Há oito anos que CDU e PS empatam no número de vereadores eleitos para a Câmara Municipal de Loures - quatro cada -, ainda que, em 2017, a liderança do Executivo Municipal coubesse aos comunistas e, em 2021, por uma escassa diferença de pouco mais de 2000 votos (entre 81.786 eleitores que foram às urnas), passasse a estar a cargo dos socialistas, liderados por Ricardo Leão. Nesse ano, o atual incumbente chegou a um entendimento pós-eleitoral com o PSD para garantir uma maioria de vereadores - quatro do PS, de mãos dadas com os dois do PSD, contra quatro da CDU. Em 2013, o autarca criticara um exercício semelhante do seu antecessor comunista, Bernardino Soares, por ter entregado pelouros aos vereadores sociais-democratas. Por fim, o Chega, que em 2021 elegeu apenas um vereador, pensa agora mudar a geometria política no concelho, depois de umas eleições legislativas a 18 de maio que garantiram ao partido o segundo maior número de deputados na Assembleia da República. Além de tudo isto, Loures foi o concelho que permitiu a eclosão política de André Ventura, em 2017, como vereador do PSD.. Este ano, a meio de julho, Loures esteve na ribalta mediática na sequência de uma decisão do Executivo liderado por Ricardo Leão que acabaria por conduzir à demolição de 60 das 64 barracas que albergavam 161 pessoas no Bairro do Talude Militar.Em outubro de 2024, o mesmo Ricardo Leão tinha defendido despejos “sem dó, nem piedade” de habitações municipais para os participantes nos desacatos que ocorreram na Área Metropolitana de Lisboa na sequência da morte de Odair Moniz às mãos de um agente da PSP, no Bairro da Cova da Moura, na Amadora.“Acho que o PS em Loures fez isto [despejos no Talude Militar] para conseguir ir buscar votos que estavam a escapar-se para o Chega”, argumenta ao DN o atual vereador do PCP Gonçalo Caroço, que também é o candidato da CDU à Câmara de Loures.O vereador comunista garante que “isto é uma forma de alimentar o discurso da extrema-direita”, até porque, acrescenta, o PS está agora “a disputar aquele nicho” junto com PSD e Chega, e remata: “A cópia é muito melhor do que o original.”Questionado sobre se têm havido despejos no concelho por situações de incumprimento ou associadas a criminalidade, Gonçalo Caroço diz não os conhecer, indicando, porém, “que algumas pessoas que não têm a sua situação completamente esclarecida, em termos de agregado familiar, foram despejadas, mas que nada tem a ver com a falta de pagamento de rendas”.Perante esta situação, Gonçalo Caroço considera, porém, que a “forma como estão a fazer” estes despejos “é completamente indigna”, por deixarem os bens das pessoas espalhados na via pública.No entanto, o vereador comunista - que entre 2018 e 2021 teve os pelouros dos Recursos Humanos, Educação, Modernização Administrativa, Saúde, Habitação e Área Social - lembra que o PCP já fez despejos quando liderava a autarquia. “Mas pegávamos nas coisas das pessoas e eram arrumadas no armazém. Quando queriam, iam lá buscar”, justifica.Na atual gestão camarária, Gonçalo Caroço acusa o município de até ter despejado doentes oncológicos.“É evidente que existe aqui uma política de medo”, afirma, acrescentando que o Executivo de Ricardo Leão está a colocar um “peso em cima” das pessoas que usufruem de habitação municipal ou que, apesar de terem poucas possibilidades, conseguiram arranjar alternativas precárias, “como se a culpa de tudo isso fosse delas”.No entendimento do PCP, são estas pessoas, em situação de vulnerabilidade, “que mais precisam” de apoio.Com a defesa de “uma política que aposte na resposta pública da habitação”, o vereador comunista acusa o Executivo Municipal de ser “muito forte com os fracos, mas muito frouxo a resolver os problemas das pessoas”.Em relação à parceria do PS com o PSD, Gonçalo Caroço acusa-a de perseguir “estratégias de habitação com respostas privadas”, o que levou o Executivo a descartar a “estratégia local de habitação da CDU”.Por tudo isto, Gonçalo Caroço desdobra-se entre uma proposta e uma promessa. “A resposta pública da habitação tem de ser uma prioridade e, por isso, nós vamos criar pelo menos 559 fogos com rendas acessíveis, ou apoiadas, no próximo