Militares em regime de contrato vão ter acesso a casas com rendas económicas
Gerardo Santos

Militares em regime de contrato vão ter acesso a casas com rendas económicas

O ministro da Defesa acredita que “Portugal é um país de soldados” e que é a “pensar na paz” que se investe nas Forças Armadas. “Nenhum ser humano lúcido deseja guerra”, afirmou no podcast Soberania.
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Os militares em regime de contrato vão ter acesso aos arrendamentos económicos das habitações do Instituto de Ação Social das Forças Armadas (IASFA), até aqui apenas permitidos para os militares dos quadros permanentes nas situações de ativo, reserva e reforma e o pessoal militarizado.

O IASFA tem perto de 1800 casas, das quais perto de 500 devolutas, carenciadas de obras. Os militares em regime de contrato são perto de 5000 nos três ramos (num total de 23 mil). Os atuais beneficiários com direito a estes arrendamentos acessíveis são apenas os que vivem a mais de 30 km da sua residência, não estando ainda definido como será para os contratados.

A medida foi anunciada pelo ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, no podcast Soberania - com Francisco Rodrigues, presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), e João Annes, do Observatório de Segurança e Defesa da SEDES, entidades parceiras deste programa - como exemplo de incentivos que têm vindo e estão a ser criados para atrair e reter mais jovens nas Forças Armadas.

O Ministro da Defesa, Valentina Marcelino, Francisco Rodrigues e João Annes
O Ministro da Defesa, Valentina Marcelino, Francisco Rodrigues e João AnnesGerardo Santos

Uma conversa que serviu também como antevisão do que podem vir a ser os focos dos debates da Grande Conferência do DN - “Defesa Nacional - Nova Ordem Mundial. Onde estamos, o que temos e do que precisamos” - que decorre nesta terça-feira na Academia Militar e cuja abertura será protagonizada pelo titular da pasta da Defesa, entre outros oradores, como Durão Barroso, antigo primeiro-ministro e presidente da Comissão Europeia entre 2004 e 2014, ou os quatro Chefes de Estado-Maior.

A iniciativa para os militares contratados, junta-se a outras lembradas por Nuno Melo, tais como o aumento de vários suplementos específicos, em particular do suplemento da condição militar, equiparado, pela primeira vez, ao das forças de segurança, que o ministro vê como contributo para que “ao fim de oito anos, com os números sempre a cair, se ter conseguir inverter (aumentando) os recrutamentos”.

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Melo entende que isso demonstrou “uma relação de causa e efeito: projetamos um resultado e se o resultado se verifica, dizemos que vale a pena”.

Argumenta que “o desalento era muito grande há um ano atrás” e que agora “mesmo neste contexto difícil de imprevisibilidade à escala global, temos mais jovens a querer vir para as Forças Armadas” facto que considera “extraordinário e muito determinante”.

“Lucidez para encarar o destino coletivo”

Em 51 anos de Democracia, a Defesa está pela primeira vez como um dos pontos centrais dos debates da pré-campanha para as eleições legislativas de maio e Nuno Melo vê esta novidade como um sinal, de que quando “está em causa a defesa da liberdade, da democracia e do nosso modo de vida, a Defesa Nacional tem de estar na primeira linha da política”.

Se o tema traz ou não votos, não é relevante. “Mais do que os votos, que a prioridade da Defesa Nacional possa trazer lucidez na forma como encaramos o nosso destino coletivo”, sublinhou.

Se o tema traz ou não votos, não é relevante. “Mais do que os votos, que a prioridade da Defesa Nacional possa trazer lucidez na forma como encaramos o nosso destino coletivo”, sublinhou.

João Annes, Francisco Rodrigues, o Ministro Nuno Melo e Valentina Marcelino
João Annes, Francisco Rodrigues, o Ministro Nuno Melo e Valentina MarcelinoGerardo Santos

O ministro acredita que sendo “Portugal uma terra de soldados”, as Forças Armadas “têm muita importância, principalmente em tempos de paz”. Porém, “se por alguma razão, um dia, os jovens forem chamados a combater, também é bom que tenham os equipamentos que lhes permitam sobreviver o melhor possível no campo de batalha e daí a importância também do reequipamento das Forças Armadas”, frisa.

