PS defende ouvir só um chefe militar sobre o reequipamento das Forças Armadas

Ministro da Defesa diz que o Parlamento "não deve dar demasiada importância ao contributo parcelar" dos chefes da Marinha, Exército e da Força Aérea.
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O Governo e o PS puseram esta quarta-feira em causa a necessidade de o Parlamento ouvir os chefes dos três ramos das Forças Armadas em matéria de reequipamento militar, limitando essas audições ao chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA).

As posições do ministro João Gomes Cravinho e deputado Ascenso Simões (PS) - traduzindo o reforço dos poderes do CEMGFA que consta da lei aprovada durante o governo PSD/CDS - foram assumidas durante a audição do governante na Comissão parlamentar de Defesa, durante o debate na especialidade na proposta de revisão da Lei de Programação Militar (LPM) para os próximos 12 anos e no valor de quase cinco milhões de euros.

Em causa as reservas que os chefes da Marinha, Exército e Força Aérea expressaram aos deputados nas respetivas audições, em função das prioridades dos respetivos ramos e quando o documento já foi aprovado ao nível militar e pelos órgãos políticos onde os chefes militares têm assento.

"Esta proposta passou" pelo Conselho de Chefes de Estado-Maior (CCEM), observou João Gomes Cravinho, acrescentando que "o momento adequado para os chefes fazerem ouvir os seus pontos de vista é esse". A seguir, tendo sido aprovada em Conselho Superior Militar (CSM) e no Conselho Superior de Defesa Nacional (CSDN), "o momento de reflexão militar já acabou" e o debate parlamentar na especialidade trata-se de fazer uma "reflexão política".

Coube a Ascenso Simões lançar o tema, sobre o qual os outros partidos não reagiram: "Cometemos um erro quando a Assembleia da República chama os chefes dos ramos", pois "a visão" do Parlamento "deve ser integrada".

Isso é dado pela "leitura militar" do CEMGFA e pela "leitura política" do Governo, pois as "leituras parcelares" de cada ramo carregam os "problemas de quem não olha para o todo", adiantou o coordenador da bancada socialista na Comissão de Defesa.

Gomes Cravinho já tinha referido, na sua intervenção inicial, que os mais importantes programas da LPM têm uma "lógica de conjunto" para as Forças Armadas e de interoperabilidade entre a Marinha, Exército e Força Aérea - algo que "o chefe do ramo não tem".

Lembrando que cada chefe militar "apresentou um conjunto de ambições que não podem todas ser satisfeitas" sob pena de duplicar os 4,7 milhões de euros previstos para a LPM, o ministro da Defesa explicou que isso impõe a "necessidade de fazer prioridades e ver o que é fundamental".

Ora, se os chefes militares de cada ramo "fazem o seu dever ao chamar a atenção" até à aprovação da proposta de LPM em Conselho Superior de Defesa Nacional, presidido pelo Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas, as apreciações posteriores que fazem "não devem permitir que [o Parlamento] se torne num simples canal de transmissão das diferentes perspetivas das chefias".

No Parlamento "faz-se uma leitura política, global" do reequipamento e modernização das Forças Armadas e, "embora seja útil ter o contributo dos chefes", importa aos deputados "não dar demasiada importância ao que é um contributo parcelar", sustentou João Gomes Cravinho.

A posição do PS e do ministro da Defesa surgiram após Pedro Roque (PSD), dizendo existir "uma visão de alguma maneira coincidente" com o Governo sobre o conteúdo da proposta de LPM, ter manifestado algumas reservas com base no que reconheceu serem "algumas visões discordantes" ouvidas "dos chefes militares na Comissão de Defesa".

"Já tinhamos algumas dúvidas", nomeadamente sobre a opção de afetar 300 milhões de euros à construção de um navio polivalente logístico (NPL) e deixando cair a modernização das fragatas Vasco da Gama, "que reforçámos" após as audições dos chefes dos ramos e porque "o país tem recursos limitados", observou Pedro Roque.

Procurar consensos

O debate desta manhã confirmou que o principal ponto de discórdia da proposta de LPM reside na aquisição de um NPL novo por 300 milhões de euros e não modernizar as três fragatas Vasco da Gama, perdendo mais de metade do poder naval da Marinha quando se está a defender o alargamento da plataforma continental.

Pedro Roque, registando a disponibilidade do PS para um consenso com o PSD e o CDS que Ascenso Simões disse querer alargar ao PCP (dado que se absteve durante a votação na generalidade), alertou para a impossibilidade de Gomes Cravinho garantir que o NPL seja construído em estaleiros nacionais - um dos argumentos do Governo, por corresponder a um investimento na economia nacional.

Acresce o facto de haver alternativas menos dispendiosas, desde a opção por NPL em segunda mão ou a adaptação de um navio civil para esse fim, sugeriu Pedro Roque.

A resposta de Gomes Cravinho foi ao encontro das reservas da oposição, já que tanto João Vasconcelos (BE) como João Rebelo (CDS) e António Filipe (PCP) tinham manifestado dúvidas sobre o NPL: "Aprovar a LPM como está não significa o compromisso de gastar" os 300M milhões de euros num programa "que impeça aproveitar outra solução mais barata" como as sugeridas.

"É possível que nos próximos anos surja uma oportunidade que desconhecemos" e que, a ser aproveitada, "poderia significar uma poupança significativa" para o Estado, assumiu o ministro da Defesa.

Gomes Cravinho explicou ainda que os 46 milhões de euros disponíveis para o programa de ciberdefesa correspondem ao que as Forças Armadas disseram ter capacidade para fazer nesse domínio.

Quanto à modernização dos caças F-16 da Força Aérea, na década de 2030 e para a qual João Rebelo questionou a ausência de verbas, o governante precisou que ela vai ser feita com recurso a verbas resultantes da alienação de material militar usado.

Sobre o programa dos KC-390, no valor de 827 milhões de euros, Gomes Cravinho disse que se está na "fase final de negociação" com o fabricante brasileiro Embraer - e reafirmou a garantia de que Portugal não investirá mais do que aquele valor definido na LPM. A empresa "sabe que isso é uma condicionante absoluta do nosso lado", sublinhou.

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