mandato”, assegura, enquanto lembra que, antes do mandato de Ricardo Leão, quando a CDU estava à frente da autarquia, não havia ainda Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que só surgiu em 2021.Foi nessa altura que a CDU desenhou uma “estratégia local de habitação que previa a construção de, pelo menos, 959 habitações e um investimento de 167 milhões de euros”, lembra o autarca comunista, sublinhando que, “até este momento, não há novas construções negociadas”, além de haver apenas um terço daquele valor aprovado.Confrontado com a possibilidade do fim da alternância do poder local entre PS e CDU em Loures, caso as autárquicas acabem por se revelar um espelho das legislativas passadas, com uma ascensão do Chega, Gonçalo Caroço sustenta que as pessoas “não precisam de um discurso vazio” e de verem o seu “descontentamento aproveitado, não para resolver uma situação, mas para manter, no essencial, o que está”.Por isso, promete Gonçalo Caroço, a CDU continuará a “ter soluções para os problemas da vida das pessoas”, porque “é isso que esvazia qualquer possibilidade desse discurso vazio, vindo do Chega ou de outro partido qualquer”.“Justiça social e defesa do território”Também é com a ideia de que “o populismo vive de problemas por resolver” que Ricardo Leão, em declarações ao DN, garante que num eventual próximo mandato estará pronto para “resolver problemas”, para responder ao “extremismo, seja de direita ou de esquerda”.Na sequência das demolições no Talude Militar, Ricardo Leão recebeu, através das redes sociais, mensagens de incentivo, que incluíam comentários sobre algumas pessoas que “querem viver em barracas” e que, nessa circunstância, deveriam ir “para o país delas” ou voltar “para as senzalas”. Este comentário terminou com: “Força Ricardo Leão.”A algumas dessas mensagens, Ricardo Leão respondeu com “um abraço”, o que fez insurgir até vozes socialistas contra a posição do autarca, como aconteceu com a deputada do PS Isabel Moreira que, nas suas redes sociais, deixou a seguinte elucubração: “Adivinho um bom resultado eleitoral para o verdadeiro infrator. Escolho ficar mais tempo em minoria. Isto não é PS. Tenho direito a ter opinião. Isto é um Chega infiltrado no PS.”Questionado pelo DN sobre como encara as críticas - algumas internas - que sugerem uma hipotética tentativa de esvaziar o Chega, Ricardo Leão afirma que “o PS é um partido plural, onde cabem opiniões diferentes, mas também é um partido com uma maioria, que reconhece e apoia o caminho” que tem seguido em Loures.Sem referir nomes, o presidente da Câmara de Loures diz que “o que se ouviu foram sobretudo vozes isoladas, sem conhecerem o contexto completo das decisões, e que, por isso, interpretaram de forma errada medidas que são, acima de tudo, de Justiça Social e de defesa do território”.Em concreto sobre o Talude, o autarca justifica que tudo se tratou “de uma ocupação ilegal, sem condições de salubridade ou segurança, com risco real para pessoas e bens”. Além disso, garante que “todas as pessoas foram previamente notificadas e acompanhadas pelos Serviços Sociais”.No que diz respeito a outros despejos, Ricardo Leão não os confirma, nem os desmente, mas alude a “rendas em incumprimento”, cujos processos, “com anos de tramitação, onde todas as oportunidades de regularização foram dadas”, acabam por retirar “habitação a quem cumpre e aguarda legitimamente por uma casa”.Por fim, o autarca argumenta que isto não é “esvaziar eleitorado” do Chega, “é garantir dignidade, regras e respeito pelo território e por quem cumpre”.No meio de tudo isto, Ricardo Leão promete que “a habitação continuará a ser uma prioridade absoluta”, motivo pelo qual a sua equipa está “a executar a Estratégia Local de Habitação, revista para incluir novas soluções - como aquisição com reabilitação e arrendamento para subarrendamento - e a elaborar a Carta Municipal de Habitação, articulada com o PDM [Plano Diretor Municipal] e outros instrumentos estratégicos”.Na génese da execução de muitos projetos, lembra o autarca, “o PRR foi fundamental”, no entanto “termina em 2026. É preciso garantir a continuidade do investimento com novas fontes de financiamento, assegurando