"Acha que a polícia não sabe onde há armas ilegais e onde se vendem?"

Em guerra contra a alteração à Lei das Armas, o eurodeputado do CDS/PP Nuno Melo considera que estão em causa "graves restrições" à liberdade individual e ao direito de propriedade, e que a criminalidade violenta e o terrorismo não se combatem assim.

"O que se tenta com esta alteração à lei é antigo e é limitar o mais possível o porte de arma. A questão é: um cidadão que não pertença às forças de segurança pode ou não ter armas? Eu acho que sim."

Nuno Melo, que parece estar a fazer deste tema um dos motes da sua pré-campanha para as europeias - circula nas redes sociais um convite seu, com o grafismo dos cartazes de candidato, para um debate sobre "A caça e a Lei das Armas" na próxima sexta-feira, em Leiria -- explica ao DN a sua oposição às alterações à Lei das Armas anunciadas pelo governo como transposição de uma nova diretiva europeia. Diretiva que já tinha merecido a Melo contestação, levando a que o lobby das armas o tivesse elogiado como "a força boa" em mails para os eurodeputados aquando da votação.

"Quer a diretiva quer a proposta de lei do governo destinam-se a regular atividade legal com armas, e quem comete atentados não usa armas legais. O que se deve fazer é atacar o mercado ilegal. Devia haver rusgas nos locais onde há armas."

"A diretiva surgiu como consequência dos atentados em Paris. Mas quer a diretiva quer a proposta de lei do governo destinam-se a regular atividade legal com armas, e quem comete atentados não usa armas legais", diz o eurodeputado. "O que se deve fazer é atacar o mercado ilegal. Devia haver rusgas nos locais onde há armas." Questionado sobre quais os locais a que se refere, o eurodeputado não esclarece. Mas pergunta: "Acha que as polícias não sabem onde há armas e onde se vendem?"

Não está, explica, a afirmar que as polícias não querem agir contra o tráfico de armas: "Não têm meios. As polícias têm miseráveis condições para trabalhar. São mal pagas, são profissão de risco e quanto atuam são incompreendidas."

Na mente do centrista não estaria pois o caso que em 2006 abalou a PSP, com vários agentes e funcionários da corporação, incluindo o então chefe da divisão de armas e explosivos, Celestino Soares, a serem acusados e depois condenados de corrupção e de envolvimento numa rede de venda ilegal de armas. Um dos agentes, proprietário de um armeiro, foi condenado a prisão efetiva.

"É demagogia falar de direitos fundamentais no uso de armas"

A existência em Portugal de 1,5 milhões de armas em mãos de particulares é um dos argumentos apresentados pelo governo para restringir o tipo e quantidade de armas que cada pessoa pode ter. O número foi adiantado em dezembro, no parlamento, pelo ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, defendendo a necessidade de ter em conta "fenómenos recentes verificados infelizmente na Europa" e de não se dever "acordar depois de os problemas acontecerem". Cabrita referia os ataques terroristas de 2015 em Paris, que terão sido determinantes para a génese da diretiva europeia de 2017. E considerou "demagogia pura falar de direitos fundamentais a propósito do uso de arma".

Uma referência clara à argumentação usada pelo lobby das armas nos EUA, e ao facto de a respetiva Constituição referir o direito ao porte de arma, mas também à retórica de Nuno Melo, que invoca a liberdade individual e o direito de propriedade para combater a proposta do governo. Para o eurodeputado, a lei portuguesa como está "é das mais equilibradas da Europa", com suficientes restrições, e o governo "está a usar de má fé procedimental ao apresentar nova legislação como transposição da diretiva": "A lei não transpõe nada da diretiva e vai muito para além dela."

"25 armas para quem não sabe nada de caça é uma loucura, claro. Mas um caçador profissional pode perfeitamente ter mais de 25 armas. Acho que não compete ao Estado estabelecer quantas armas são de mais. Qual o critério? O da segurança? Para cometer crimes basta uma arma."

É restritivo, por exemplo, limitar, como faz a proposta, a 25 o número máximo de armas que um caçador pode possuir? "25 armas para quem não sabe nada de caça é uma loucura, claro", diz o eurodeputado, que admite ser caçador mas não revela quantas armas detém. "Mas se eu for um caçador profissional posso perfeitamente ter mais de 25 armas. O que acho que de tem de haver é a garantia de que as armas estão guardadas em condições de segurança, em cofres-fortes, que são transportadas em condições de segurança. Acho que não compete ao Estado estabelecer quantas armas são de mais. Qual o critério? O da segurança? Para cometer crimes basta uma arma."

Considerando que há aspetos da lei atual com os quais não concorda e devem ser alterados - "é o caso de se admitir porte de arma a alguém pelo simples exercício de um cargo, o que não faz sentido, deve haver sempre formação obrigatória para quem queira ter uma arma de defesa e ser passada a licença pela PSP" --, critica o facto de o governo querer acabar com as "licenças de detenção", que têm a ver com a posse de armas que não são usadas. "Ora eu posso deixar a caça e querer ficar com a minha arma, ou pode o meu pai morrer e eu querer ficar com a arma dele. A lei atual diz que a tenho de ter guardada num cofre e não posso ter munições em casa. Acho esse regime bom."

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