"Crise da direita"? PSD volta a disparar sobre Marcelo

As opiniões do Presidente da República antevendo uma "crise da direita" servem apenas para preparar uma recandidatura a Belém, disse David Justino. Rui Rio discute o assunto com o PR amanhã.

O PSD não gostou das palavras do Presidente da República falando numa "crise da direita" e esta manhã, através de um dos vice-presidentes do partido, David Justino, voltou a criticá-lo por isso.

Também hoje, à margem de um almoço no American Club, em Lisboa, Rui Rio foi interpelado sobre o assunto, dizendo apenas que será "natural" que o comente amanhã com o Presidente, na audiência que terá em Belém.

Falando na TSF, David Justino considerou que Marcelo Rebelo de Sousa está "claramente a fazer comentário político", ou seja, "a fazer um exercício de prognóstico" colocando-se numa "posição de oráculo sobre o que vai acontecer".

Segundo acrescentou, o PR quis apenas com a sua análise preparar o terreno para se recandidatar a Presidente da República em 2021. Ou seja, a antevisão de uma "crise da direita" surge no discurso presidencial "não por ser uma realidade, mas por ser um contexto favorável à [r]candidatura".

"Desfocar dos problemas reais"

Por outras palavras: Marcelo quis dizer com esta "antevista crise da direita" que "é fundamental que ele se possa recandidatar para restabelecer o equilíbrio", já que é "a única pessoa que está em condições". Mas o que conseguiu foi "desfocar daquilo que são problemas reais dos portugueses para artefactos e artifícios políticos"

No mesmo programa, Carlos César, presidente do PS e líder da bancada socialista no Parlamento, concordou com David Justino na parte em que este disse que o que está em causa na declaração do PR são as próximas eleições presidenciais: "Estamos em presença de mais uma declaração do Presidente da República no sentido da sua própria candidatura *a presidência."

Concordando que "é mais notória uma crise dos partidos da direita do que dos partidos do regime", César ressalvou no entanto que, em seu entender, "não existe uma crise de regime em Portugal".

O Presidente da República considerou hoje que "há uma forte possibilidade de haver uma crise na direita portuguesa nos próximos anos" e defendeu que, num contexto destes, o seu papel "é importante para equilibrar os poderes".

Em 31 de maio, numa intervenção - em inglês - feita na sede da FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento) em Lisboa, Marcelo, comentando os resultados das eleições europeias, disse que Portugal tem agora "uma esquerda muito mais forte do que a direita" e que "o que aconteceu à direita é muito preocupante".

Quanto à esquerda, o chefe de Estado referiu que "o PS fortaleceu a sua posição, e quem se sabe se isso acontecerá de forma ainda mais profunda nas próximas eleições legislativas", podendo vir a ter "diferentes possibilidades" para formar maioria, além de PCP e BE, "porque outros partidos estão a crescer" - numa alusão ao PAN.

"Há uma forte possibilidade de haver uma crise na direita portuguesa nos próximos anos. Isto, para ser muito realista."

À direita, identificou uma fragmentação, "em vez de dois partidos, quatro, cinco ou seis, embora alguns deles sejam muito pequenos", e "crise interna nos mais importantes partidos" que estiveram coligados no anterior Governo, PSD e CDS-PP, mas entre os quais agora há "uma impossibilidade de diálogo".

"Portanto, eu diria que há uma forte possibilidade de haver uma crise na direita portuguesa nos próximos anos. Isto, para ser muito realista. Isto explica por que é que o equilíbrio de forças está como está. E um bocadinho também por que é que o Presidente, pelo menos neste momento, é importante para equilibrar os poderes", acrescentou.

Sublinhando que ele próprio "veio da direita", argumentou que "com um Governo forte de centro-esquerda e uma oposição de direita fraca, cabe ao Presidente, não equilibrar, porque não pode ser oposição a nenhum Governo, é claro, mas ser muito sensível e sentir que é preciso ter um equilíbrio no sistema político".