a sustentabilidade da habitação pública e respostas para jovens e classe média”, explica.O retrato do concelho, segundo Ricardo Leão, é pintado com “desafios estruturais: forte pressão demográfica, escassez de oferta, subida das rendas e fenómenos de construção ilegal.”Para responder aos desafios que identifica, a Câmara de Loures promete uma expansão da “oferta de habitação acessível, através de construção, reabilitação e parcerias público-privadas”, além de “estimular o arrendamento acessível com incentivos e fiscalização contra especulação”.Na lista de soluções do autarca aparecem ainda o reforço da “fiscalização urbanística" e oferecer alternativas dignas a quem vive em condições ilegais, assim como a criação de “programas de apoio financeiro para jovens e famílias com rendas elevadas, já em funcionamento”.Tendo em conta a composição do Executivo Municipal, que assenta numa solução governativa entre PS e PSD, o DN perguntou ao autarca como vê uma eventual parceria semelhante no futuro, caso haja essa necessidade. Rejeitando “cálculos partidários”, Ricardo Leão assegura que a sua prioridade “é continuar a executar o trabalho” que já iniciou “e que já está a transformar o concelho. Como no desporto, prognósticos só depois do jogo - agora é altura de ouvir a população no dia 12 de outubro.”“Isto acontece tudo por causa da questão da imigração”Nelson Batista é o candidato do PSD à sucessão de Ricardo Leão e é, desde 2021, um dos dois vereadores sociais-democratas que têm trabalhado com o PS. Na verdade, ao DN, o autarca corrigiu esta ideia, especificando que não tem trabalhado “com o programa do PS”, mas “com o programa do PS e do PSD”, até porque, garante, de todas as propostas colocadas em cima da mesa, num “acordo do PSD, 80% delas foram concretizadas”.Nelson Batista diz que está a concorrer para ganhar, mas, caso isso não aconteça, terá “de dialogar com os outros partidos que estão” à sua volta, “no sentido de conseguir uma estabilidade política, para bem de Loures”.Contabilista de profissão, foi também presidente da Junta de Freguesia de Lousa, em 2009. O eleito pelo PSD, nessa altura, fez um acordo com a CDU para garantir a estabilidade na autarquia. E, chegado ao Executivo Camarário em 2021, usou a mesma estratégia, neste caso como força que ampara Ricardo Leão.Nelson Batista ficou com os pelouros do Ambiente, da Economia e da Inovação, mas sublinha que tem estado atento a tudo o que acontece no concelho, principalmente no que está relacionado com habitação. E não aceita barracas no concelho.Sobre o Talude Militar, defende que deveriam ter sido tomadas “medidas preventivas e fiscalização imediata. Porque, se a demolição tivesse acontecido mais cedo, se calhar a notícia que se propagou a nível nacional nunca teria acontecido.”E a fiscalização permanente para este tipo de situações é uma das garantias que traz para as autárquicas, caso seja eleito.Mas, por trás do problema, há outro, na origem, que identifica: “Isto acontece tudo por causa da questão da imigração. E foi as portas escancaradas a nível nacional.”Enquanto revela que é do “tempo em que só entravam em Portugal pessoas com contrato de trabalho e a saber para onde é que iam morar”, Nelson Batista também aponta o dedo ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que diz respeitar muito, apesar de o acusar de ser “responsável por isto também”.“Ele apelou a que venham para Portugal, que conseguem ter emprego. Nós queremos toda a gente em Portugal, desde que venham para trabalhar e que se consigam integrar na sociedade. E, sejamos claros, se nós não tivermos imigrantes, não teríamos mão de obra”, lembra.Ainda assim, Nelson Batista pede desculpa pela “frontalidade”, mas deixa uma mensagem: “Estas pessoas que entram em Portugal e vão fazer barracas, só têm uma solução: Vão para a terra deles.”E para as situações que não incluem incumprimento, Nelson Batista defende “fazer mais habitação”, até porque, admite, a falta de habitação social é “um problema a que não podemos virar as costas”. No entanto, a “grande preocupação” assumida pelo autarca “é a habitação para a classe média e a habitação para os jovens”, que já estão a seguir o seu curso, também