Uma boa notícia para a saúde dos lisboetas
Um em cada quatro utentes (24,6%) inscritos nos cuidados de saúde primários não tinha médico de família em 2023 em Lisboa e Vale do Tejo, segundo o relatório da Entidade Reguladora da Saúde. Em junho, de acordo com o portal desta entidade, havia um milhão e 605 mil pessoas sem um médico atribuído. São mais 75 mil do que em fevereiro. É o maior número desde 2016.
É por isso, uma boa notícia quando temos uma prova de gestão competente e humanista proveniente de uma associação de direito privado como são os Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa (SSCML) a qual, apesar de estatutariamente apenas ter a obrigação de disponibilizar “atividades
e benefícios de proteção social dirigidos aos funcionários e agentes da Administração Pública, destinados à prevenção, redução e resolução de problemas decorrentes da sua situação laboral, pessoal ou familiar que não sejam atendíveis através dos Regimes Gerais de Proteção Social”, abriu as portas à comunidade de lisboetas sem médico de família.
Como conta a jornalista Ana Mafalda Inácio, criados em 1941, os SSCML foram fazendo o seu caminho na área da Saúde. Primeiro eram só os trabalhadores e seus familiares, depois fizeram acordos com outros subsistemas de saúde, seguradoras e, por fim, utentes do próprio Serviço Nacional de Saúde (SNS). Segundo Rui Julião, o diretor clínico, as duas clínicas abertas no Bairro do Armador, em Marvila, e na Alta de Lisboa, têm dado resposta a residentes sem médico de família ou com difícil acesso aos mesmos.
Como destacamos nesta edição, os SSCML vão crescer, com um novo hospital, mais um centro de saúde e um serviço de urgência já em 2025 – quem ganha vai ser, sem dúvida, a qualidade de prestação de cuidados de saúde.
De assinalar ainda que a CML está a fazer este caminho quando há mais de 30 anos que a capital espera pelo Hospital de Lisboa Oriental.
No meio da atual incapacidade de gestão das urgências hospitalares, com as inacreditáveis situações de grávidas a ter de percorrer centenas de quilómetros para terem os seus filhos (neste sábado estavam 11 serviços de obstetrícia / pediatria encerrados), Rui Julião, com 20 anos de percurso nos SSCML, deixa-nos esperança: “A partilha é uma obrigação de todos quando fazemos algo que sabemos ser o certo”.
Agentes de execução. A “licença para roubar” está a perder validade
Há dois anos publicámos uma grande reportagem - "Licença para roubar" - escrita pelas jornalistas Alexandra Borges e Rita Sousa e Silva que nos descrevia as histórias dramáticas de várias pessoas a quem agentes de execução tinham desviado, para benefício próprio, pagamentos para saldar penhoras a salários, pensões e subsídios de desemprego, no âmbito de processos executivos.
Em situação já vulnerável pelas dívidas que tinham acumulado, estas pessoas ainda se viam na situação de ter de pagar de novo o que já tinham saldado. Algumas mais de uma vez porque os “cobradores” ao não receberem, contratavam novos agentes de execução que, por sua vez, se apresentavam de novo aos devedores.
Dizia, nesta reportagem, António Marinho Pinto, ex-bastonário da Ordem dos Advogados, que “na ação executiva em Portugal, o crime compensa".
Mas nessa altura a Polícia Judiciária (PJ) já tinha concluído inquéritos sobre a deriva criminal desta atividade, privatizada em 2003 e sem nunca se ter garantido um controlo e fiscalização credíveis.
Foram detidos e condenados altos responsáveis como o presidente da Câmara dos Solicitadores e o presidente da Associação dos Agentes de Execução. Tratam-se de investigações complexas que exigem a verificação de milhares de contas e o cruzamento dos dados de outras tantas transferências.
Como contamos neste jornal, na sexta-feira, a PJ foi buscar para cumprir pena de sete anos de cadeia, uma agente de execução, antiga associada do presidente da Câmara dos Solicitadores - condenado por se apropriar indevidamente de mais de meio milhão de euros de clientes.
Em 2016 já tinha sido condenada a prisão domiciliária por suspeitas de desvio de cerca de 2,5 milhões de euros. Estava em “parte incerta” desde que a mais recente sentença transitou em julgado em 2023.
Podemos dizer que é uma gota de água, mas não podemos deixar de acreditar que, neste setor, a “licença para roubar” está a ficar fora de prazo. E o crime começa a não compensar.