"A crise não está só à direita, a crise está no regime comum todo. Neste momento está à esquerda no poder e portanto disfarça à esquerda. Mas o problema é transversal, nós temos uma crise efetiva de regime."

As declarações do PR foram há cerca de uma semana mas as reações não param. Rui Rio foi o primeiro a abrir as hostilidades, logo no dia seguinte. "A crise não está só à direita, a crise está no regime comum todo. Neste momento está à esquerda no poder e portanto disfarça à esquerda. Mas o problema é transversal, nós temos uma crise efetiva de regime, com um descrédito muito grande de todo o sistema partidário, não é à direita nem à esquerda", disse.

Acrescentando: "O PSD tem de ser revitalizado, o CDS também, mas o PS, quando deixar o poder, e os partidos mais à esquerda quando deixarem de ter influência no poder, os portugueses verão que, infelizmente, a crise é transversal".

Outras reações

Assunção Cristas: "A posição do CDS tem sido sempre a mesma: referir e sublinhar o nosso trabalho. E o nosso trabalho, como é evidente, e certamente, como é a preocupação do PR, é ser uma oposição forte, sempre construtiva que mostre uma alternativa para o país. É isso que estamos a fazer em vários domínios."

José Luís Arnaut (antigo secretário-geral do PSD no tempo em que Marcelo liderava o partido): "O partido tem um líder, tem um programa e tem um caminho a fazer, esse caminho é inquestionável. A nós cumpre-nos criar as condições necessárias de solidariedade real, efetiva ao líder do partido, porque um resultado é sempre coletivo, nunca é de uma só pessoa"."Há uma crise de confiança no atual sistema, isso há, como se vê pela abstenção, que tem sido crescente, e essa crise toca todos os partidos do sistema e toca as instituições políticas 'lato sensu'."

Ângelo Correia: "Se o senhor Presidente da República entende que há uma crise na direita, a sua missão é tentar, junto dos partidos, encontrar processos e modos de fortalecimento da democracia. O senhor Presidente da República escolheu um método ao contrário, que é dizê-lo ao país, num jeito de um comentador político e não de um supremo magistrado da nação. [...] O Presidente da República não é um comentador televisivo, é um integrador para assegurar o regular funcionamento das instituições e isso não fez. Falhou, errou."

Miguel Relvas: "Desvalorizar a posição de Estado que o Presidente da República demonstrou, e tem demonstrado, em relação ao sistema político revela bem o estado de negação em que alguns atores políticos se encontram neste momento." [...] O Presidente da República demonstrou uma vez mais ser o referencial de confiança, de equilíbrio e de lucidez do atual sistema político em Portugal [...]. Deu, uma vez mais, um contributo decisivo para a necessidade de termos uma oposição forte que possa garantir os equilíbrios do sistema político democrático."

Francisco Pinto Balsemão: "A crise não é de direita, nem de esquerda, a crise é realmente de um sistema político que, em muitos aspetos - este é um deles -, está ultrapassado e precisa de conquistar o apoio popular e a vontade das pessoas de participarem e perceberem que a democracia é de longe o melhor sistema político em que podemos viver."

Paulo Rangel: "Confundiu os planos de comentador com o de Presidente [...] fez uma análise global, fez mal em fazê-lo, devia ser mais auto contido, devia ter tido uma certa restrição porque faz parte da sua missão."

Francisco Assis: "[Foi uma] declaração absolutamente insólita." "[Marcelo] não tem de fazer comentário político nenhum, nem em português, nem em inglês, nem em chinês, seja em que língua for, [tem é] de estar acima da função de comentador político que foi em tempos". "Foi uma série de declarações completamente disparatadas e devem merecer uma clara reprovação pública."

[Notícia atualizada às 17h22 com declarações de Paulo Rangel e Francisco Assis na Rádio Renascença.]

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