por ação do PRR.Mas há outro problema que Nelson Batista diz já ter conversado com Ricardo Leão, referindo-se a situações de incumprimento, que atribui à CDU: “Não podemos pactuar com uma dívida de 14 milhões de euros de rendas da habitação.”Portanto, o autarca do PSD diz que as pessoas, “se não pagam, têm de sair”.Sem “pressão” no berço político de André VenturaBruno Nunes, deputado do Chega desde 2022, é o candidato pelo partido à Câmara de Loures. Aos 48 anos, traz consigo um currículo autárquico que inclui uma candidatura, aos 21 anos, à Freguesia de Odivelas, quando ainda não era concelho. Passou pelo CDS, tendo presidido à estrutura do partido em Odivelas, mas saiu, na sequência da saída de Manuel Monteiro.Em 2017, entre uma hesitação em juntar-se à coligação do PSD com o PPM, que na altura integrava o CDS, Bruno Nunes acabou por ser candidato a Loures por esta estrutura, depois de o seu antigo partido a ter abandonado. E foi aí que conheceu um jovem vereador social-democrata que, dois anos mais tarde, viria a ser deputado único do partido a que hoje pertence: André Ventura.Questionado pelo DN sobre se sente pressão por ser o candidato ao concelho que viu o líder do Chega nascer politicamente, Bruno Nunes diz que não.“Há muita gente, aqui, que já faz política há muitos anos. E, portanto, não sinto pressão. Primeiro, porque conheço bem o município e sei o trabalho que estamos a fazer. Sinto alguma ansiedade pela noite eleitoral, porque acredito que desta vez é diferente”, desabafa, vaticinando que o Chega vai ganhar.Apesar da certeza que transporta, Bruno Nunes diz que “não há uma transferência de voto direta das legislativas para as autárquicas”, no entanto, observa que “a conjuntura política” está agora “muito mais mediatizada do que há quatro anos. Hoje em dia, os políticos que estejam fora do Governo são muito mais mediatizados. As nossas redes sociais têm muita influência nisso”, destaca.Depois de toda esta análise, Bruno Nunes acaba por admitir que, afinal, não acredita “que quem votou Chega nas legislativas mude o sentido de voto nas autárquicas”.Sobre as demolições no Talude Militar, o vereador eleito pelo Chega considera que aconteceram sob “uma lógica eleitoralista”, até porque “o Talude não nasceu hoje. Há pessoas que vivem ali há dezenas de anos, sendo que nos últimos meses cresceu muito mais”. Além disto, “reconhece que há problemas estruturais no concelho que não se conseguem resolver com varinha mágica num dia”, como a habitação.Rejeitando a ideia de despejo e apostando na de demolição, Bruno Nunes critica Ricardo Leão por não ter acionado todas as autoridades durante o processo, como a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), até porque, diz, “aquelas crianças tiveram de assistir à demolição da barraca”. Face a isto, o vereador do Chega acusa Ricardo Leão de “populismo”, por ter entrado “ali com a lógica de direitos iguais, deveres iguais, sem que ele próprio o cumpra”.Em relação ao outro adversário que identifica dentro do “bipartidarismo” - a CDU -, Bruno Nunes diz que esta coligação inclui Gonçalo Caroço, que acusa de ser alguém “sem credibilidade no concelho”, apesar de ser “um bom homem”.“Deixou a habitação com 18 milhões de dívidas [um valor diferente dos 14 milhões apontados por Nelson Batista], além de ter gastado “aproximadamente três milhões de euros em investimentos na Quinta da Fonte - um milhão e 800 mil vindos de fundos europeus e o restante através da Câmara -, para recuperação das fachadas do prédio e das portas de entrada e das caixas do correio”. Esta operação, que Bruno Nunes classifica como puramente cosmética, torna o município um “mau senhorio”, garante.Além destas três forças políticas, nestas autárquicas concorre a Loures uma coligação de esquerda, composta por Livre, BE e PAN, o que, em conjugação com tudo o resto, pode conduzir a alterações na geometria política do concelho..Autárquicas. PS faz queixa de ministro Pedro Duarte por “uso do aparelho de Estado” para campanha .Autárquicas. Entre renovação e continuidade, PS já tem 90% dos nomes fechados.Governo diz ter conhecimento de "rede criminosa" que comercializa habitações precárias em Loures