse dos jovens pela atividade política e o afastamento crescente das elites profissionais em relação à vida político-partidária ativa". Sinalizou, por outro lado, que "a lei eleitoral para a Assembleia da República tem sido referida como responsável pelo afastamento dos deputados em relação aos eleitores, assim contribuindo para a deterioração da qualidade da nossa democracia".
Num discurso muito voltado para as questões económicas, Aníbal Cavaco Silva considerou, ainda, "importante proceder à reforma do processo legislativo orçamental, aproveitando o recente estudo da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO)". "A irracionalidade do processo em vigor", prosseguiu, "é bastante nociva para a eficácia das políticas governamentais e para a qualidade das finanças públicas".
De acordo com este estudo da UTAO, disse, "a Assembleia da República admitiu à discussão, na especialidade do Orçamento para 2021, 1.547 propostas de alteração apresentadas pelos partidos para serem discutidas num curtíssimo espaço de tempo".
O ex-Presidente concluiu: "Com tamanha irracionalidade, é praticamente impossível que a política orçamental seja adequada aos objetivos que lhe cabe prosseguir".
Cavaco Silva considerou que o poder local e a adesão à União Europeia marcaram positivamente os 48 anos da democracia, mas alertou para a "deterioração dos serviços públicos ocorrida nos anos mais recentes".
"O contributo do poder local para as condições de vida das populações constitui, sem dúvida, um dos maiores sucessos políticos da nossa democracia", disse, destacando também as autonomias dos Açores e Madeira como "uma das construções mais dinâmicas e frutuosas da democracia portuguesa".
Sobre a "adesão de Portugal às comunidades europeias", em janeiro de 1986, disse ter sido "um marco verdadeiramente histórico na vida do país".
"A política do Banco Central Europeu tem-se traduzido em benefícios de dimensão gigantesca para Portugal" e "o Programa Europeu de Recuperação Económica aprovado pela União Europeia na sequência da pandemia está a encaminhar para Portugal muitos milhares de milhões de euros", apontou.
Fazendo uma retrospetiva dos 48 anos pós 25 de Abril, sinalizou, também, os "progressos significativos do desenvolvimento social", nomeadamente com a criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Apesar disso, alertou, "nos anos mais recentes verificou-se uma deterioração dos serviços prestados aos utentes pelo SNS, fazendo emergir, com grande prioridade, a sua restruturação".
Também positivo, disse, foi o "avanço significativo no acesso à educação", que considerou "um fator crítico da efetiva igualdade de oportunidades e no combate à exclusão social".
"Apesar da brutal carga fiscal e da elevada despesa pública, a qualidade dos serviços públicos não é boa na educação, na justiça e na segurança", lamentou ainda.