O centro político não é uma ideologia, mas antes soluções pragmáticas para os problemas

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Na China há uma expressão que diz que teremos sorte se “vivermos tempos interessantes”, mas mesmo a pessoa mais otimista reconhecerá que há limites para a capacidade de absorver e gerir tempos tão interessantes. De facto, nos últimos 25 anos ultrapassámos a queda das Torres Gémeas em NY, a crise financeira e a pandemia, e estamos a viver a guerra na Europa e no Médio Oriente, a desestruturação do sistema internacional do pós-guerra, os impactos das alterações climáticas e o surgimento da Inteligência Artificial.

Nesta sucessão de crises, pessoas e governos têm procurado encontrar os caminhos que permitam melhor gerir os acontecimentos, e as primeiras olham para os segundos em busca de soluções e de respostas. Enquanto as democracias se debatem com estes enormes desafios, outros aparecem com soluções simplistas, mas atraentes, que, por norma, resultam quase sempre na culpabilização de uma parte da sociedade, acusada de ser a causa de tudo o que corre mal. E, na ausência de outras soluções, as narrativas que nos dividem entre as vitimas e os vilões vão fazendo o seu caminho.

As soluções que procuramos serão, face aos problemas que temos, complexas e difíceis. E, portanto, não devem ser sectárias ou limitadas. Devem, outrossim, olhar para as dificuldades como elas são e basearem-se em facto, em ciência e em bom senso. Ou, como Tony Blair terá explicado quando perguntado qual seria a fórmula que guiaria o seu governo: “O que funcionar.”

“O que funcionar” não significa uma visão ideológica do mundo, que procura moldar a realidade a uma narrativa ou uma ideia pré-concebida e recusa os factos que não caibam nessa versão idealizada da nossa história coletiva. Como respondeu Helmut Schmidt, que foi chanceler da Alemanha Federal entre 1974 e 1982, quando lhe perguntavam qual seria a sua visão para o país, “as pessoas que têm visões deveriam consultar um médico”.

“O que funcionar” significa, pelo contrário, uma compreensão pragmática dos problemas e utilizar todas as ferramentas que o Estado, o setor privado e as organizações da sociedade civil dispõem para encontrar as melhores respostas, com a flexibilidade e o pragmatismo que as pessoas esperam e precisam. Significa também ser honesto na forma como comunicamos com a sociedade e não procurar esconder as dificuldades e as consequências do que nos propomos realizar ou os custos de nada fazer.

A defesa da democracia faz-se através de respostas para os problemas concretos das pessoas e não de um longo debate ideológico que será certamente intelectualmente estimulante, mas pouco eficaz.

As nossas comunidades e o nosso sistema político serão mais bem servidos se tivermos soluções que sejam pragmáticas e eficientes, combinando o melhor que o centro-esquerda e o centro-direita têm para oferecer, como nos mostram os exemplos recentes da Alemanha ou da Áustria, onde os partidos moderados conseguiram sentar-se à mesma mesa para procurarem resolver as questões que afligem as suas sociedades, afastando as vozes cujas únicas coisas que têm para oferecer são divisões e conflitos.

Professor Convidado IEP/UCP e NSL/UNL

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