Um Governo de “combate”

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Um Governo de continuidade, mas com algumas saídas e uma ou duas surpresas, juntamente com mudanças na orgânica e na estrutura. Esta será, provavelmente, a descrição que melhor encaixa no Executivo que Luís Montenegro deverá formar nos próximos dias, após ser indigitado pelo Presidente da República. Será também um Governo de combate, com a mesma ânsia de anunciar medidas atrás de medidas, à semelhança do que sucedeu na sua primeira encarnação, porque a porta da salvação é estreita e Luís Montenegro sabe que tem dois anos, no máximo, para mostrar o que vale, partindo do princípio de que a Spinumviva não volta às notícias.

Porém, as semelhanças com o primeiro Governo da AD ficam por aqui. Por um lado, a conjuntura política mudou de forma significativa no dia 18 de maio. Do outro lado da barricada está um Chega triunfante, que se tornou o principal partido da Oposição e que já não esconde a ambição de um dia ser governo, se possível à custa da AD (e não “com” a AD). Enquanto isso, o PS tenta reconstruir-se após a hecatombe eleitoral, sendo ainda incerto que o consiga fazer, sobretudo se a AD se mantiver como a grande força política do centro e centro-direita, o partido charneira do sistema político português. Para a AD, pelo menos nos próximos tempos, o PS representará uma muleta ou, quando muito, um potencial parceiro júnior, não um rival. A AD terá de decidir se prefere entender-se com o PS (e com a IL) para fazer as reformas de que o país necessita - por exemplo na área da Justiça - ou se prefere arriscar com o Chega, que a partir de agora se tornou o seu principal concorrente. E se a AD optar por entender-se com o PS, terá de acabar por lhe dar a mão, permitindo que tenha um lugar à mesa na eventual revisão constitucional ou na nomeação dos juízes do Constitucional. Como notou ontem Miguel Relvas, deixamos de ter um Ventura que se oferecia para apoiar o governo de Montenegro, para hoje termos um José Luís Carneiro que se oferece para tal missão.

Por outro, o ambiente macroeconómico está também a mudar. A guerra na Europa não dá sinais de terminar em breve, as tarifas prometem condicionar o crescimento global e a incerteza vai continuar a reinar, com alguns dos nossos principais parceiros comerciais a serem muito afetados. A economia vai crescer menos do que se esperava e as escolhas orçamentais do governo da AD - tomadas num contexto de forte pressão do ponto de vista eleitoral - vão ditar um regresso aos défices nas contas públicas. O tempo das vacas gordas pode ter os dias contados e isso vai limitar o leque de escolhas de qualquer governo e engrossar as fileiras dos descontentes.

O tempo que temos pela frente exige, pois, grande sabedoria e bom senso aos líderes dos três grandes partidos portugueses, que não podem deixar que lógicas imediatistas e eleitoralistas se sobreponham ao interesse do país. Exige também que o Presidente da República seja um factor de estabilidade, através da sua magistratura de influência.

Diretor do Diário de Notícias

Um Governo de “combate”
Novo governo será de continuidade, mas com algumas surpresas
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