“Canto da sereia”. Acordo do “náufrago” Albuquerque com Chega “incomoda” PSD
“Num braço de ferro há sempre um que ganha, um que perde.” E é esta incerteza, expressa pelo líder local do partido de André Ventura - a possibilidade de um acordo PSD/CDS/Chega, na Madeira - que começa, mais uma vez, a criar “incómodo” no PSD de Luís Montenegro.
A diferença é que nas regionais de 2023 - ainda Miguel Albuquerque não era arguido e nem Montenegro era primeiro-ministro - a deslocação em peso do “estado-maior” do PSD ao Funchal, asseguram fontes sociais-democratas ao DN, “conseguiu” travar o que “parecia certo” e que se “percebia” pela falta de “linhas vermelhas” do presidente e recandidato ao Governo Regional: uma coligação que até podia resultar na atribuição de secretarias regionais ao Chega - uma imposição de André Ventura.
Na altura, o receio estava ligado à proximidade das eleições europeias e o efeito de “contaminação” que daí poderia resultar e que seria, “naturalmente”, usada pela “esquerda toda”. A noite de 24 de setembro [das eleições regionais]permitiu a Luís Montenegro, pela primeira vez, que discursou primeiro que Albuquerque, ser inequívoco sobre a “extrema-direita” e declarar um “não é não” definitivo.
Agora, tudo mudou. Exceto a recusa do PSD nacional a “quaisquer acordos” com o Chega. O líder regional social-democrata é arguido, alegadamente por suspeitas de corrupção, prevaricação e abuso de poder; foi reeleito líder do PSD, após a demissão, por uma diferença de 392 votos; ganhou as eleições antecipadas de 2024 à justa, sem maioria, pela terceira vez, e com o pior resultado de sempre do PSD - 49 mil votos; e não conseguiu, facto inédito em 48 anos, que a Assembleia Regional aprovasse um programa do Governo.
A esta dificuldade “local”, aliada às criticas internas publicas - nomeadamente as de Alberto João Jardim, que pede a “saída de Albuquerque, e de Manuel António Correia, adversário nas eleições internas - junta-se o “incómodo” na direção nacional social-democrata e dos que agora ministros mantêm as mesmas linhas vermelhas de sempre.
José Manuel Fernandes, agora ministro da Agricultura, defende que “o PSD não deve fazer, seja onde for, não deve fazer nenhum tipo de acordo com o Chega”; Paulo Rangel, agora ministro dos Negócios Estrangeiros, diz que “acordos com o Chega são uma linha vermelha inultrapassável” e até adverte contra o que chama de “canto da sereia”; Luís Montenegro, agora primeiro-ministro, deixou claro que não pactuará “nem com políticas, nem com políticos racistas, nem xenófobos, nem oportunistas, nem populistas”; Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas, que chegou a manifestar uma “aproximação”, defende agora que o “chega se move por ódio”; e há também, entre outros, a oposição - de alianças à “extrema-direita” de Ventura - de Margarida Balseiro Lopes, ministra da Juventude, António Leitão Amaro, ministro da Presidência, Pedro Duarte, ministro dos Assuntos Parlamentares, Nuno Melo, ministro da Defesa e Hugo Soares, secretário-geral do PSD.
Miguel Albuquerque “devia ter saído” da liderança do partido e do Governo Regional “logo que foi constituído arguido”, defende fonte social-democrata. Assim, sustenta outra fonte, “está a afundar” o partido e “todos os que estão próximos”. “Um náufrago”, resume fonte parlamentar do PSD.
O “inédito” e “insustentável” é que desde 2019, lamenta fonte do PSD, só “somos lá Governo” por força de sucessivos acordos “ora com CDS, ora com CDS e PAN e agora muito previsivelmente com o Chega”.
Por agora, a certeza é a de que publicamente, no PSD nacional, ninguém assumirá a defesa de Miguel Albuquerque. “Há que esperar para ver no que isto dá”, explicam.
Se há um ano, o receio era o impacto nas eleições europeias do acordo regional PSD/Chega, agora a preocupação relaciona-se com as eleições autárquicas de 2025 - as mais importantes dos últimos 12 anos que vão obrigar à “mudança”, por limitação de mandatos, de mais de uma centena de presidentes de câmara: sete na Madeira.
Traduzindo: o “uso” que a esquerda “fará” de uma coligação do PSD [de Albuquerque] com a “extrema-direita” [de Ventura] numa altura “decisiva”.
Na Madeira, entre o PSD desagradado com a atual liderança, cresce a “quase certeza” de que o Chega deixará “passar” o programa do Governo para que depois “obrigue” Albuquerque a “ceder em tudo” - é que sem o voto favorável do partido de Ventura pouco ou nada poderá ser aprovado.