Imigração. Nem humanismo hipócrita, nem desumanidade autêntica
Na véspera de assinar com as confederações patronais o “Protocolo de Cooperação para a Migração Laboral Regulada”, mais conhecida pela “via verde para a imigração”, que estabelece um mecanismo de emissão rápida de vistos (20 dias) para trabalhadores estrangeiros, com garantia de contrato, alojamento e formação, o Governo vai anunciar outra medida para acelerar outros processos: os de expulsão, deportação, afastamento, retorno - como lhe queiramos chamar, pois o fim é o mesmo - de imigrantes que forem detidos pelas polícias em situação irregular. No fundo, será também uma “via verde” mas em sentido contrário.
Conforme noticiamos nesta edição, a intenção é, por um lado, cortar etapas nos processos de expulsão e encurtar prazos de recurso, tornando a execução mais rápida.
Mesmo sabendo que para levar estas medidas adiante o Governo terá de, primeiro, ganhar as eleições legislativas em maio, segundo, caso não tenha maioria, de conseguir que as mesmas sejam aprovadas no parlamento, ficamos a saber claramente a que está disposta a Aliança Democrática (AD) num dos temas mais fraturantes da sociedade, que é a imigração.
Afastada que foi a narrativa de extrema direita que relacionava a criminalidade com a imigração, o caminho a seguir agora é preparar o país para o fluxo migratório que menos riscos apresenta e de que mais precisamos para o rejuvenescimento da nossa sociedade e para o progresso da economia: regulado, com condições de acolhimento, fechando, de uma vez por todas, as portas ao efeito chamada que as descontroladas manifestações de interesse causaram, e combater as redes criminosas que aproveitavam as oportunidades.
O ministro da Presidência, António Leitão Amaro, que apresenta nesta segunda-feira as novas medidas, já tinha avisado em setembro passado que tinha sido dada orientação à PSP e à GNR para haver um reforço da fiscalização” e essa fiscalização está já a acontecer no terreno”.
Nessa altura já pretendia que fosse a PSP a concentrar toda a tramitação do processo de retorno, quer a parte administrativa, quer a parte executiva”, o que acabou por ser chumbado no parlamento.
A segunda fase seria tornar o afastamento “mais célere”. Os dados que tinha nesse momento indicavam que no primeiro trimestre de 2024, das cerca de 300 notificações a estrangeiros irregulares para abandonarem voluntariamente o país, só 15 tinham sido executadas.
Sabemos agora pelo Relatório Anual de Segurança Interna, que será também hoje apresentado no Conselho Superior de Segurança Interna, que em 2024 as polícias identificaram pouco mais de 27 mil cidadãos estrangeiros em todo o país, dos quais apenas 151 estavam em situação irregular.
Sabemos agora pelo Relatório Anual de Segurança Interna, que será também hoje apresentado no Conselho Superior de Segurança Interna, que em 2024 as polícias identificaram pouco mais de 27 mil cidadãos estrangeiros em todo o país, dos quais apenas 151 estavam em situação irregular. Sabemos ainda que foram emitidas 444 notificações de abandono voluntário, instaurados 195 processos de expulsão, decididos 113, dos quais 36 arquivamentos. Ou seja, 77 terão sido efetuados num ano, 17,3% das notificações.
A avançar este desejo do Governo o que é preciso garantir, a bem de nos diferenciarmos, enquanto país, de políticas que envergonham as democracias e a dignidade, é que não passemos do humanismo hipócrita que antes abriu as portas a uma imigração descontrolada, para uma desumanidade autêntica.
É preciso muita sensibilidade e bom senso de quem vai executar estas deportações, no caso a PSP, com formação e meios que permitam, em tempo real, ter a informação sobre a situação de cada pessoa identificada. Enganos nesta matéria equivalem a tragédias pessoais, familiares. À desumanidade.
Não há motivo para que assim seja, não é essa a tradição da social democracia, nem dos princípios fundamentais que criaram a União Europeia, entre o quais o da dignidade do ser humano, a base de todos eles.
Não é esse o país que queremos ser, mas um país onde se combatem os extremismos e onde os Direitos Humanos estão no topo das prioridades.
Diretora adjunta do Diário de Notícias