Licenciamentos
Do programa do Governo, a propósito da reforma do Estado, consta o compromisso de simplificar os licenciamentos, o que não é uma tarefa fácil.
Exigir uma licença para o início de uma atividade económica — seja industrial, comercial ou de serviços — significa condicionar o seu livre exercício à ponderação de outros interesses públicos relevantes, como o ordenamento do território, a proteção ambiental ou a saúde pública.
Contudo, não existe um único modelo de licenciamento aplicável a todas as atividades económicas. Os processos variam enormemente — desde a instalação de uma simples esplanada até à operação de uma indústria química. Em termos gerais, podemos distinguir entre licenciamentos de atividades de baixo risco ou de outras de elevada complexidade.
Comecemos pelas primeiras. Quando, em 2011, preparámos no Governo o regime do “Licenciamento Zero” e fizemos o levantamento dos procedimentos necessários, por exemplo, para abrir uma esplanada, ficámos incrédulos com o que encontrámos. Eram necessárias, por vezes, sete licenças — do menu ao toldo, das mesas à “abelha maia”, sem esquecer os outros acessórios —, todas emitidas pelo município, mas nem sempre pelo mesmo serviço. Neste caso, pudemos ser radicais, e daí o nome “Licenciamento Zero”. O município define as regras (altura ou cor do toldo, por exemplo) e o valor agregado das licenças. O agente económico compromete-se a cumpri-las e paga o valor devido de uma só vez, podendo iniciar a atividade de imediato. Ou seja, o município confia no cidadão, dispensando a verificação prévia e fiscalizando posteriormente.
É precisamente esta abordagem que agora está refletida no programa do Governo — e bem, o que me deixou bastante satisfeita. Ao que parece, saiu derrotada a intenção do presidente da Câmara de Lisboa de pôr fim ao Licenciamento Zero.
Contudo, este modelo não é aplicável a atividades de maior risco, com impactos urbanísticos ou ambientais significativos. Para elas, o licenciamento prévio é indispensável, pois os custos de uma eventual reversão posterior seriam incomportáveis, tanto para o Estado como para os particulares.
É aqui que a simplificação se torna uma missão mais difícil — mas não impossível. Desde logo, porque raramente se trata de uma única licença: são várias (resíduos, recursos hídricos, emissões atmosféricas, etc.) e envolvem múltiplas entidades, de diferentes áreas e níveis de governo. Além disso, algumas dessas licenças decorrem de legislação europeia, que não está ao nosso alcance modificar.
Ainda assim, como foi demonstrado em 2022 com o pacote do “Simplex Ambiental” — uma das iniciativas que, por estranho que pareça, esteve na origem da queda do Governo de António Costa—, é possível fazer melhor. Com criatividade, alguma
tecnologia e, sobretudo, determinação política. Resta-nos esperar pelos resultados, certos de que o excesso de burocracia e de opacidade, e a demora em obter um “sim” ou um “não”, não são apenas inimigos da economia — são também, em muitos casos, inimigos do ambiente e da confiança na democracia.
Ex-deputada ao Parlamento Europeu