O drama orçamental

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As negociações para a aprovação do Orçamento do Estado para 2025, a que temos assistido quase em direto nas televisões, têm o seu quê de encenação. Tanto o Governo, como o Partido Socialista estão a fazer, ao que tudo indica, um jogo de sombras que tem como objetivo salvar as respetivas faces. O Governo tenta passar a imagem de que está a cumprir as promessas eleitorais em relação à descida do IRS e do IRC, enquanto o partido liderado por Pedro Nuno Santos procura fazer finca pé em algumas das suas bandeiras.

Aqui chegados, há duas quase-certezas: a primeira é que ninguém quer uma crise política neste momento, porque o país não a entenderia e dificilmente haveria algum proveito, a nível eleitoral, para quem fosse percecionado como responsável pela mesma. A segunda é que PSD e PS têm mais em comum, em matéria de política orçamental, do que aquilo que os separa. Mas ambos tenderão a procurar demonstrar que saíram a ganhar, ou que, no limite, cederam em algum ponto essencial apenas em nome do interesse pátrio.

Em resumo, o mais certo é que teremos o Orçamento aprovado na generalidade, graças a um entendimento entre o Executivo e o maior partido da Oposição, mas até lá assistiremos ainda a mais algumas dramatizações e jogos de sombras. Enquanto isso, a verdadeira negociação far-se-á a nível técnico, com os dois lados a tentarem encontrar uma solução que permita “modelar” (ou “calibrar”, para usar outro termo em voga) as propostas do Governo e do PS no que diz respeito aos dois temas quentes da discussão, o IRS Jovem e a descida do IRC.

Porém, o debate sobre o Orçamento não se pode resumir à descida de impostos, por muito importante que este tema seja, nomeadamente no que diz respeito à tributação sobre os rendimentos do trabalho, mas também - e não se tem falado muito disso - no que toca aos impostos indiretos, que aumentaram de forma significativa nos últimos anos. Mas o que pensam o Governo e o PS sobre medidas que potenciem o crescimento económico, nomeadamente por via de reformas na Administração Pública, da desburocratização de processos e da resolução dos gravíssimos problemas que existem na Justiça, com tribunais que não conseguem resolver os processos em tempo útil?

Fala-se muito no problema dos salários baixos em Portugal: o que pensam o Governo e o PS sobre medidas que incentivem a consolidação entre pequenas e médias empresas? Está demonstrado que as empresas de maior dimensão proporcionam melhores condições aos seus funcionários, incluindo salários mais elevados. O que pode ser feito, no âmbito do Orçamento, para atrair mais “Autoeuropas” que criem emprego qualificado e melhor remunerado?

É pena que estes e outros temas não sejam suficientemente falados nas negociações para aprovação do Orçamento. Talvez seja este o verdadeiro drama orçamental.

Diretor do Diário de Notícias

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