Reagan, Trump e o debate sobre a imigração

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Quem esteja a acompanhar as eleições nos Estados Unidos terá notado a grande diferença entre os dois principais candidatos no que toca à política de imigração. Enquanto Kamala Harris falou na primeira pessoa, recordando a sua mãe e o papel positivo que os imigrantes têm na sociedade americana, Donald Trump prometeu fechar as fronteiras e implementar um forte programa de deportações. Nisto, como em quase tudo, a sociedade americana está profundamente dividida.

No entanto, se olharmos para o mesmo Partido Republicano nos tempos de Ronald Reagan, uma figura central no fim da Guerra Fria que dificilmente poderá ser associado a políticas de esquerda, já que - e segundo o PCP - “personificava a contraofensiva do imperialismo (…)”, entraremos numa realidade paralela.

O último discurso que fez enquanto presidente foi dedicado ao tema, e Reagan entendia que a capacidade de atrair pessoas de todo o mundo “renova e enriquece a nação”, considerando ser essa “uma das razões do sucesso da América”. Reagan acrescentou ainda: “Graças à chegada de novas pessoas, somos uma nação sempre jovem, cheia de energia e novas ideias. Esta qualidade é fundamental para o nosso futuro”. E alertou para o risco de fechar as fronteira, que levaria “à perda do papel de liderança [dos EUA] no mundo”.

Terminou lembrando que “são homens e mulheres corajosos que deixam as suas casas e que vão para um país novo para procurar uma vida melhor e que contribuem mais [para os Estados Unidos] do que recebem”.

Há muitas explicações para a mudança profunda do discurso do Partido Republicano de Reagan para o que defende Trump, e que é acompanhado, um pouco, por todos os partidos da direita populista. Não sendo este o local para uma análise exaustiva, há um aspeto que merece atenção particular neste debate. Um estudo recente do Institute for Policy Research da Universidade Northwestern, em Chicago, conclui que há uma diferença profunda entre a perceção, maioritariamente negativa, e a realidade da imigração nos Estados Unidos.

Também entre nós Rui Pena Pires, diretor do Observatório da Emigração e professor do ISCTE, diz que o discurso sobre a imigração e os seus impactos tem pouco a ver com a realidade dos números.

É verdade que, em democracia, podemos votar em políticas e propostas mesmo quando os factos não sustentem as nossas opiniões e as nossas escolhas sejam construídas com base em “eu acho que…” ou numa qualquer aflição pessoal. Esse é um direito que assiste aos eleitores. Mas o mesmo direito já não assiste a quem quer ser eleito. Quem acha que vale tudo para chegar ao poder, até ignorar a realidade dos factos e que pode mentir aos eleitores, não merece a nossa atenção, o nosso respeito e muito menos o nosso voto.

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