Sincronizar o medo

As duas paixões básicas e combinadas que movem a política são a esperança e o medo. As grandes catástrofes ocorrem quando uma delas suprime a outra. A União Europeia é disso claro exemplo. Em 1992, nos ardores milenaristas de uma era de paz perpétua e harmonia universal, desencadeada pela queda do Muro, a UE embarcou na aventura descabelada de atamancar uma união monetária sem união política, sem união de transferência, sem um mínimo de coordenação económica e sem uma união bancária que evitasse repetir a tragédia americana de 1933-1934. A esperança sem medo conduziu ao labirinto onde hoje os europeus se perderam. Em 2016, o que mantém a Europa unida (e que levará Cameron a uma desesperada defesa da permanência do Reino Unido na UE) é um medo, cada vez mais extremo, desprovido de esperança. Os dirigentes políticos europeus não são particularmente brilhantes ou cultos. Os seus conselheiros - sobretudo essa espécie de novos sacerdotes de Osíris saídos das provincianas escolas de negócios europeias - também não primam por ter qualquer espécie de luz própria. O degenerar do medo em pânico é hoje a maior ameaça à sobrevivência da Europa como entidade viável. Por isso mesmo, Portugal deve contribuir para a sincronização europeia dos medos, única terapia para o regresso de alguma racionalidade portadora de esperança. Berlim, em particular, precisa de mais tempo para aprender, por analogia com o drama dos refugiados, o que é viver numa Europa em que cada Estado só pensa no seu umbigo. Ao insistir em trazer agora o tema da renegociação unilateral da dívida pública para a agenda política, o PCP parece padecer de um preocupante assomo de acne juvenil. Esperemos que o que Álvaro Cunhal escreveu sobre o intempestivo "radicalismo pequeno-burguês" não esteja a ficar esquecido no mais antigo partido português.

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