Maioria dissoluta
Noventa e seis dias depois da tomada de posse, nem atingindo o número redondo de 100, o XXIII Governo Constitucional passou de suportado por uma maioria absoluta para o país ter de suportar uma maioria dissoluta.
O mais recente episódio a envolver o ministro Pedro Nuno Santos, que termina sem despacho nem ministro despachado, é outro sinal de como nos governos de António Costa as responsabilidades nunca são assumidas nem as irresponsabilidades têm consequências. E assim vai perdurando o sentimento crónico de inimputabilidade com que o PS se governa e desgoverna Portugal.
Seja como for, percebe-se a irritação, não optimista, de António Costa, pois o país estaria a assistir, depois de a palavra dada não ser honrada, à sequela: a palavra dada não conta para nada.
António Costa só se pode queixar de si próprio. Além de ser um episódio também consequência da sua opção em tornar o Conselho de Ministros um casting dos seus sucessores, demonstra as dissoluções dentro do Governo.
Só que se o país até pode conviver com as dissoluções governativas, os portugueses dispensavam bem as dissoluções causadas pelas opções deste Governo.
Embora os avisos fossem vários e a equipa de Costa insista em negar a realidade, o último mês foi bem demonstrativo da dissolução dos serviços públicos.
A degradação na Saúde é o pináculo, com urgências fechadas, sobretudo na obstetrícia, profissionais desmotivados e em fuga para prestadores privados ou para o estrangeiro ou os preocupantes dados das cirurgias oncológicas.
A desagregação na Educação não fica atrás, com o falhanço na recuperação das aprendizagens e a constatação de que, devido à não renovação do quadro de professores, milhares de alunos não terão horários completos já no próximo ano lectivo.
A deterioração na Segurança Social caminha para rivalizar com a Saúde nas listas de espera, seja para decisões sobre reformas, ou, tão ou mais preocupante, para os apoios a crianças com necessidades especiais.
A Justiça continua o seu caminho de incapacidade de resposta, arrastando pessoas e empresas para calvários (in)temporais inaceitáveis.
A decomposição do SEF, uma tentativa pífia de salvar o ex-ministro Eduardo Cabrita, deixa milhares encarneirados em aeroportos e outros tantos pendurados a aguardar autorizações de residência.
E o cúmulo dos cúmulos? Já nem o Instituto de Medina Legal escapa, com atrasos nas autópsias.
Enquanto as pessoas esperam e desesperam, o Governo segue o seu caminho de negação da realidade e de recusa de soluções óbvias, disponíveis e até mais eficientes. Sendo exemplo máximo a Saúde e Educação, onde por mero preconceito ideológico se recusam a utilizar e disponibilizar toda a oferta instalada.
Sim, refiro-me à utilização de serviços privados e sociais. A quem recorrem apenas no limite, em gritos de SOS, reconhecendo assim a sua utilidade. Se lhes batem à porta em contingência, porque é que não os consideram em permanência?
E não vale a pena a máquina de propaganda do PS repetir que enfrentaram uma pandemia e uma guerra, pois beneficiaram de condições únicas, como a suspensão das regras do Tratado Orçamental, do maior período de juros baixos e agora dos milhares de milhões de fundos da bazuca.
Toda esta negação da realidade e recusa de soluções para os problemas tem um rosto: António Costa. Primeiro-ministro há sete anos, perde-se nas suas habilidades e assiste à degradação dos serviços prestados aos cidadãos. Será por esta destruição generalizada que acabará recordado na história da política portuguesa - e bem merece.
Deputado.
Escreve de acordo com a antiga ortografia