Ventura criticou cardeal patriarca e acabou por ser mesmo recebido

A audiência chegou a estar marcada para sexta-feira, dia 21. O cardeal cancelou-a - o que levou Ventura a acusá-lo de se deixar "intimidar pelo poder instalado".
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"Custa ver que o sistema está corrompido e a usar todas as armas baixas contra o CHEGA. Mas a mim, pessoalmente, custa-me ainda mais ver a Igreja, que também é a minha Igreja, deixar-se condicionar e intimidar pelo poder instalado. Não foi isso que Cristo nos ensinou."

Foi isto que André Ventura escreveu no Facebook, dia 23, ao partilhar uma notícia do semanário Sol dando conta que o cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, lhe desmarcara uma audiência marcada para dia 21. A notícia foi ilustrada com uma foto do líder e deputado único do Chega rezando numa igreja.

Na nota que escreveu, André Ventura não referiu explicitamente o patriarca mas o seu teor e a notícia que partilhou foi mais do que suficiente para os seus apoiantes perceberem que D. Manuel Clemente era o visado pelo deputado quando este falou numa Igreja que se deixa "condicionar e intimidar pelo poder instalado" de um "sistema que está corrompido".

"Muito bem André, dos fracos não reza a história. Também me chocou bastante esta atitude do Senhor Cardeal Patriarca. Entristeceu-me porque sei que você também ficou triste", escreveu um desses apoiantes. "É inaceitável a postura do sr. Cardeal", acrescentou outro. "É de facto lamentável. Mas atenção porque há elementos do clero que são dos nossos: são pessoas que estão informadas e alerta para o que o marxismo cultural e o politicamente correto estão a fazer à sociedade", disse ainda um terceiro. Só um se atreveu a justificar a desmarcação da audiência pelo patriarca: "Foi devido ao falecimento do Sr. Dom Ilídio, bispo [emérito] de Viseu."

Apesar de todas as críticas, e da forma como Ventura explorou politicamente o facto, colocando-o ao serviço de um "sistema que está corrompido", D. Manuel Clemente pareceu reagir dando a outra face, como recomendam os evangelhos ("Ao que te bate numa face, oferece-lhe também a outra; e ao que te tira a capa, não lhe negues a túnica.")

O cardeal patriarca decidiu mesmo receber André Ventura, no seu gabinete no convento de S. Vicente de Fora, em Lisboa, sede do patriarcado. A audiência começou hoje às 14.00 - e a notícia da sua realização foi avançada numa nota à imprensa divulgada pelo Chega.

Falando ao DN, uma fonte do patriarcado confirmou o encontro. E reafirmou o que já tinha dito ao Sol para justificar a desmarcação da audiência marcada para dia 21: "A audiência foi adiada exclusivamente por motivos de agenda do senhor Cardeal-Patriarca. Em nada esteve relacionado com o motivo que refere."

O tal "motivo que refere" era político e foi criado por Ventura, em declarações ao Sol: haveria uma relação de causa-efeito entre a desmarcação da audiência e as suas controversas considerações sobre o "caso Marega" ("País de hipocrisia em que tudo é racismo e tudo merece imediatamente uma chuva de lamentos e de análises histórico - megalómanas. O nosso problema não é o racismo. É a hipocrisia. É o síndrome Joacine que começa a invadir as mentalidades. Por mim não passarão").

Falando ainda ao semanário, o deputado disse que a desmarcação da audiência foi "um dos episódios mais tristes" da sua vida política. "Escrevi [...] uma carta ao Patriarca onde expresso a minha desilusão pelo facto de a Igreja ter cedido ao politicamente correto e aos poderes instituídos", disse ainda - mais uma vez politizando a decisão de Manuel Clemente, justificada pelo Patriarcado como resultado de simples motivos de agenda.

A audiência ocorre na véspera do agendamento para o plenário parlamentar - que não foi autorizado pelo presidente da AR mas pode ser objeto de recurso - de um projeto do Chega que aumenta as penas para os crimes de abuso sexual de menores instituindo a castração química provisória dos condenados, nalgumas circunstâncias.

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