Porto Rico: a ilha que marca as eleições não pode votar em Harris ou Trump

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"É isto que eles pensam de nós”, escreveu Ricky Martin nas redes sociais junto ao clipe do humorista Tony Hinchcliffe em que este, no comício de Donald Trump no Madison Square Garden, em Nova Iorque, chamou “ilha de lixo” a Porto Rico. Palavras que até à multidão de apoiantes do ex-presidente e candidato republicano poucas gargalhadas arrancaram e que provocaram repúdio por parte das celebridades americanas de origem porto-riquenha. A Ricky Martin juntaram-se Jennifer Lopez, Marc Anthony ou Bad Bunny, mas também a congressista Alexandria Ocasio-Cortez. Mas são muitos mais os americanos com raízes na ilha das Caraíbas que se destacam na América, do ator Benicio del Toro, ao cantor e compositor Lin-Manuel Miranda, da juíza do Supremo Sonia Sottomayor ao astrofísico Neil DeGrasse Tyson. 

Se estes Stateside Puerto Ricans, como são conhecidos os naturais da ilha que vivem nos EUA continentais, sentiram o insulto de Hinchcliffe e prometem castigar Trump nas urnas no próximo dia 5 de novembro, os que vivem na ilha não terão essa hipótese. Isto porque, apesar de Porto Rico ser um estado associado dos EUA, os seus 3,2 milhões de residentes não podem votar nas presidenciais. Como as Ilhas Virgens, a Samoa Americana, Guam ou as Ilhas Marianas do Norte, Porto Rico é uma das entidades administrativas fora do continente americano que estão sob soberania dos EUA, mas não são um dos 50 estados da União.

Se podem votar nas primárias dos partidos, os habitantes destes territórios, apesar de terem cidadania americana, não podem participar nas presidenciais. Ou seja, Porto Rico tem direito a um delegado (mas não a um voto) no Colégio Eleitoral, onde os representantes de cada estado elegem o chefe de Estado.

Em 1898, durante a Guerra Hispano-Americana, as tropas dos EUA invadiram Porto Rico. Derrotada, Espanha cederia a ilha aos americanos, bem como as Filipinas e Cuba. Das três, só Porto Rico continua sob soberania da América. Mas, durante muitos anos, os seus habitantes viram-se privados de direitos que a Constituição dos EUA - datada de 1787 - garante aos outros americanos. Só em 1940 todos os porto-riquenhos passaram a ter cidadania americana, 12 anos antes de Washington autorizar a ilha a redigir a sua própria Constituição e passar a eleger um governador e poderes legislativos e judiciais próprios. Mas a defesa, controlos fronteiriços e relações externas continuam dependentes do governo federal até hoje. 

Nos últimos anos, a ilha realizou vários referendos sobre a ligação aos EUA. No último, em 2020, 52,5% escolheram passar a ser o 51.º estado da União. Mas estas consultas, não vinculativas, tiveram baixa participação, sinal de que a maioria dos porto-riquenhos prefere manter o atual estatuto. 

Quer dizer que a piada de Hinchcliffe não vai ter consequências na terça-feira? Seria não contar com os seis milhões de porto-riquenhos que vivem nos EUA continentais e que, esses sim, vão escolher entre Trump e Harris. Numas eleições que se adivinham muito renhidas, os porto-riquenhos podem mesmo fazer a diferença, sobretudo na Pensilvânia, onde são meio milhão - basta lembrar que em 2020 os democratas venceram naquele swing state por apenas 82 mil votos. 

Editora executiva do Diário de Notícias

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