IGAI, um recurso institucional
Dispomos desde 1996 dum recurso institucional, externo às forças e serviços de segurança, dotado de autonomia técnica e dirigido por magistrados judiciais ou do MP (o primeiro inspetor-geral foi Rodrigues Maximiano, 1946-2008) que se dedica ao controlo da legalidade da atuação policial. Com a IGAI a averiguar a forma como essa atuação se processa, bem como as respetivas consequências, passou a esperar-se mais qualidade e celeridade no apuramento dos factos, em particular nas situações de maior relevância social. Dotou-se por isso a estrutura que nascia de “plenas condições para investigar, com total isenção, acontecimentos que se podem revestir do maior melindre, na sequência dos quais, com muita frequência, se torna necessário, num Estado de Direito, apurar a verdade” - e, em consequência, “assumir ou recusar responsabilidades”. Assim se lia no DL n.º 154/96 de 31 de Agosto.
No momento em que desceu ao terreno, ficou claro que o propósito era promover “um relacionamento entre cidadãos e instituições baseado na transparência e na responsabilidade, no profissionalismo, no civismo e na proximidade”. E também que esse propósito implicaria “a reintegração da legalidade que tivesse sido violada, através da reparação dos prejuízos, quando fosse caso disso” - o que hoje podem parecer palavras correntes, mas ao tempo não eram.
Não era esta a única dimensão presente na missão da IGAI, destacando-se, desde a origem, o contributo para a formação, nomeadamente para acções orientadas para “uma cultura policial ajustada às necessidades da sociedade democrática contemporânea - aberta, globalizada, mediática, multicultural”.
Não por acaso, pela mesma altura, uma resolução do Conselho de Ministros mandatava uma comissão de larga representatividade para avaliar e propor mudanças no ensino e nos processos de formação no domínio das forças e serviços de segurança.
Esta referência a dados e palavras do passado não pretende diminuir o alcance de uma experiência de quase três décadas - antes evidenciá-lo. Não cabendo aqui o balanço da actividade e evolução da IGAI, há que dizer é que foi através da sua acção que o objectivo dum “controlo externo da actividade policial” fez o seu caminho entre nós. E com isso, com momentos mais e menos felizes, manteve-se aberto um crédito institucional que os padrões de exercício do poder disciplinar internos às organizações e os tempos e limitações dos tribunais, por si sós, dificilmente alimentariam.
Num caso como o de Odair Moniz, com um agente já constituído arguido pelo crime de homicídio, é previsível que estejamos a anos de distância do momento em que os tribunais dirão a sua última palavra, impondo-se até lá, quanto à pessoa, a presunção da inocência própria dum Estado de Direito. O tempo mais célere da IGAI confere-lhe especial relevância - e hoje mais - no acesso da sociedade aos factos e a uma avaliação qualificada da actuação policial.
Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico.