Fala-se muito de reformas estruturais, mas não se sabe bem o que são. Há quem use o termo mesmo sem saber. Outros sabem ao que vêm, mas preferem não dizer. Na verdade, não faltam em Portugal reformas estruturais. O que escasseia são boas práticas de política pública. É isso que nos deveria preocupar..Reformas estruturais são intervenções do Estado que permitem aumentar o crescimento potencial de um país no longo prazo. Que intervenções são essas? Há 250 anos que os economistas procuram responder a esta questão. A resposta não é óbvia. Cada caso é um caso. Para o sabermos temos de identificar os grandes obstáculos ao desenvolvimento económico de cada país, em cada contexto. Depois, encontrar soluções possíveis para os remover..No caso português são vários os obstáculos ao desenvolvimento económico que têm sido identificados ao longo dos anos. O mais consensual são as baixas qualificações, que reflectem quase um século de atraso de investimento em educação e formação. Daqui resulta um perfil de especialização baseado em actividades de baixo valor acrescentado, a reduzida qualidade da gestão das organizações e a escassez de competências técnicas da força de trabalho..Menos consensuais, mas muito debatidos, são os chamados "custos de contexto". Ou seja, os diferentes tipos de factores que afectam a competitividade internacional das empresas a operar no país e, dessa forma, a atracção de investimento produtivo em Portugal. Aqui incluem-se questões como: a eficiência dos serviços públicos, o funcionamento da justiça, a regulação dos mercados, as regras de licenciamento, a fiscalidade, o acesso a capital, etc..Na última década tornou-se central a preocupação com a estabilidade financeira. O endividamento excessivo das empresas, das famílias e do Estado constitui uma ameaça para crescimento sustentado. Por sua vez, a excessiva exposição ao risco por parte dos bancos favorece a ocorrência de crises financeiras, que afectam a economia como um todo..Podemos ainda referir questões menos óbvias, hoje reconhecidas como essenciais para o desenvolvimento das economias a prazo: a coesão social, a saúde da população, o ordenamento do território, a prevenção de riscos naturais e tecnológicos, a qualidade das instituições democráticas..Em todas as áreas referidas é possível identificar os desafios que Portugal enfrenta. Menos conhecidas são as respostas que, ao longo dos anos, têm sido adoptadas por sucessivos governos e implementadas pelo Estado português..Quem tiver curiosidade e paciência pode ler os vários Planos Nacionais de Reformas (PNRs) produzidos anualmente em Portugal desde 2008. O mais recente PNR tem 150 páginas de referências a estratégias, planos, programas, iniciativas e medidas, que visam responder aos múltiplos desafios que se colocam ao desenvolvimento do país. Algumas são acções inovadoras, outras transposições de experiências estrangeiras, outras ainda prosseguem políticas que vêm de trás. Em qualquer caso representam esforços conscientes e razoavelmente informados para ultrapassar os obstáculos referidos. Em quase todas as áreas é possível identificar progressos relevantes..Temos feito o que é necessário fazer? Sobre isto não há nem haverá consenso. Quase todas as medidas favorecem certos actores e actividades em relação a outros. Cada grupo de interesse tenderá a acusar os governos de fazerem pouco do que o beneficiaria mais e demasiado do que o prejudica. Esta é uma das razões pelas quais não basta fazer muitas reformas. É preciso assegurar que as intervenções são monitorizadas e avaliadas em função dos recursos que consomem, da relevância social dos objectivos que prosseguem e da capacidade para os atingir..Não sabemos exactamente o que faz uma economia desenvolver-se de forma sustentada, mas sabemos bastante sobre as condições para uma política pública ser eficaz: identificação clara das prioridades da intervenção, focalização nos domínios com maior potencial de impacto, compromisso político ao mais alto nível, atribuição de mandatos claros às agências públicas e prestação de contas pelo seu desempenho, monitorização e avaliação permanentes, envolvimento e mobilização das partes interessadas, condicionalidade dos apoios à obtenção de resultados..Quando se lêem os PNRs percebemos que o problema em Portugal não é a ausência de reformas. É a falta de hábito de as avaliar e debater abertamente e de modo sistemático. O que precisamos é de melhor política pública. É das poucas reformas importantes que estão por fazer.