Um pacto com o futuro
Christine Lagarde, atual presidente do Banco Central Europeu (BCE) e presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI) entre 2011 e 2019, esteve há poucos dias em Portugal, mais precisamente em Sintra, onde decorreu o fórum dos governadores dos Bancos Centrais Europeus, desta vez subordinado ao tema Política monetária numa era de transformação. No final, deu uma entrevista em que talvez tenha explicado como se fará essa transformação da política monetária, mas a informação mais aguardada era se as taxas de juro iriam diminuir. A presidente do BCE manteve a incerteza.
Não pude deixar de recordar os funestos tempos da troika em Portugal. O Memorando de Políticas Económicas e Financeiras, que visava o equilíbrio das contas públicas de Portugal (e era a condição para o empréstimo de que o Estado precisava), foi estabelecido em 2011 com a participação da Comissão Europeia, o BCE, na altura presidido por Mario Draghi, e o FMI de Christine Lagarde.
Foram tempos muito sofridos em que houve declarações desajeitadas sobre os PIGS (Portugal, Itália, Grécia, Espanha) - feios, porcos e maus - que assim eram tratados e retratados, com pouca ou nenhuma sensibilidade pelo sofrimento das pessoas. Estudos académicos mostram que a receita de austeridade aplicada aos países não teve o efeito esperado e aumentou desigualdades. Portugal foi considerado um caso de sucesso, mas ainda está gravado a fogo na memória coletiva.
Por isso se torna tão urgente a mudança das instituições multilaterais, entre as quais o FMI, um dos temas da Cimeira do Futuro convocada por António Guterres para setembro próximo. Talvez no momento mais difícil desde que, no pós-guerra, se constituíram os principais organismos multilaterais, o secretário-geral das Nações Unidas continua a lutar por uma agenda comum que permita melhorar a cooperação internacional, única forma possível de concretizar as ambições e os objetivos que salvaguardem o futuro.
Nenhum país conseguirá alcançar essas metas por si só. Essa a razão por que importa revigorar o multilateralismo, o que implica reformar o sistema multilateral, as suas formas de decisão e intervenção. O debate internacional estende-se aos modelos de avaliação dos países, centrados até agora nos indicadores do PIB, estando a surgir índices de bem-estar que trazem novas perceções.
Também a presidência brasileira do G20 estabeleceu como prioridade a mudança de perspetiva das instituições multilaterais com destaque para a reforma do Sistema Financeiro Global de forma a não aprofundar as desigualdades sociais.
Vivemos um contexto complexo, marcado pela frustração, o medo, a desilusão, mas não nos encerremos no apocalipse. Precisamos de restaurar a confiança mútua e, sobretudo, deixar um mundo possível para as gerações futuras. É esse o pacto com a Humanidade.