O ano em que Portugal falhou. Outra vez
Por estes dias ouviram-se mensagens de Natal, de votos ambiciosos para o futuro. Discursos que ficam bem na quadra que atravessamos e aos quais se juntam imagens de políticos e voluntários a servir refeições a pessoas que enfrentam dificuldades para conseguirem algo tão básico como comer, pelo menos, uma refeição diária.
Pena é que não se tenha ouvido os responsáveis políticos falar abertamente de um dos grandes problemas que o país enfrenta e que se torna ano, após ano, um dos seus maiores desafios: os sem-abrigo.
Quando tomou posse como Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa colocou o tema como uma prioridade, mas a verdade é que desde janeiro de 2016 até hoje o número de pessoas que vivem nas ruas ou em abrigos temporários aumentou. E subiu de tal forma que no passado dia 14 de dezembro o mesmo Presidente, que defendia uma estratégia nacional, teve necessidade de afirmar que Portugal está “num buraco” no que diz respeito ao apoio a estas pessoas. E, ao mesmo tempo, lembrou que os dados mais recentes mostram existirem na condição de sem-abrigo cerca de 13 mil pessoas - um aumento de três mil, de 2022 para 2023, segundo os números conhecidos.
Muitas destas pessoas trabalham, mas vivem na rua ou em abrigos temporários por não terem capacidade financeira para pagar uma renda e, se é verdade que os maiores problemas existem em Lisboa e Porto, também é certo que por todo o país há situações referenciadas. Portanto, este é mesmo um problema nacional.
Nesse dia 14, Marcelo Rebelo de Sousa lançou uma série de questões que espera ver respondidas até ao final deste mês de dezembro: “O Estado vai meter muito à cabeça? Quanto é que vai financiar os municípios? Os municípios têm planos municipais de habitação, sim ou não? Como é que vão desenvolver isto?”
Mas, até agora nada se sabe. O que se conhece é uma garantia da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, que o Governo iria aprovar até ao final do mês em Conselho de Ministros a nova estratégia nacional para a integração das pessoas em situação de sem-abrigo para o período 2025-2030. Como estamos nos últimos dias do ano o tempo começa a escassear para que essa aprovação veja a luz do dia de forma a poder suceder à Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo 2017-2023, da qual poucos se lembrarão, tão despercebida passou.
Nestes dias falou-se de segurança, de imigração, de corrupção, de extremos e de liberdade. Só faltou mesmo quem tem poder de decisão juntar a estes temas a segurança, a integração, o apoio aos imigrantes e nacionais, e a liberdade de quem não tem outra solução para sobreviver do que dormir em paragens, em salas de espera de hospitais, em arcadas de prédios, etc.
E é também a estas pessoas que Portugal, com exceção de algumas (poucas) entidades e voluntários que diariamente lhes tentam dar algum conforto e refeições, está a falhar.
Editor-executivo do Diário de Notícias