Ruben de Carvalho. Morreu um combatente pela "liberdade e democracia"
Morreu Ruben de Carvalho, dirigente histórico do PCP e organizador da Festa do Avante! desde a primeira edição, em 1976. Membro do Comité Central do PCP, foi deputado à Assembleia da República e vereador na Câmara Municipal de Lisboa. Durante o Estado Novo foi preso pela PIDE - era já o único membro do comité central comunista que esteve preso durante a ditadura.
Um "intelectual comunista", um "homem de combate e de confronto de ideias" que "lutou pela liberdade e pela democracia" - foram estas as palavras que Jerónimo de Sousa dedicou a Ruben de Carvalho. Numa declaração no Parlamento, o secretário-geral comunista, visivelmente emocionado, destacou o "percurso de luta, de participação e intervenção", política e cívica, e a luta antifascista que o levou sucessivas vezes à prisão, a última das quais em abril de 1974.
O líder comunista sublinhou igualmente a "contribuição importantíssima" de Ruben de Carvalho para a cultura portuguesa, com uma obra que se estende da música popular à erudita.
Também o Presidente da República, que está em visita a Cabo Verde, reagiu à morte de Ruben de Carvalho destacando o "jornalista e homem de cultura, defensor da liberdade desde jovem, deputado à Assembleia da República, vereador da Câmara Municipal de Lisboa" que "deixa um rasto de saudade em todos quantos tiveram o privilégio de partilhar a sua afabilidade de trato e reconhecer o seu empenhamento profundo na defesa das causas em que acreditava".
Já o primeiro-ministro, António Costa, escreveu no Twitter que Ruben de Carvalho "adorava a vida e se teve tempo de uma última despedida, deve ter dito para si 'foi bonita a Festa, pá!'. Falando num "homem de cultura e inteligência política invulgares, sentido de humor e extraordinária exigência de caráter", Costa escreve que o histórico comunista "seduzia adversários, com a capacidade de construir e honrar os compromissos que Lisboa exigia". "Ruben de Carvalho era, antes do mais, um amigo, numa amizade que construímos nos seis anos de intenso convívio na Câmara Municipal de Lisboa. As vicissitudes da política nunca nos permitiram trabalhar tão estreitamente quanto eu teria - teríamos - gostado e seguramente a cidade muito teria beneficiado", diz o primeiro-ministro.
De acordo com uma nota do secretariado do Comité Central do PCP, na manhã desta terça-feira, o histórico militante comunista, que tinha 74 anos, faleceu "em consequência de problemas de saúde que exigiram internamento hospitalar".
"Intelectual comunista, assumiu uma intervenção destacada na atividade do Partido, tendo desempenhado importantes tarefas, cargos e responsabilidades. Teve uma vida de intervenção e de luta na resistência antifascista, no movimento associativo estudantil, abraçou com intensidade a Revolução de Abril e defendeu os seus valores e conquistas. Destacou-se no jornalismo, na imprensa e na rádio. Deixou à sociedade portuguesa um contributo de grande relevo no conhecimento da música, na sua dimensão artística, cultural e social, no plano nacional e internacional, das suas raízes populares à sua dimensão erudita", refere o PCP, na mesma nota.
Nascido em Lisboa, a 21 de julho de 1944, Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva cedo se destacou na intervenção contra o Estado Novo. Aluno do Liceu Camões, em 1960 integrou a Direção da Comissão Pró-Associação dos Estudantes do Ensino Liceal e da Comissão Nacional do Dia do Estudante e, já no ensino superior, como estudante do curso de História da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, viria a participar na luta académica de 1962.
Membro das comissões juvenis de apoio à candidatura do General Humberto Delgado, Ruben de Carvalho foi também ativista da oposição democrática nos escrutínios para a Assembleia Nacional de 1961, 1965 e 1973, tendo nestas últimas integrado a Comissão Central da CDE (Comissão Democrática Eleitoral).
Desde cedo alvo da atenção da PIDE, esteve preso em Caxias e no Aljube. De acordo com a nota do PCP, no histórico dirigente do partido foi preso em 1961, 1962, 1963, 1964 e 1965/1966 e de novo em 7 de abril de 1974.
Além da atividade política, Ruben de Carvalho distinguiu-se também pelo percurso cultural, sobretudo enquanto dinamizador da música e cultura populares. Estudioso do fado, é autor do livro As músicas do Fado.
Jornalista, foi chefe de redação da Vida Mundial, redator coordenador do jornal O Século e chefe de redação doAvante! desde a primeira edição da série legal do jornal do PCP, em abril de 1974, até 1995. Foi também colunista do Diário de Notícias, onde assinou durante vários anos uma crónica intitulada 1000 carateres.