O “Oeste” não está morto

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As políticas da nova liderança americana vão além do progressivo isolacionismo e protecionismo comercial, e traduzem-se numa crescente hostilidade dos EUA em relação a países aliados como o México, o Canadá, o Panamá, a Dinamarca/Gronelândia. Para não falar da Ucrânia que, no ínterim de ter de suportar altos responsáveis norte-americanos papagueando a narrativa de Putin, é chantageada a entregar metade das suas riquezas minerais aos EUA e vê o apoio suspenso enquanto luta pela sua própria existência face a uma horrífica agressão russa.

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Em cima disto, temos as declarações pesporrentes de JD Vance em Munique sobre a “falta de controlo da imigração” na Europa e a alegada supressão da liberdade de expressão (basta ver o ranking RSF por países, sobre a liberdade de imprensa, no qual Portugal está em 7.ª posição e todos os países europeus estão no topo, bem acima dos EUA na 55.ª posição), ao mesmo tempo que fica muito enxofrado por alguns países europeus estarem a responder à guerra híbrida russa e a marginalizar políticos de extrema-direita ilegalmente financiados por Putin e seus siloviki.

O mesmo Vance que achava que Trump era “heroína cultural” e “inapto para o mais alto cargo da nação”. Até que a sede pelo poder, numa epifania orwelliana, o levou a render-se a um querido líder para quem mentiras passam a verdades [alternativas], [os promotores da] guerra passam a ser [parceiros pela] paz, a ignorância [seletiva e intencional] é força e [os defensores da] liberdade são [condenados à] escravatura.

Esta postura levou Martin Wolf do Financial Times, a considerar que o “Oeste” está morto. Mas estará mesmo? O “Oeste” não consiste numa agregação de países aliados sob a liderança do novo império, com uma pax americana imposta urbi et orbi pelo hard power militar.

O “Oeste” consiste na “civilização Ocidental” e engloba um conjunto de valores culturais, políticos, económicos e sociais que, provindo de uma herança greco-romano-judaico-cristã, evoluíram ao longo dos séculos e foram aperfeiçoados nos últimos 200 anos e se caracterizam por: (i) individualismo e liberdades pessoais; (ii) democracia, com pluralismo político e Estado de Direito; (iii) respeito pelos Direitos Humanos; (iv) racionalismo e investigação científica, baseados na razão e na ciência, e abertura à novidade; (v) economia capitalista; (vi) laicismo, com separação entre Estado e igrejas, e pluralismo de crenças; (vii) pluralismo cultural, com tolerância para com a diferença; (viii) Educação generalizada e valores iluministas decorrentes do pensamento crítico e da busca do conhecimento; (ix) bem-estar social; (x) consciência ambiental.

A nova liderança americana MAGA não só não se revê em muitos destes valores, como procura destruir vários deles. Em suma, o “Oeste” não está morto, voltou é a estar centrado na Europa.

Consultor financeiro e business developer

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