Tráfico de pessoas, um crime em crescimento

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Quando se fala de imigração, esquece-se com muita frequência que, demasiadas vezes, pode haver também um crime associado à presença de estrangeiros: o tráfico de pessoas.

O tráfico de pessoas é um crime em crescimento, acompanhando a instabilidade adicional e as dificuldades económicas de diversos espaços do mundo e os próprios “incentivos” demográficos, mesmo que involuntários, da Europa e dos Estados Unidos, e em virtude também das consequências económicas e familiares (o aumento do número de menores órfãos, por exemplo) que a epidemia de covid-19 deixou em 2020 e 2021.

Crê-se que cerca de um milhão de pessoas anualmente é sujeita a tráfico. Na União Europeia, os últimos dados do Eurostat, para o ano de 2022, revelados em 2024, indicam que houve pelo menos dez mil vítimas registadas de tráfico e mais de 2000 pessoas condenadas por este crime. E não se trata apenas da receção de pessoas de países terceiros. O tráfico pode existir dentro de um país e também entre países da União Europeia. 37% das vítimas registadas na União Europeia eram cidadãos de Estados-membros da União Europeia.

Sabemos também que o número de vítimas de tráfico detetadas nos países da União Europeia em 2022 foi o mais elevado desde 2008. E, o que é uma novidade, o número de vítimas de tráfico para exploração do trabalho e para exploração sexual foi semelhante (cerca de 41% cada um destes grupos), representando um aumento muito relevante das vítimas de tráfico para exploração do trabalho em relação aos anos anteriores. Os países de origem das vítimas extra-União Europeia prevalentes foram a Nigéria, a Ucrânia, Marrocos, o Bangladesh, a Colômbia, o Brasil e o Paquistão.

Num outro relatório sobre tráfico de pessoas de 2024, neste caso da UNODC, a agência das Nações Unidas para as Drogas e o Crime Organizado, indica-se que se verificou um aumento de 25 pontos percentuais relativamente ao número de vítimas de tráfico, comparando os números de 2022 com os de 2019.

África é o continente com mais vítimas de tráfico. A maioria das situações de tráfico que se verificam ocorrem dentro do continente africano, onde a situação das crianças, no caso das meninas pensando na exploração sexual e para o trabalho, no caso dos meninos pensando na exploração para o trabalho, é especialmente grave. Mesmo se o tráfico de pessoas de África para a Europa é maioritariamente um trafico de adultos (94%), para exploração do trabalho (50%) e para exploração sexual (28%).

Situações prolongadas e intensas de conflitos neste continente, com a existência de milícias e de grupos armados que exploram crianças e outras pessoas em situação de fragilidade, associadas às debilidades dos Estados, explicam também este incremento.

É verdade que existem hoje mais dados, mais informação, mais transparência e uma maior disseminação da informação e dos números... Mas, mesmo assim, tudo parece indicar que a situação é mesmo pior e não melhor. E sobre isso o discurso público é francamente mais silencioso.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

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