Os diversos equilíbrios do Orçamento do Estado

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A negociação do Orçamento do Estado para o próximo ano já centraliza as atenções dos portugueses e encerra em si uma série de desafios que vão além das tradicionais dinâmicas económicas e financeiras que estão na base das prioridades escolhidas, ou sobre o impacto que estas têm no endividamento público, ou na maior ou menor perceção de sustentabilidade do sistema social português.

Desta vez existe, para além destes, o que pode ser considerado um teste à maturidade da democracia lusa, dentro de um enquadramento político novo e que assenta num Parlamento onde os entendimentos deixam de ser estar vinculados apenas à visão tradicional do que é o pensamento de esquerda e direita, mas também ao que é o pensamento estrutural do centro político europeu, em contraste com o peso do euroceticismo e dos partidos antissistema - e que se tornou mais visível após o partido Chega ter exigido referendar a imigração, sem clarificar em detalhe a questão a colocar, como condição para aprovar o Orçamento.

Certo é que o país não pode parar com algumas reformas que são vitais para se transformar, e para as quais conta com enormes apoios europeus. E o Governo terá de procurar os apoios necessários para que possa executar a agenda transformadora junto dos partidos que mais vocação europeísta têm - o que inevitavelmente incluirá envolver o Partido Socialista, para além do CDS e da Iniciativa Liberal. O que no final do dia exige maior maturidade por parte do maior partido da oposição, sob pena de o país entrar num ciclo de permanente instabilidade política. Tudo isto implica uma complexidade mais elevada no que diz respeito à aceitação de propostas da oposição.

Certamente o Executivo tentará evitar a incorporação de medidas demasiado onerosas, que não sejam provenientes do seu programa, e é certo que os partidos que não integram o Executivo - sobretudo o PS - tentarão o inverso, colocando a fasquia muito elevada de forma a aprovarem o mesmo. Uma coisa parece certa: a solução para evitar uma crise política com eleições assentará num acordo ao centro, e entre os dois grandes partidos que o compõem. A acontecer será uma proposta final de Orçamento que será muito provavelmente de expansão orçamental - com mais despesa, e pouca redução de impostos -, de forma a poder cabimentar as visões e propostas das diversas tendências partidárias - o Partido Socialista, por exemplo, publicamente já assumiu divergências com uma redução do IRC.

Um Orçamento de continuidade, mas de maturidade política. Porque deverá permitir que sejam perseguidas essenciais metas de transformação económica do país. Afinal, o défice é atualmente, apesar de relevante, um problema menos urgente para Portugal.

A necessidade de aceleração da execução dos estímulos europeus (PRR) é absolutamente essencial no próximo ano. Da mesma forma é a necessidade de melhorar o acesso aos serviços públicos da Saúde, Segurança e Educação através da execução de medidas já anunciadas nos primeiros meses de Governo e que carecem de continuidade. E é preciso melhorar o acesso a habitação, e criar melhores condições de coesão social - que se agravaram nos últimos anos com a inflação e respetiva subida dos juros.

É certo que as taxas de juro deverão baixar no próximo ano, e isso deverá contribuir positivamente. Mas em Portugal há ainda muito por fazer - e criar soluções de equilíbrio e de estabilidade política será essencial para começar.

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