Nuno Melo trouxe gráficos para responder às críticas de quem vê o investimento na Defesa como uma escolha que vai retirar verbas em setores sociais, saúde ou educação.

“O debate público acaba por ser muito intoxicado com a ideia de que para se investir na Defesa tem que se ir buscar às outras áreas. Se bem repararem, a Defesa representa neste momento 3,1 mil milhões € de orçamento, mas a Segurança Social representa 27,3 mil milhões. A Defesa Nacional está cá no fundo”

Nuno Melo. ministro da Defesa

“O debate público acaba por ser muito intoxicado com a ideia de que para se investir na Defesa tem que se ir buscar às outras áreas. Se bem repararem, a Defesa representa neste momento 3,1 mil milhões € de orçamento, mas a Segurança Social representa 27,3 mil milhões. A Defesa Nacional está cá no fundo”, apontou.

A diferença manter-se-á substancial mesmo quando for atingida a meta dos 2% do PIB (presentemente 1,5%), previstos para 2029, que o primeiro-ministro, no início deste mês, manifestou interesse em antecipar, sem indicar datas, mas que, depois de o Conselho de Finanças Públicas alertar para um possível impacto negativo no défice, não foi de novo mencionado. “Não há nenhuma data certa para essa antecipação”, confirmou o ministro.

O também presidente do CDS-PP destaca que quando fala “de uma base tecnológica e industrial de Defesa” está em causa o que “potencialmente é de duplo uso, mas pode ter uma grande importância para a componente militar”.

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“Queremos modernizar as Forças Armadas com recurso, sempre que possível, à indústria nacional ou quando tivermos que adquirir fora bens ou equipamentos, assegurar que há também um retorno para a indústria nacional no ciclo de vida desses equipamentos, seja na produção de peças ou componentes, seja através da manutenção, seja através daquilo em que as nossas empresas possam ser chamadas a ter um papel”.

"Quando investimos nas Forças Armadas estamos a pensar na paz, não estamos a pensar na guerra. Estamos a pensar, obviamente, na capacidade de dissuasão e defesa. Mas temos em conta que hoje em dia a maior parte dos equipamentos que compramos são de duplo uso e são utilizados em missões que fazem a diferença na vida de todos”.

Nuno Melo. ministro da Defesa

Quando investimos nas Forças Armadas, sublinha ainda, “estamos a pensar na paz, não estamos a pensar na guerra. Estamos a pensar, obviamente, na capacidade de dissuasão e defesa. Mas temos em conta que hoje em dia a maior parte dos equipamentos que compramos são de duplo uso e são utilizados em missões que fazem a diferença na vida de todos”.

Contratações seguras e transparentes

Melo está convencido de que “os portugueses começam também a perceber, e isso importa em termos de mensagem, que o dinheiro que entra na Defesa Nacional é investimento, terá sempre uma boa aplicação com muito critério, com retorno para os portugueses e retorno para a economia”.

Sobre a anunciada “via verde” para a contratação pública no setor da Defesa, através da qual se pretende tornar mais célere a aquisição de equipamentos, em resposta a João Annes, da SEDES, que o questionou sobre a garantia de equilíbrio entre essa eficácia e a exigida transparência na prevenção da corrupção, Nuno Melo asseverou que “a primeira preocupação tem de ser a de garantir que a contratação é segura, transparente e sindicalizável, mas, simultaneamente, desburocratizar e simplificando procedimentos”.

Segundo o ministro, “Portugal, quando transpõe as diretivas, é sempre pela via mais restritiva, coisa que os espanhóis, normalmente, não fazem”.

No final dos concursos, sublinha “o preço é o único critério e, em grande parte das vezes, as empresas que vencem são até de destinos que nós temos razoavelmente como adversários. Aquilo que queremos assegurar é que a base tecnológica industrial da Defesa Nacional tem oportunidades na contratação pública”.

Ainda no campo da prevenção da corrupção numa área de alto risco como é a Defesa, foi recordado o facto de Nuno Melo ter tomado posse ainda no rescaldo da operação “Tempestade Perfeita”, em que foram acusadas 73 empresas e pessoas, entre as quais altos quadros do ministério, sendo questionado sobre medidas tomadas.

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“A primeira coisa que fiz foi exigir no Ministério da Defesa Nacional (MDN) o cumprimento da lei, porque não estava a ser cumprida. Desde logo com o licenciamento de empresas que se dedicam ao comércio e indústria de bens de natureza militar. A lei obriga a um duplo controlo, um através do MDN, no que tem que ver com o controlo societário, saber quem são os sócios, se são idóneos; outro do Gabinete Nacional de Segurança. O que se verificou foi que só estava a haver um controlo no GNS".

Foi pedido à Inspeção-Geral de Defesa Nacional uma averiguação de todos os licenciamentos concedidos a partir de 2015, data a partir da qual “a lei deixou de ser cumprida”. O ministro ainda aguarda “o resultado dos relatórios”.

Forças convencionais ou especiais?

Francisco Rodrigues quis saber “no quadro atual de ameaças, cada vez mais assimétricas, a intenção era apostar nas forças ditas convencionais, ou em forças especiais do tipo subversivas”. Melo foi rápido a responder: “Ambas, de acordo com o que são os compromissos. Tínhamos o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, que já tem em vista as novas realidades, pronto a entrar no Parlamento, mas o governo caiu”.

O governante salientou um investimento em particular que considera “absolutamente crucial”: as missões das Forças Nacionais Destacadas (FND).

"Não há país onde esteja uma Força Nacional Destacada que não elogie os militares portugueses e que não peçam o seu reforço”

Nuno Melo. ministro da Defesa

“São realmente um dos mais importantes e eficazes instrumentos também de política externa portuguesa. Cada vez mais solicitadas, sempre em contexto de defesa da democracia e da paz. Não há país onde esteja uma FND que não elogie os militares portugueses e que não peçam o seu reforço”, afiança.

E porque as guerras não se combatem apenas com Forças Armadas bem equipadas, mas combatem-se, sobretudo, com vontade”, João Annes quis saber “se não podemos ir um bocadinho mais longe a promover o orgulho da população nas Forças Armadas” e “como se mobiliza o país para os novos desafios”.

Ao que Nuno Melo elencou: “a começar, estamos a mobilizar melhor quando conseguimos inverter os números de recrutamento, o que significa que há mais jovens hoje do que antes com vontade de cumprirem nas Forças Armadas um sonho de vida”.

Motivar para a paz

Depois, acredita que “a chamada literacia em contexto militar não se pode resumir a um dia ou dois dias de Defesa Nacional, deve começar muito mais cedo nos bancos da escola como uma coisa positiva”.

“Nenhum ser humano lúcido deseja ou está preparado para a guerra. E aqueles que têm uma visão romântica da guerra, desenganem-se rapidamente. Basta recorrerem à memória da história”.

Nuno Melo, ministro da Defesa

E como se motivam jovens para combater numa guerra? “Nenhum ser humano lúcido deseja ou está preparado para a guerra. E aqueles que têm uma visão romântica da guerra, desenganem-se rapidamente. Basta recorrerem à memória da história”.

O ministro pensa que “a motivação dos jovens tem de ser tudo aquilo que as Forças Armadas fazem que não a guerra”.

Lembra que “Forças Armadas operacionalmente fortes, diz a doutrina militar, levam à paz uma vez que os adversários não veem vantagem em fazer a guerra. Mas durante todo esse tempo de paz estão empenhadas em missões ajudando a mudar a vida das pessoas, salvando vidas e salvaguardando do território em múltiplas missões".

Acrescenta que todos os dias as Forças Armadas estão empenhadas em ações de busca e salvamento, em ações de emergência médica, no combate à criminalidade - ainda há dias testemunhamos um sucesso extraordinário de seis toneladas e meia de droga que foram apreendidas, que foi apreendida numa colaboração da Marinha e da Força Aérea com uma operação coordenada pela Polícia Judiciária”.

E conclui: “a opção dos jovens é tão transversal no empenho das Forças Armadas nestas missões que são de paz, que o racional dos jovens deve ser nesse sentido, dessa participação, sendo a guerra a absoluta excecionalidade que ninguém deseja agora”.’

Militares em regime de contrato vão ter acesso a casas com rendas económicas
Nuno Melo: "Quando investimos nas Forças Armadas, estamos a pensar na paz, na capacidade de dissuasão"

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