Rio fiel às suas bandeiras com os opositores à espreita

Rui Rio saiu de Viana do Castelo, do 38.º Congresso do PSD, com a maioria no Conselho Nacional, uma direção ligeiramente renovada e as mesmas estratégias e bandeiras políticas. Os críticos, em particular Luís Montenegro, ficam à espreita.

O 38.º congresso do PSD, que terminou neste domingo, acabou na essência por não ser muito diferente do que consagrou pela primeira vez Rui Rio como líder do PSD, em fevereiro de 2018.

O presidente do partido manteve-se fiel, sem desvios, à sua estratégia política e levantou as bandeiras de sempre: reformas da economia, do sistema político e, em particular, da justiça. O ataque aos agentes judiciais foi mesmo o mais feroz, mais do que ao governo de António Costa. Encostou o PS à esquerda radical mas pediu pactos. E deixou recado ao CDS de Francisco Rodrigues dos Santos, presente na sala. Os seus opositores, sobretudo Luís Montenegro, procuraram sair de Viana do Castelo com espaço de manobra para tudo o que possa vir a correr mal ao líder.

O discurso de mais de 30 minutos tinha lá tudo o que tem defendido ao longo dos primeiros anos de mandato. Rui Rio virou-se para o país e voltou a garantir que o PSD, que já fixou ao centro, estará disponível para o "diálogo" com os outros partidos sempre que esteja em causa o interesse nacional. Os apelos para que se demarque do governo - a quem acusou de estar encostado à esquerda radical e de tornar os "pobres ainda mais pobres" - não o demovem.

E como tinha ali mesmo à beira, termo caro no Minho, o novo líder do CDS, Francisco Rodrigues dos Santos, não deixou de lhe dar um recado. "Se estamos todos pelo bem de Portugal, então saibamos, sempre que possível, unir esforços em prol de Portugal." Não sem reconhecer que "do ponto de vista eleitoral é imperioso evidenciar as nossas diferenças".

As críticas ao governo socialista voltaram a recair sobre uma economia falhada, na degradação dos serviços públicos, em particular na saúde e na educação. "Adiar reformas, varrer os problemas para debaixo do tapete e fazer o discurso de que está tudo bem, como é timbre da atual governação, não é uma postura responsável da atual governação." O espelho, disse repetidamente, do falhanço de uma política económica assente no consumo e não na produção.

"Adiar reformas, varrer os problemas para debaixo do tapete e fazer o discurso de que está tudo bem, como é timbre da atual governação, não é uma postura responsável da atual governação."

Quis, enquanto líder da oposição, comprometer-se com quatro áreas "estruturais", que considera essenciais para o futuro. Rio começou pelo problema do "aquecimento global", que tem de ser "abordado sem fanatismos histéricos", e assegurou que tudo fará para que Portugal atinja rapidamente a neutralidade carbónica, embora sem especificar as propostas que tem para a atingir.

Para responder ao problema demográfico, o líder do PSD defendeu políticas estáveis e recuperou as propostas do seu partido de incentivo à natalidade, entre as quais medidas de forte apoio ao nascimento de segundos e terceiros filhos.

Pediu também um pacto político para o interior, depois de criticar a "excessiva concentração de serviços públicos e privados, sobretudo em Lisboa, numa lógica que "tem sido mortífera para o país". Um pacto para fazer a "descentralização" e a "descontração". E pediu ainda entendimento para a sustentabilidade da Segurança Social.

Rui Rio trouxe ainda as velhas bandeiras da reforma do sistema político - a redução do número de deputados, o método de eleição destes e dos autarcas para ultrapassa a degradação do sistema. Mas foi para a justiça que voltou a virar as baterias. "Se a classe política está desprestigiada, os agentes judiciais não o estão menos, o que é muito negativo para o próprio regime democrático."

"Se a classe política está desprestigiada, os agentes judiciais não o estão menos, o que é muito negativo para o próprio regime democrático."

Lembrou os atrasos nos processos, a "opacidade do sistema", o "corporativismo", a "devassa dos processos judiciais" e a "arrogância de muitos agentes, que foram destruindo, ano após ano, a confiança dos portugueses". Mais dois pactos que quer com os outros partidos e dos quais não pode dispensar o PS.

Conselho Nacional ganho, direção com menos votação desde 2007

O discurso de Rio foi ovacionado meia dúzia de vezes pelos delegados, sem grandes picos de entusiasmo. O que se refletiu em parte na votação da lista da Comissão Política Nacional e que foi a mais baixa de sempre desde 2007, com 62,4%. E que é de continuidade, com apenas dois novos vice-presidentes, o deputado André Coelho Lima, que já era vogal da Comissão Política, e a deputada e ex-autarca de Rio Maior, Isaura Morais.

Mas Rio saiu com uma maioria no Conselho Nacional, o "parlamento" do PSD, ao ter conseguido que a sua lista, encabeçada por Paulo Rangel, elegesse 21 conselheiros, somados aos de Carlos Reis e de José Miguel Ferreira, ambos seus apoiantes, que elegeram respetivamente nove e sete conselheiros. O que perfaz 37 mandatos, contra 16 de Paulo Cunha, apoiante de Montenegro, e de nove de Bruno Vitorino, afeto a Miguel Pinto Luz.

Os opositores, em particular Montenegro - que prometeu não se calar e até se reuniu com os seus apoiantes num almoço onde "não discutiram futebol" -, conseguiram, no entanto, marcar território naquele órgão máximo entre congressos. Um território em que podem sempre pedir contas ao líder caso os resultados eleitorais não sejam famosos nas regionais dos Açores e nas autárquicas de 2021.

Rui Rio sofreu uma "pequena" derrota na lista oficial ao Conselho de Jurisdição Nacional (CJN) para a qual tinha escolhido o ex-líder parlamentar Fernando Negrão. Foi ultrapassado pela de Paulo Colaço, que conseguiu eleger cinco dos nove membros, a da direção três e José Miguel Bettencourt, que também pertenceu ao CJN no último mandato, elegeu-se apenas a si próprio.

O congresso pareceu querer premiar a rebeldia de Paulo Colaço, antigo membro do CJN, que esteve oito mandatos como dirigente daquele órgão mas que se demitiu no último mandato por discordar da postura do presidente da Mesa, Paulo Mota Pinto, quando este se recusou a ouvir a jurisdição no caso do voto secreto/voto de braço do ar que marcou o Conselho Nacional da tentativa de remover Rui Rio da liderança, no início do passado.

Talvez em jeito de recado interno, mas muito soft, Rio terminou a sua despedida do congresso assim; "Quem está na política para receber sairá sem honra nem glória."

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