PS quer privilegiar residência alternada dos filhos de pais separados
Socialistas vão avançar com um projeto de lei que inscreve a residência alternada no Código Civil, de forma expressa e como regime preferencial
O PS vai avançar com um projeto de lei que pretende estabelecer a residência alternada dos filhos de pais separados como o regime a privilegiar pelos juízes. Ou seja, esta deve ser a primeira solução a ser considerada, sem prejuízo de os tribunais poderem determinar outro desfecho em função das circunstâncias de cada caso.
O anúncio foi feito esta quinta-feira, no final da reunião semanal do grupo parlamentar socialista, pelo vice-presidente da bancada Fernando Rocha Andrade, que foi também o relator de uma petição entregue na Assembleia da República, com 4169 assinaturas, que defende a alteração da lei com vista a "estabelecer a presunção jurídica da residência alternada para crianças de pais e mães separados ou divorciados".
"Aquilo que se pretende com esta iniciativa legislativa é que a lei passe a fazer uma menção expressa à possibilidade de fixação de residência alternada e que esse deve ser o regime privilegiado pelo juiz quando não existam outras circunstâncias no caso que o desaconselhem. Não pretende, de todo, que o juiz deixe de ter a plena liberdade de tomar a melhor decisão no interesse da criança, que tem de ser prevalente", disse hoje Rocha Andrade, citado pela agência Lusa.
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De acordo com o dirigente socialista, a intenção passa por "reforçar a jurisprudência" face a uma solução jurídica que já existe e é aplicada nos tribunais, até de forma "mais frequente do que no passado" e "não revolucionar a forma como estas coisas se processam". A decisão caberá sempre ao magistrado responsável por cada processo.
A iniciativa agora anunciada pelo PS vai no mesmo sentido de um parecer enviado ao Parlamento pela Procuradoria-Geral da República. Nesse documento, a PGR defende que residência alternada de filhos de pais separados deve ficar expressamente prevista na lei portuguesa, e propõe mesmo que o Código Civil passe a incluir uma nova alínea, estabelecendo que "o tribunal privilegiará a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de acordo e sempre que, ponderadas todas as circunstâncias relevantes atendíveis, tal corresponda ao superior interesse daquele".
Uma formulação que vem na "linha da recomendação" do Conselho da Europa (ponto 5 da Resolução 2079), que solicita aos Estados-membros que assumam o princípio da residência alternada no seu ordenamento jurídico, limitando as exceções a "casos de negligência, abuso ou violência doméstica", sublinha a PGR.
A petição em defesa da residência alternada foi promovida pela Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Defesa dos Direitos dos Filhos e provocou, de imediato, polémica. Vinte e sete associações subscreveram uma carta aberta, dirigida a todos os grupos parlamentares, defendendo que o Parlamento não deve impor a residência alternada como regra, devendo as famílias ter liberdade de escolha. A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, Associação de Mulheres Contra a Violência ou a Capazes, foram algumas das entidades que se manifestaram contra.
O que é a residência alternada?
O regime de residência alternada prevê que os filhos vivam com os dois pais, habitualmente passando uma semana em casa de um, outra em casa de outro. Os períodos em cada uma das casas não têm que ser estritamente proporcionais - podem ir de 33% a 50% do tempo. Um dos grandes argumentos a favor desta solução é que permite que as crianças ou jovens mantenham a vivência com ambos os progenitores - e vários estudos já apontaram que isto é benéfico para os filhos. Em sentido contrário, é apontada a instabilidade na vida das crianças, bem como a dificuldade de implementação deste regime num cenário de conflitualidade entre os pais.
Como é sublinhado no parecer da PGR, o Código Civil português não faz referência expressa à residência alternada. A lei determina que "as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores", mas é menos clara quanto à residência da criança. "O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro", refere o Código Civil. Toda a formulação da lei aponta para um cenário de habitação com um dos progenitores: "O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente".