César insinua ultimato à esquerda: ou "responsabilidade" ou "isolamento"
Das duas, uma: ou "responsabilidade" ou "regresso ao isolamento". Foram estas as duas opções com que esta manhã Carlos César confrontou os partidos à esquerda do PS - da "maioria parlamentar", disse - face à discussão que se aproxima do Orçamento do Estado para 2019.
O líder da bancada do PS falava na Pousada do Alqueva, ao abrir o segundo e último dia das jornadas parlamentares do partido em Beja e Évora. A iniciativa será encerrada ao fim da manhã pelo líder do partido, António Costa.
Dizendo ao BE, PCP e PEV que devem ter "orgulho" no que já foi alcançado pelo Governo do PS, no crescimento do emprego ou no reforço dos direitos laborais, o líder parlamentar disse que a "apreciação" do OE deve ser "marcada pela convergência" mas também por um "indispensável sentido de responsabilidade" - e "outra coisa não se espera" dos parceiros da 'geringonça'
Depois acrescentou: "Nem o Partido Socialista se desviará do seu percurso nem a esquerda quer voltar a um regime de isolamento". Mas mais do que isso: não só os parceiros do PS não se podem arriscar a situação de "isolamento" como também de "falta de influência" (e o resto da frase de César foi abafada pelos aplausos dos deputados do PS).
Antes, já tinha afirmado que os "sucessos" da governação do PS foram conseguidos com a "contribuição e sensibilidade indispensáveis" dos partidos à esquerda do PS - frase a que os deputados do PS reagiriam com indiferença, não a aplaudindo.
E prosseguiu: "Não estamos muitas vezes em acordo e somos às vezes exuberantes nas discordâncias". Mas - sublinhou - "é bom que esses partidos marquem as diferenças" porque isso "ajuda-nos a todos a crescer e a maturar as decisões" e, além disso, a "esclarecer os eleitores".
Avisos ao Governo
Os partidos à esquerda do PS foram alvo de avisos por parte do líder parlamentar do PS mas o Governo também. César reafirmou que a sua bancada introduzirá mudanças na proposta de lei que o Governo apresentou no Parlamento para traduzir o acordo que fez na Concertação Social de revisão do Código Laboral. "Vamos melhorar esse acordo [de concertação social] impedindo abusos que o pervertam", afirmou - numa referência implícita à questão do prolongamento do período experimental dos contratos de trabalho.
Se as propostas já foram objeto de concertação social, agora é "o tempo da concertação parlamentar" - "é isso que faremos com liberdade e responsabilidade que nos são próprias".
Ao mesmo tempo piscou o olho aos parceiros da 'geringonça" para viabilizarem essas alterações - agora que o PSD ameaça dizer 'não' à proposta se ela alterar o acordado com os parceiros sociais. "O acordo é benéfico para os trabalhadores", é "pioneiro na dignificação do trabalho", "promove a limitação contratos a termo" e introduz a taxa de rotatividade que penaliza empresas assentes em trabalho temporário".
Cavaco na mira
Também na mira do líder parlamentar do PS esteve o ex-Presidente da República Cavaco Silva, que há dias voltou a ter voz pública para criticar o desinteresse histórico do poder político e partidário no combate à desertificação do interior (no seu entender porque no interior os votos são poucos).
Neste contexto, começou por reivindicar para o seu partido - referindo em particular os nomes de António Guterres, João Cravinho e Capoulas Santos (presente na sala) - o impulso decisivo que levou à conclusão da construção da barragem do Alqueva.
Depois afirmou que "as assimetrias devem continuar a ser uma preocupação do PS" - mas dizendo ao mesmo tempo que elas resultam "de um tempo longo em que o interior pouco contava" e "de forma muito particular para a direita" dos "yuppies e tecnocratas do cavaquismo".
Dirigindo-se ao Governo do PS, disse que "há uma tendência natural de concentração das atividades económicas" no litoral. E por isso "é importante que a atividade governativa tome medidas que atenuem essa tendência natural".
Foi também criticando a direita - mas agora a representada no Governo de Passos Coelho entre 2011 e 2015 - que o dirigente socialista contextualizou os atuais problemas do SNS.
Se há problemas é porque "não é possível fazer tudo" e "recuperar como gostaríamos e no tempo em que gostaríamos". Mas isso explica-se "por causa do que o SNS sofreu" entre 2011 e 2015" e "não por causa das 35 horas, como diz o PSD" ("já temos mais médicos do que tínhamos em 2011, quando havia 35 horas"). "Ainda pesam sobre nós os efeitos de uma austeridade cega que destruiu eficiências da administração."
Para a direita atualmente representada no Parlamento também dirigiu ataques, a propósito das questões da demografia.
"Há alguns setores e partidos que despertaram agora para essas questões", afirmou. Sublinhando que é de facto necessária "uma verdadeira estratégia política concertada de apoio às famílias", ressalvou no entanto logo de seguida que isso "tem muito pouco a ver com as propostas do PSD" recentemente apresentadas - "e que o CDS diz que lhe foram plagiadas".
Esse plágio, aliás, resulta no seu entender de, entre 2011 e 2015, os dois partidos terem "convivido sem remorso com uma queda da natalidade superior à das duas décadas anteriores".
Além do mais, as acusações que agora o PSD e o CDS trocam revelam também uma luta entre os dois partidos onde "já não se conhecem limites" - e que levam o CDS, no dizer de César, a fazer sucessivas propostas que retiram centenas de milhões ao erário público (primeiro a de diminuição do IRS no interior e depois a de diminuição dos preço dos combustíveis por via fiscal).
Enfim, concluiu: "Com tantas centenas de milhões retirados ao OE é difícil fazer os investimentos que ao mesmo tempo exigem."