Regime de meia-pensão

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A recente polémica em torno da proposta do PS de tornar permanente o aumento extraordinário das pensões leva-me a admitir que, hoje em dia, é difícil perceber se está alguém ao volante do Partido Socialista.

Em termos simples, os socialistas - que viabilizaram o Orçamento do Estado para 2025 - querem garantir, desde já, e sem perceber qual será o contexto económico do país a meio do próximo ano, que os reformados terão um aumento de 1,25 pontos percentuais nas pensões até 1527 euros. A medida tem um impacto no primeiro ano de 265 milhões de euros, que depois se repetirá. Mas o PS não o consegue fazer sozinho: para que a proposta de alteração do OE seja aprovada, os socialistas terão de contar com o apoio do Chega, bem como dos antigos parceiros da geringonça, o Bloco de Esquerda e o PCP. 

O PS também não consegue fazer futurologia, pelo que é impossível saber hoje - especialmente no ultratenso momento geopolítico que vivemos na Ucrânia, na Rússia, nos EUA e no Médio Oriente - se as economias europeias e mundiais não vão limitar a nosso própria progressão. É uma inconsciência o PS estar a propor esta medida? Não, mas é inconsistente com a tática recente de Pedro Nuno Santos. 

O atual secretário-geral do PS integrou dois governos de António Costa. No primeiro reverteu medidas aplicadas durante o tempo da troika - nomeadamente reduzindo para 35 horas a semana de trabalho na Saúde - que tiveram um impacto ainda não totalmente medido no SNS. Também distribuiu benesses pontual e regularmente pelos setores que mais impactam no momento do voto, como a Função Pública e os reformados. No Governo de maioria absoluta de António Costa, os serviços públicos foram esvaziados sistematicamente para contribuírem para um excedente apresentado por Fernando Medina no fim de 2023. 

Quando a AD ganhou, o PS de Pedro Nuno Santos rapidamente se transformou no “partido das contas certas”, acusando Luís Montenegro de ser um inconsciente que estava a hipotecar as contas públicas, fazendo acordo com os professores, os enfermeiros, as forças de segurança. Em suma, acusou a AD de estar a distribuir dinheiro e de estar “em campanha”. Agora, é o mesmo PS que inverte o caminho e volta ao permanente e pouco fundado aumento da despesa nas pensões, um sistema cuja sustentabilidade já está em desequilíbrio porque cada vez menos trabalhadores contribuem para cada vez mais pensionistas, a viver durante mais anos. 

O problema é que a aprovação desta medida tem o condão de agradar, quase de certeza, tanto a PS como a PSD. Para todos os efeitos é dinheiro que o Governo vai pôr no bolso dos pensionistas em meados do próximo ano. Bem poderá vir o PS dizer que foi o autor da medida: com mais rendimento na carteira, os eleitores premeiam quem está a governar. Ponto. 

Mas se as contas descarrilarem e for preciso apertar o cinto alguns furos, aí terá o Governo a desculpa perfeita para culpar os socialistas, com o bónus de ainda os associar aos radicais da extrema-direita (Chega) e da extrema-esquerda (Bloco e PCP), que ajudaram o PS a viabilizar a medida.

É caso para perguntar: quem, no PS, é o autor desta brilhante estratégia?

Diretor-Adjunto do Diário de Notícias

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