O apagão continua

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No quarto ponto do discurso que fez no dia 11 de abril de 2024, por ocasião da apresentação do programa do XXIV Governo Constitucional, Luís Montenegro, garantia que nos “próximos 10 dias as conversações com os representantes dos professores e das forças de segurança, com vista a tratar de assuntos relacionados com as carreiras e estatuto remuneratório”. Mais adiante, no sétimo dos nove pontos em destaque na intervenção, seria a vez de abordar a questão das “graves falhas na disponibilização de equipamentos informáticos, na sua manutenção e na conectividade das escolas para garantir que os alunos pudessem realizar as avaliações em igualdade de oportunidades neste ano letivo”. Ou seja, mais de um quinto das questões consideradas prioritárias passavam pela Educação.

Catorze meses depois, na passada terça-feira, no discurso de apresentação do programa do XXV Governo Constitucional, a Educação desapareceu por completo das dez reformas apresentadas como essenciais para “transformar Portugal”. Com boa vontade, pode considerar-se que quando se fala em garantir “serviços essenciais acessíveis a todos, com qualidade e articulação entre os setores público, privado e social” (5.ª reforma), a Educação estará lá incluída. Mas o foco deslocou-se das condições de quem está nas escolas (alunos, professores, etc) para o da prestação de serviços, com o sublinhar da “articulação” entre operadores públicos e privados, no que se percebe ser uma cedência ao lobby da alegada “liberdade de escolha”,

Depois de um ano lectivo marcado pela falta de professores, mesmo se considerarmos que nos últimos meses se tentou fazer esquecer essa problemática (em especial com o adiamento sucessivo da apresentação de dados rigorosos sobre os alunos sem aulas), não deixa de ser estranha a completa omissão de uma visão “reformista” sobre a Educação. Como se tudo estivesse a decorrer com normalidade, apenas sendo necessário aprofundar medidas que transitam do passado com os (maus) resultados que se conhecem ao nível do desempenho dos alunos. Como se o início do processo de recuperação (integral, parcial ou nula) do tempo de serviço docente tivesse resolvido tudo ou quase no sector.

Nada de mais enganador, por muito que aquela recuperação tenha funcionado como sedativo para a maioria dos protestos de natureza profissional. Mas está quase tudo o mais por resolver, desde a “transição digital” até a uma reforma curricular que se anuncia como libertadora de “amarras ideológicas”, para logo em seguida anunciar a obrigatoriedade do ensino da “literacia financeira”, algo tão ideológico quanto as questões da igualdade de género. Passando pelo atirar da revisão do Estatuto da Carreira Docente para o final da legislatura, algo que há um ano se garantia ser “urgente”, ou pelo renovado anúncio do combate à burocracia escolar.

Na Educação, o apagão veio para ficar.

Professor do Ensino Básico.

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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