Meloni em Washington: Desconfiar do melhor e preparar o pior

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A primeira-ministra italiana visitou recentemente Washington, onde manteve uma série de conversas e reuniões com o presidente, o vice-presidente e outras figuras importantes da Administração americana. Já se sabia que havia uma relação especial entre Trump e Meloni, que foi a única líder europeia a estar presente na tomada de posse do atual presidente dos Estados Unidos mas a visita era uma operação diplomática complexa para a primeira-ministra, que teve que equilibrar a relação bilateral entre os Estados Unidos e a Itália, ao mesmo tempo que deseja assumir o papel de construtora de pontes entre Washington e Bruxelas. E, à primeira vista, Meloni terá conseguido manter-se firme na corda-bamba, reforçando o papel de Roma como parceira privilegiada de Trump na Europa e trazendo na bagagem as referências que o presidente americano fez a um possível acordo comercial entre os Estados Unidos e a União Europeia.

Significa isso que as desavenças entre as duas margens do Atlântico estarão em vias de serem ultrapassados? Mesmo a pessoa mais otimista deverá ser cuidadosa antes de pensar que a crise das tarifas entre as duas grandes economias do espaço do Atlântico Norte estará ultrapassada. De facto, considerando a quantidade de vezes que o presidente Trump disse uma coisa e o seu contrário nestes últimos 3 meses é muito difícil, se não mesmo impossível, acompanhar o pensamento e a vontade de Washington, e nada nos garante que este não venha a ser mais um destes casos.

Mas, e ao mesmo tempo, a Europa não deverá ignorar a possibilidade, por muito remota que possa ser, de evitar uma guerra comercial com efeitos devastadores para todos os envolvidos. A UE deverá, assim, explorar a abertura para negociações com os Estados Unidos, sem ignorar que a declaração oficial que a Casa Branca publicou após a visita da primeira-ministra não menciona uma única vez a União Europeia.

Assim, e como costumamos dizer, ao mesmo tempo que trabalhamos para o melhor, teremos que estar preparados para o pior. Para isso, a UE deveria posicionar-se como o novo centro da economia e do comércio mundiais, reforçando os laços e acordos comerciais que já tem com cerca de 70 países e grupos de países por todo o mundo, terminando os processos de ratificação com mais 30 países e regiões e acelerando as 7 negociações em aberto. De facto, e no seu conjunto, a UE tem acordos ou está a caminho de os ter com todas as grandes economias do mundo, do Canadá à América Latina, da Índia à Austrália ou da China à África do Sul.

Ao mesmo tempo, a União Europeia, deveria mobilizar todos estes países para uma discussão aberta e franca sobre os mecanismos de promoção e coordenação do comércio no mundo, liderando o processo de reorganização e funcionamento da Organização Mundial do Comércio, incluindo o debate sobre os temas difíceis mas necessários, como o reforço dos mecanismos de resolução de conflitos e a relação entre o desenvolvimento económico, a sustentabilidade ambiental e a responsabilidade social nos países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento, sem esquecer o papel do setor privado.

A União Europeia enfrenta um momento de definição existencialista sobre o que é e o que ser ser no futuro e continuar como um gigante económico, um anão político e uma ficção militar já não chega. Embora todas estas dimensões tenham que ser trabalhadas em conjunto, as ultimas serão mais fáceis de gerir se na primeira Bruxelas assumir o papel de liderança que está ao seu alcance.

Professor Convidado IEP/UCP e NSL/UNL

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