Açores. Governo minoritário com teste imediato de vida ou morte

A lei açoriana não permite que um Governo entre em funções sem que o seu programa vá a votos no Parlamento regional. Mas antes haverá outro teste.
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Na lei dos Açores e na lei da República há uma pequena diferença, no que toca ao início de funções de um Governo - uma diferença decisiva tendo a situação complexa criada com as eleições regionais de domingo, onde o PS venceu mas perdendo a maioria absoluta, ficando essa maioria à direita, pela conjugação dos deputados eleitos do PSD, CDS, Chega, PPM e Iniciativa Liberal.

Na República, o Programa de Governo é discutido no Parlamento mas não necessariamente votado (aconteceu por exemplo com o atual Executivo de António Costa).

Mas nos Açores não é assim, por via do que está previsto do Estatuto Político-Administrativo da Região. O que está estipulado é que o Governo empossado apresenta o seu programa na Assembleia Legislativa Regional - e aqui esse programa é obrigatoriamente votado.

Dito de outra forma: qualquer solução governativa que se apresente nos próximos tempos será imediatamente testada, indo imediatamente a votos.

Se o líder do PS regional, Vasco Cordeiro, for convidado pelo Representante da República (embaixador Pedro Catarino) a formar Governo - e deverá sê-lo, "tendo em conta os resultados eleitorais" -, então Cordeiro terá de se apresentar no Parlamento regional já munido de uma solução maioritária de apoio. Porque se a não tiver arrisca-se a ver o seu programa de Governo chumbado - e esse chumbo acarreta a demissão do Governo.

Caso isso aconteça, o Representante da República deverá indicar então o líder do PSD regional, José Manuel Bolieiro, para formar um novo Executivo, e tudo se repetirá. O seu programa irá então a votos - e se tudo se repetir novamente, então será colocada em cima da mesa a convocação de novas eleições - uma competência do Presidente da República, a quem cabe o poder de dissolver a Assembleia Legislativa Regional, marcando as eleições.

No Parlamento nacional isso pode não acontecer. Se ninguém apresentar uma moção de rejeição (ou de confiança) ao programa de Governo, o Executivo pode simplesmente entrar em funções e depois navegar à vista, buscando apoios à esquerda ou à direita consoante as matérias - e adiando para as discussões do Orçamento do Estado o verdadeiro momento de ou vai ou racha. Foi o que aconteceu com o atual Executivo de António Costa.

Antes da votação do programa do Governo regional haverá no entanto um teste que permitirá avaliar a eficácia dos alinhamentos interpartidários já alcançados (ou não alcançados)

Esse momento será o da eleição do(a) presidente da Assembleia Legislativa Regional (que de há oito anos para cá tem sido a socialista Ana Luís, agora reeleita pelo Faial). Como partido mais votado, o PS irá apresentar candidatura ao cargo (não se sabe quem apresentará). E aí se verá se tem votos ou não - e como o PSD e os partidos à sua direita de comportarão. Essa votação deverá ocorrer no dia em que os novos deputados regionais tomarão posse do cargo, 9 ou 10 de novembro.

O PS venceu as eleições, como vem acontecendo desde 1996, mas perdeu a maioria absoluta, passando de 30 deputados para 25. Tendo a Assembleia Legislativa Regional 57 deputados, a maioria absoluta faz-se com 29 (ou mais).

Assim, os socialistas, para terem uma maioria segura no Parlamento regionais, precisam de ter no mínimo mais quatro deputados. Mas se se focarem exclusivamente na esquerda não o conseguem. O BE só tem dois eleitos (manteve o resultado e até subiu em número de votos) e o PAN um (não tinha nenhum). Assim, os socialistas tenderão necessariamente a olhar também para o CDS (três eleitos) e para o PPM (dois). E é mesmo possível que até olhem preferencialmente para o CDS e para o PPM (em vez de para o BE e para o PAN).

A direita, pelo seu lado, tem maioria absoluta, com 29 deputados: PSD (21 deputados) + CDS-PP (3) + PPM (2) + Chega (2) + Iniciativa Liberal (1). Um entendimento portanto cheio de elos por onde pode quebrar.

Na história democracia açoriana só uma vez não houve maioria absoluta, em 1996, quando o poder passou do PSD para o PS. Carlos César governou a legislatura 1996-2000 apoiado no CDS - mas sem uma coligação formal.

Fonte da direção nacional do CDS ouvida pelo DN salientou que o partido tem "autonomia regional"

Contudo, acrescentou que "para que se construa uma geringonça de direita, que não foi enjeitada pelo CDS, é preciso saber se o PSD quererá liderar essa alternativa e consegue construir uma maioria com os votos necessários".

A mesma fonte reforça que o líder do Chega rejeitou um entendimento com o PSD mas admitiu que poderão existir negociações para trazer o partido de André Ventura a um eventual compromisso. "Quem tem de apresentar uma solução de governação é o PSD. O CDS tem de aguardar com calma", refere. "Quem tem de pedalar para construir um alternativa é o PSD".

Sublinhando que o CDS teve um resultado "relevante", do mesmo nível que teve em 2012 com Paulo Portas, e que dá ao partido uma posição de charneira na futura solução de governo açoriano, o interlocutor do DN sublinhou ainda que se essa solução à direita falhar, os centristas não fecham a porta a conversações com o PS, como implicitamente admitiu na noite eleitoral o líder dos centristas açorianos, Artur Lima.

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No PSD há uma certeza: a disponibilidade é para falar com todos os partidos à direita - ou seja, não excluindo o Chega. O Chega, pelo seu lado, jura - como fez André Ventura no domingo - que não alinha em coligações com o PSD. Resta saber se essa escolha não implicará, de uma forma ou doutra, dar a mão ao PS.

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