Os cenários de final de jogo de Ventura

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Os três principais partidos vão lutar por objetivos muito diferentes nas próximas Legislativas antecipadas. Já muito se falou sobre a manobra tática de Luís Montenegro, que acredita que o voto popular na sequência de uma queda forçada pode lavar a suspeita sobre as avenças da Spinumviva. Pode ganhar reforçando (por pouco) a minoria que tem, mas não se livrará de cada vez mais escrutínio sobre o seu património e os seus antigos clientes. Há sangue na água e não há voto, nem maré que venha clarear as águas.

Também se percebe que Pedro Nuno Santos - um Júlio César que sente cada vez mais o bafo dos senadores no pescoço - vai disputar um tudo ou nada em meados de maio. Como líder do PS já perdeu umas Legislativas, assistiu à crescente erosão dos seus parceiros tradicionais (Bloco de Esquerda e PCP) e tem, como já disse, adversários internos à espera de uma eventual segunda derrota. Claro que pode ganhar (ao que indicam, aos dias de hoje, as sondagens, com pouca margem) e, mesmo assim, não conseguir fazer nada com a vitória.

Já André Ventura, o líder do Chega, até pode chegar ao fim da noite eleitoral de maio como um dos perdedores, com menos votos e deputados eleitos. Mas com mais opçõesa prazo. Um contrassenso? Nem por isso.

Uma vitória sem maioria de Luís Montenegro deixa o líder do PSD a prazo, vulnerável na votação do Orçamento do Estado seguinte, em outubro, e a enfrentar ainda mais desgaste. Ou seja, para governar, Luís Montenegro poderá ser forçado a reequacionar o “Não é não”, que repetiu à saciedade neste ano de governação, e passar a contar com Ventura (se este o aceitar agora). Uma opção que o Chega até agora não tinha.

Uma derrota de Montenegro dará, inevitavelmente, o tiro de partida dentro do PSD para a sua substituição, uma espécie de higienização de que o partido precisará para embates eleitorais futuros. Se o PSD conseguir mobilizar Pedro Passos Coelho - nos termos em que ele queria, já sem Montenegro na fotografia -, sabemos, desde logo, que é mais recetivo a juntar os seus deputados aos de André Ventura. Outra opção que o Chega até agora não tinha.

Por outro lado, se o PS de Pedro Nuno Santos ganhar e o resto da esquerda ficar ainda mais precária no hemiciclo, então provavelmente ou nem consegue aprovar um Programa do Governo, ou, se o PSD lhe der a mão, será um apoio temporário (o mesmo que o PS deu a Montenegro) e teremos novas eleições por alturas do final do ano. Se isso acontecer, dificilmente Pedro Nuno será novamente candidato, tal como o PSD não deverá deixar Montenegro pôr o nome no bilhete rumo a São Bento. O que deixa via aberta a Pedro Passos Coelho para regressar sem concorrer contra o atual presidente do PSD. E isso é favorável ao Chega e a André Ventura. E finalmente poderá fazer algo no parlamento com os seus mais de 40 deputados.

Numa partida de xadrez, a abertura e o meio jogo são importantes, mas tudo culmina no final de jogo, quando já houve troca de peças e tudo gira em torno das combinações vencedoras com as pedras que restaram. E um ou outro peão promovido a rainha. Pensar no final do jogo é uma visão estratégica, não tática. É esse final de jogo que pode ser mais proveitoso a André Ventura e ao Chega.

Diretor adjunto do Diário de Notícias

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