A prática desportiva é reconhecida como uma das atividades mais importantes para o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o exercício regular contribui para o fortalecimento muscular e ósseo, melhora a capacidade cardiovascular, promovendo o bem-estar mental, enquanto estimula a socialização. No entanto, para que esta prática desportiva seja realizada de forma segura, é crucial que os jovens atletas realizem uma avaliação médica regular..O exame médico-desportivo é obrigatório em Portugal para todos os atletas federados, deve ser realizado no momento da inscrição inicial numa federação desportiva e renovado anualmente. Este exame pretende identificar possíveis condições de saúde que possam ser agravadas pelo esforço físico intenso, proporcionando a segurança necessária para participar em competições e atividades desportivas. O exame médico-desportivo pode também identificar condições como a síndrome de Wolff-Parkinson-White, que afeta a condução elétrica do coração e pode provocar arritmias. .O exame começa com uma história clínica detalhada, que recolhe informações sobre os antecedentes pessoais e familiares do atleta. São identificados sintomas como palpitações, dor no peito, desmaios e histórico de doenças cardíacas, respiratórias ou ortopédicas na família, que possam representar um risco para a prática desportiva. Em seguida, é realizado um exame físico completo, que avalia a forma física geral, incluindo a sua morfologia, a auscultação cardiopulmonar, a palpação abdominal e a verificação dos pulsos arteriais. Esta fase do exame ajuda a identificar problemas musculoesqueléticos, respiratórios ou cardiovasculares que possam impedir o jovem de participar em desportos de forma segura. .Entre os exames obrigatórios incluídos está o eletrocardiograma, essencial para identificar anomalias no ritmo cardíaco. Este exame deve ser interpretado por um médico experiente, familiarizado com as particularidades dos corações das crianças e capaz de distinguir adaptações normais do coração, como o "coração de atleta", de potenciais problemas patológicos. Esta condição, comum em atletas de alto rendimento, surge como uma adaptação ao esforço físico regular e caracteriza-se pelo aumento da espessura das paredes cardíacas e do tamanho das cavidades do coração. Sem uma interpretação correta, pode gerar falsos positivos para cardiomiopatias. .Embora o eletrocardiograma seja uma peça central no exame médico-desportivo, nem sempre é suficiente para diagnosticar todas as condições cardíacas. Em muitos casos, podem ser necessários exames complementares, como o ecocardiograma. Este exame permite avaliar a estrutura e a função do coração, sendo crucial para a deteção de doenças como a cardiomiopatia hipertrófica, uma das principais causas de morte súbita em jovens atletas. O ecocardiograma é particularmente importante em casos de atletas de alta competição ou de sobreclassificação – quando um atleta compete acima do seu escalão etário normal –, ou quando surgem dúvidas a partir dos exames iniciais..Podem ainda ser recomendados outros exames complementares, dependendo da modalidade desportiva e do historial clínico do atleta, como a prova de esforço – para avaliar a resposta do coração ao esforço físico e detetar limitações que não são evidentes em repouso – e a ressonância magnética cardíaca, para uma avaliação ainda mais aprofundada da estrutura do coração e para identificar qualquer problema estrutural não revelado pelos exames anteriores. .Casos de atletas conhecidos que enfrentaram problemas cardíacos sublinham a importância da realização destes exames. Um exemplo amplamente conhecido é o de Cristiano Ronaldo, que, aos 15 anos, foi submetido a um estudo eletrofisiológico ao coração, devido a uma taquicardia. Esta condição fazia com que o coração batesse de forma rápida, colocando-o em risco. Felizmente, o procedimento foi um sucesso, e o atleta pôde continuar a sua carreira, tornando-se um dos melhores jogadores de futebol do mundo. .Outro exemplo, mais trágico, foi o caso de Davide Astori, capitão da Fiorentina, que morreu em 2018 devido a uma taquicardia ventricular. Uma investigação revelou que exames adicionais poderiam ter prevenido a fatalidade. Astori foi submetido a provas de esforço que detetaram extrassístoles, mas nunca realizou a bateria completa de exames recomendados para avaliar a severidade da sua doença. Casos semelhantes, como o de Feher, Daniel Jarque e Antonio Puerta, também resultaram em mortes devido a complicações cardíacas não diagnosticadas a tempo. .O caso de Paulo Pinto, jogador de basquetebol português, também serve de exemplo para sublinhar a importância da avaliação médica regular. Paulo Pinto, que representava o Aveiro Basket, faleceu em 2002, após uma paragem cardíaca durante um jogo. A sua morte levou à criação de protocolos mais rigorosos na monitorização dos atletas em Portugal. .Mesmo na ausência de condições graves, é importante monitorizar as adaptações cardiovasculares naturais causadas pelo exercício intenso, como o coração de atleta, para garantir que não evoluem para uma condição patológica. .Em suma, o exame médico-desportivo é uma medida preventiva essencial para proteger a saúde dos jovens atletas. Realizado por uma equipa multidisciplinar de médicos experientes, garante que as doenças do coração são detetadas a tempo e tratadas adequadamente, permitindo que os atletas possam continuar a praticar desporto de forma segura. Nesta altura de regresso ao ativo, ao realizar este exame, os pais estão a garantir que os seus filhos beneficiam de todas as vantagens da prática física, minimizando os riscos.